Tabela de frete não vincula todos os caminhoneiros, afirmam advogados

Para alguns, contratos antigos não precisam ser atualizados; tema gera polêmica

Natália Portinari
São Paulo

Para alguns advogados, a tabela de preços mínimos rodoviários não precisa ser seguida em todas as situações, especialmente se já houver um contrato valendo.

A Medida Provisória de 27 de maio dita que, caso seja praticado um preço abaixo do estipulado, é devida uma indenização equivalente ao dobro do que seria devido, descontado o valor já pago.

Se a tabela dita R$ 3 mil e foi pago R$ 1 mil, por exemplo, o contratante deve pagar o dobro do que seria devido (R$ 6 mil) menos o já pago (R$ 1 mil), totalizando R$ 5 mil.

A ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) publicou os preços mínimos em 30 de maio. Na quinta-feira passada (7), após críticas do setor produtivo, foi substituída por uma segunda tabela; esta, por sua vez, desagradou caminhoneiros e foi revogada algumas horas depois.

Para Fernando Villela, sócio da área regulatória do Siqueira Castro, o caminhoneiro pode se adiantar e abrir mão da indenização pela diferença de preços, já que se trata de um direito patrimonial. 

"O governo não pode alterar conceitos jurídicos, como a livre negociação entre as partes", diz Villela. "A MP não fala em multa devida ao governo, e sim em indenização, ou seja, estamos tratando de uma negociação privada."

Antonio Barbuto, sócio do TozziniFreire, dá a mesma orientação. "A renúncia ao preço mínimo pode ocorrer, desde que seja formalizada. Se não houver tempo para assinar um novo contrato, a recomendação é que a empresa pelo menos discuta o assunto com a transportadora por email, explicitando que não vão seguir os novos preços."

Outros advogados ouvidos pela Folha afirmam que a estratégia de renunciar ao preço mínimo é arriscada, já que, quando a transportadora deixar de prestar serviço ao cliente, pode entrar com uma ação pedindo a indenização, e tem chance de ganhar.

"Discordo da possibilidade de renunciar. Se fosse assim, o governo diria 'tem essa tabela aqui, quem quiser pode usar'", diz Marcelo Inglez de Souza, sócio do Demarest.

Para Paulo Prado, advogado do KLA, "a qualquer momento a pessoa [transportadora ou caminhoneiro] pode reverter esse acordo contra você", e ainda não se sabe como vão decidir os juízes.

Com a indefinição, na prática, ninguém está usando a tabela, diz José Fonseca Lopes, presidente da Abcam (Associação Brasileira de Caminhoneiros). "Com raríssimas exceções, ainda não se sabe como vão ficar os preços, então ninguém usa."

Outra questão que divide advogados é se a tabela vale para todos os contratos ou só os firmados a partir de agora. "Entendo que se aplicaria a tabela imediatamente, mas o mais seguro agora é entrar com uma ação para garantir que continue valendo seu contrato", diz Lucas Sant'Anna, sócio do Machado Meyer.

Um argumento que pode ser usado na Justiça é que as transportadoras têm autonomia para definir seus preços e não precisam do tabelamento como os autônomos, diz Bruno Werneck, sócio do Mattos Filho.

"A lei foi adotada para proteger os autônomos, então podemos adotar uma interpretação história de que só serve para eles. Mas a tabela fere, sim, a Constituição, porque o governo só pode regular preços na atividade econômica desde que exista uma justificativa econômica plausível."

"Qualquer ingerência do governo sobre preços praticados entre particulares é inconstitucional", afirma Henrique Frizzo, sócio do Trench Rossi Watanabe.

O que a Justiça ainda vai definir sobre a tabela

  •  É constitucional?
  •  Se for, se aplica a todos os contratos, ou só aos novos?
  •  Vale para grandes transportadoras, que podem impor seus preços ao mercado?
  •  É possível renunciar ao direito de usar o preço mínimo em alguma situação?
     
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