Lei de Informática destrava até R$ 5 bilhões para pesquisas

Atraso do governo para avaliar investimentos obrigatórios barrou inovação

São Paulo

Após recusar grande parte dos investimentos em inovação obrigatórios feitos nos últimos dez anos pelas empresas que recebem benefícios fiscais da Lei de Informática, o governo criou novas regras para permitir que as companhias reapliquem esses recursos em pesquisas.

Não há cálculos oficiais sobre a quantia que será reinvestida, mas especialistas e executivos estimam que a soma dos valores rejeitados varie de R$ 1 bilhão a R$ 5 bilhões.

A mudança foi feita a partir de medida provisória. O texto foi sancionado em junho.

A Lei de Informática, de 1991, permite que empresas que produzem hardwares no Brasil tenham desconto em IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

 

Para isso, devem investir 5% de seu faturamento obtido com os itens incentivados em inovação.

As 564 empresas que se beneficiam da lei investem cerca de R$ 1,5 bilhão ao ano.

Para ter a redução no imposto, as empresas realizam seus investimentos e enviam relatórios para indicar os aportes dos recursos. Os documentos são avaliados posteriormente.

Quando o investimento da empresa é glosado, ou seja, rejeitado por não cumprir os requisitos exigidos, valor equivalente deve ser depositado com multa e juros (de 12% ao ano, mais a TJLP, atualmente em 6,6%) no FNDCT, fundo gerido pela Finep.

Originalmente com a função de financiar pesquisa e desenvolvimento, o fundo vem sendo sistematicamente contingenciado para melhorar o resultado das contas públicas.

A demora de até dez anos do governo para avaliar os investimentos das empresas entre 2006 e 2014 terminou em muitas glosas do governo e reclamações das empresas, diz Francisco Tripodi, diretor da consultoria especializada em inovação Pieracciani.

Ele afirma que a maior parte dos investimentos das empresas foi rejeitada: "Temos caso de empresa que investiu R$ 20 milhões e teve apenas R$ 400 mil aprovados", diz.

Tripodi diz acreditar que, em razão da liberação de novos investimentos, o valor aplicado anualmente a partir da lei (os R$ 1,5 bilhão) será praticamente o dobro do habitual pelos próximos quatro anos (prazo que as empresas têm para fazer o reinvestimento).

Carina Leão, diretora de relações governamentais da consultoria ABGI, do mesmo setor, confirma o grande número de rejeições.

Por outro lado, diz que, antes de aderir ao reinvestimento, a maioria das companhias irá apelar ao Ministério da Ciência fornecendo mais informações e argumentos para que seus projetos do passado sejam considerados inovadores. "Primeiro elas vão tentar defender o que fizeram."

Segundo Leão, a falta de confirmação do governo sobre se considerava ou não os investimentos das empresas adequados à lei nos últimos anos fez com que companhias persistissem em erro.

Anderson Jorge, diretor-executivo da Abinee (associação do setor eletroeletrônico), diz que a análise dos investimentos feita no ano passado levou em conta critérios atuais para avaliar pesquisas feitas em outro contexto tecnológico.

"Um projeto de aplicativo hoje não é considerado pesquisa, mas, em 2006, era uma tremenda novidade."

Para tornar a avaliação de projetos mais rápida, a lei passou a prever que as opções adotadas pelas empresas sejam avaliadas por uma auditoria independente antes de passar pelo crivo do Ministério da Ciência.

A pasta disse não ser possível informar qual o valor das rejeições que serão reinvestidas, pois muitas empresas estão em período de contestação. Existe a possibilidade de que muitas recusas sejam revertidas após a apresentação de informações.

O ministério afirma que a demora na avaliação ocorreu, entre outros motivos, pela falta de pessoal e pela metodologia antiga usada para avaliação.

A pasta diz esperar que, com as mudanças na lei, o processo seja mais eficiente. "A fiscalização será realizada 'in loco' e não por meio apenas de um relatório entregue", informa o Ministério da Ciência.

Além de poder aplicar recursos em projetos internos de inovação e em institutos de ciência e tecnologia, as empresas têm, pela nova lei, a opção de direcionar seus investimentos obrigatórios para fundos que apostam em startups.

A mudança é vista como positiva por Isabela Dias, diretora da Anpei, associação que reúne empresas que investem em pesquisa e inovação. "É saudável para o país ter mais empresas de base tecnológica."

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