Senado aprova projeto de lei sobre proteção de dados pessoais

Proposta prevê multa e até suspensão da atividade de banco de dados que infringir a lei

Brasília e São Paulo

O Senado aprovou nesta terça-feira (10) projeto que cria um sistema de proteção de dados pessoais no Brasil. Aprovado em maio pela Câmara, o texto não sofreu alterações de mérito e segue para a sanção do presidente Michel Temer.

O projeto cria um marco legal de proteção, tratamento e uso de dados pessoais. As regras serão aplicadas aos setores público e privado. Entre as punições previstas para quem cometer infrações, está a aplicação de multas e a suspensão da atividade do banco de dados responsável pelas informações.

Após entrar em vigor, haverá a possibilidade de usuários solicitarem acesso a seus dados, além de pedirem que informações sejam corrigidas ou excluídas. Dados sensíveis, como posição política, opção religiosa e vida sexual receberão tratamento mais rigoroso.

Pela proposta, o governo deverá criar um órgão para cuidar do sistema de proteção de dados.

O projeto estabelece que as empresas devem coletar apenas dados necessários para que os serviços.

“O cidadão será beneficiado porque terá mais controle e transparência sobre a forma como seus dados estão sendo processados pelas empresas e pelo setor público”, disse o relator da proposta, senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES).

Antes do início da sessão desta terça, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE), informou que havia acordo para votação do projeto. A aprovação é parte de um esforço concentrado com a finalidade de limpar a pauta do plenário da Casa, que tem a última semana de atividades antes do recesso parlamentar.

Um dos pontos do projeto prevê o tratamento que deverá ser dado aos casos de vazamento de dados pessoais. Pelo texto, o responsável pela gestão das informações deverá comunicar ao órgão competente a ocorrência de incidente de segurança que acarrete risco aos titulares.

Nessas situações, o órgão responsável poderá determinar providências como a divulgação do fato em meios de comunicação e medidas para reverter os efeitos do vazamento.

O projeto não se aplica ao tratamento de dados pessoais realizados para fins jornalísticos, artísticos, acadêmicos, de segurança pública e defesa nacional.

A transferência internacional de dados pessoais será permitida para países ou organizações que proporcionem grau de proteção de dados adequado ao previsto na legislação brasileira.

Os agentes que cometerem infrações relacionadas às normas estabelecidas pelo projeto poderão receber advertência, multa de até 2% do faturamento da empresa, suspensão do funcionamento do banco de dados e até proibição total das atividades de tratamento de dados.

O projeto prevê que o uso de dados de crianças e adolescentes deverá ser feito com consentimento dado por ao menos um dos pais ou responsável legal.

O senador Eduardo Braga (MDB-AM) defendeu a aprovação do projeto, argumentando que outros países já adotam regras para ampliar proteção de dados pessoais.

“Os dados pessoais trafegam pelas redes de informação e, muitas vezes, sem consentimento das pessoas, acabam sendo comercializados, publicados ou utilizados de forma abusiva, em manifesta contrariedade aos preceitos constitucionais”, disse.

Um dos pontos da proposta não foi bem recebida pelo Banco Central e o Ministério da Fazenda. O dispositivo do projeto sobre proteção de dados estabelece que o tratamento de informações pessoais somente poderá ser realizado com o consentimento do titular.

Fazenda e BC avaliam que esse trecho pode comprometer o funcionamento do cadastro positivo – banco de informações de bons pagadores. O projeto que regulamenta o cadastro tramita na Câmara e prevê inclusão das informações de todos os consumidores no banco de dados de forma automática, e não por consentimento.

A equipe do relator afirma que outro dispositivo prevê o uso dos dados pessoais “para a proteção do crédito”, o que preservaria a regra do cadastro positivo. ​

REPERCUSSÃO

Especialistas no tema consideram que a nova legislação, além de proteger cidadãos, trará vantagens e segurança jurídica para as empresas, por criar regras claras sobre o que elas podem e o que não podem fazer.

Thiago Luis Sombra, sócio do escritório Mattos Filho, diz que mesmo que a lei traga aumento de custos no período de adaptação, o resultado final para as companhias deverá ser positivo.

"Se as empresas souberem fazer desse limão uma limonada, terão mais segurança em relação às autoridades e vão estar melhor no futuro."

Ele diz que o país conta atualmente apenas com leis que tratam do uso de dados em setores específicos, não uma regra geral. Com isso, o Brasil fica em desvantagem em relação à centenas de outros que já possuem um regulamento abrangente.

Sombra destaca que a lei não trata apenas de empresas de internet e terá grande impacto em muitos setores, incluindo automotivo, de seguros e financeiro. Também atingirá empresas de todos os portes.

Renato Leite Monteiro, sócio do Baptista Luz Advogados, diz que a lei aprovada no Senado tem forte inspiração no regulamento europeu, que entrou em vigor em maio deste ano.

Com isso, o país passa a ter a vantagem de ser visto pelo continente como território com proteção de dados adequado para se fazer negócios, conferindo vantagem as companhias daqui.

Para ele, a lei dá diretrizes para que empresas possam inovar com segurança.

"A adaptação dependerá de um processo grande, árduo e até custoso. Mas as empresas devem encarar isso como um investimento, como algo que dará vantagem competitiva", diz Monteiro.

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