Ajuste fiscal depende de habilidade política do próximo presidente, diz analista

Apoio no Congresso é mais importante do que comprometimento com medidas, afirma Alberto Ramos

Plenário da câmara vazio enquanto se aguarda quórum para inicar a sessão
Plenário da câmara vazio enquanto se aguarda quórum para inicar a sessão - Pedro Ladeira/Folhapress
Danielle Brant
Nova York

A habilidade política do próximo presidente para angariar apoio no Congresso é mais importante do que o comprometimento com o ajuste fiscal, afirmou nesta quarta-feira (1º) Alberto Ramos, economista-chefe para América Latina do Goldman Sachs.

Ele participou de evento ao lado de outros economistas e especialistas na Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, em Nova York.

“Se você quiser ter uma visão cínica do que aconteceu nos últimos dois anos, com a decepção com a falta de medidas do lado fiscal, nós não podemos ficar muito otimistas com o futuro em relação a quem ganhar as eleições”, disse.

“Nós precisamos eleger um presidente que esteja comprometido em entregar o ajuste fiscal, mas, mais que isso, eleger um presidente que tenha condições de governabilidade suficientes para entregar o ajuste necessário.”

Ramos citou como exemplo o presidente Michel Temer, descrito como um político hábil.

“Essa não é uma declaração sobre comportamento ético, mas ele é um indivíduo com habilidades políticas significativas, que foi político experiente por mais de 20 anos, que foi capaz de estabelecer um diálogo com o Congresso”, afirmou.

Temer conseguiu ainda, na avaliação de Ramos, montar uma equipe econômica comprometida com o ajuste, em um cenário macroeconômico adverso, com desemprego e inflação em dois dígitos, sentimentos de empresários e consumidores em níveis baixos recordes.

Dois anos depois, porém, houve pouco alívio na situação fiscal do país, criticou. “Um presidente com habilidades políticas significativas, uma equipe econômica ótima e dedicada, uma base política de apoio, e o melhor momento para validar o ajuste, e nada aconteceu? Por que estamos presumindo que todas essas coisas vão acontecer após as eleições?”, questionou.

Para ele, sob o ponto de vista político, será pouco provável que o próximo presidente tenha habilidades políticas como a de Temer.

Isso coloca em risco a reforma da Previdência, principalmente pela falta de apoio popular às mudanças nas regras da aposentadoria. “Há muita discussão sobre a reforma da Previdência. Não é um instrumento de consolidação fiscal, mas é uma precondição para falar de consolidação fiscal e entregar estabilidade macroeconômica.”

Se o próximo governo fracassar em entregar a reforma, o ajuste do mercado virá sob a forma de uma reprecificação dos ativos do país, ressaltou Drausio Giacomelli, responsável por mercados emergentes do Deutsche Bank Securities.

“Eu não estou tão preocupado com as reformas, porque, para mim, é uma questão de preço. Se tiver um governo mais amigável ao mercado, os preços caem, o real vai para R$ 3,50. Se não tiver um governo amigável, subir para R$ 4 ou R$ 5”, afirmou.

É uma avaliação parecida com a de Claudia Ribeiro de Castro, diretora e analista sênior para mercados emergentes do Oppenheimer Funds. “Se não tivermos uma reforma da Previdência ambiciosa, vai aumentar o risco e os níveis das taxas de juros”, disse.

Mas ela acredita que a campanha do governo para defender as mudanças na Previdência tem surtido efeito, o que facilita que a classe política abrace o tema.

A mudança de foco, com um discurso de eliminar distorções no sistema previdenciário, vai favorecer a aprovação da reforma, concorda Christopher Garman, diretor para as Américas da consultoria Eurasia.

“No pós-eleições, acho que está mais fácil aprovar a reforma da Previdência. O governo achou o script para vender a reforma, o que é bom. Se vai ser uma reforma profunda ou mais rasa, vai depender do perfil do próximo presidente”, ressaltou.

Esse script passa pela defesa do fim dos privilégios no setor público. “É um discurso de que não é justo um servidor público se aposentar antes enquanto você tem que trabalhar mais. É preciso uma regra para todos”, afirmou. 

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