Tarifas de Trump são obstáculo mais difícil do que a China esperava

Líderes de Pequim ponderam efeitos prováveis das retaliações sobre a economia doméstica

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Tom Mitchell
Pequim | Financial Times

Quando os principais líderes da China se reuniram no começo do mês em um balneário perto de Pequim, para seu retiro anual de verão, o presidente americano Donald Trump teve presença forte em suas deliberações.

Dias antes, o governo Trump havia advertido que estava considerando impor tarifas de 25% sobre US$ 200 bilhões em produtos importados da China —ante uma alíquota tarifária anterior de 10%. Em julho, as duas maiores economias do mundo abriram formalmente hostilidades comerciais, ao impor tarifas sobre US$ 34 bilhões em exportações uma da outra.

As autoridades chinesas esperavam que a guerra comercial indesejada com os Estados Unidos parasse por ali, ao menos pelo restante do verão do hemisfério norte. "Todo mundo se surpreendeu com Trump", disse um economista chinês próximo aos formadores de políticas econômicas de Pequim. "A maioria dos dos dirigentes chineses acreditava que Trump estivesse apenas tentando forçar os limites, mas que ele em breve recuaria".

Trump em lugar disso levou adiante seus esforços para aumentar a pressão sobre o presidente chinês Xi Jinping. Os Estados Unidos devem em breve impor tarifas sobre mais US$ 16 bilhões em produtos chineses, e Pequim retaliará na mesma moeda.

Diante desse desafio econômico e geopolítico sem precedentes, o governo de Xi buscou estabilizar a economia interna, o câmbio e os mercados de ações da China, e apelou ao patriotismo dos chineses.

Em sua mais recente reunião, em 31 de agosto, o Politburo —formado pelos 25 principais dirigentes do Partido Comunista chinês— apelou por "emprego estável, finanças estáveis, investimento estável e expectativas estáveis".

Dias mais tarde, na reunião anual no balneário de Beidahe, perto da capital chinesa, Chen Xi, membro do Politburo, instou um grupo dos principais cientistas do país a "manter o coração patriótico" e ajudar a China a "controlar independentemente as tecnologias essenciais".

Nos dois meses que antecederam o apelo do Politburo por estabilidade econômica, o yuan caiu em mais de 6% diante do dólar americano, para o recorde de baixa de 6,85 yuan por dólar, movimentação forte para uma moeda cuidadosamente controlada. Depois da declaração do Politburo, a moeda se estabilizou,

Os mercados de ações da China, que, como comentou Trump alegremente em 4 de agosto, haviam caído em mais de 20% este ano, ganharam terreno na semana passada.

O banco central chinês também conduziu as taxas de juros interbancárias do país ao seu mais baixo patamar desde o crash das bolsas chinesas três anos atrás. Além disso, voltou a colocar em vigor regras que tornam mais dispendioso apostar contra o yuan.

As autoridades chinesas precisam encontrar o equilíbrio entre sua determinação de reduzir os riscos financeiros e seus esforços para garantir que o crescimento econômico não se desacelere demais, diante da ofensiva de Trump. "As autoridades não desistiram de [reduzir o] risco, mas também querem dar sustentação à economia real", disse Andrew Polk, da consultoria Trivium, de Pequim. "As duas coisas podem não ser compatíveis".

Manter a taxa de câmbio abaixo dos sete yuan por dólar, marca que um importante consultor do banco central chinês definiu como "barreira psicológica" importante, na semana passada, pode se provar dispendioso.

"Em um ambiente no qual o crescimento continua a se desacelerar e o relacionamento entre China e Estados Unidos não melhora, manter a taxa de câmbio em sete yuan por dólar pode gerar diversas outras questões", disse um estrategista de câmbio. "Seria preciso queimar reservas, apertar os controles de capital e apertar as condições monetárias, o que contraria a atual política monetária chinesa".

Em sua busca por estabilidade em todas as frentes, o governo chinês teve de calibrar sua resposta à ameaça cada vez maior de tarifas, da parte da Trump. "Pequim está dando menos ênfase à retaliação de escala e intensidade equivalentes, porque isso é difícil de executar sem causar dor inaceitável à economia chinesa", disse Yanmei Xie, analista da política chinesa na consultoria Gavekal Dragonomics.

Quando a segunda rodada de tarifas de Trump entrar em vigor, em 23 de agosto, apenas 10% das exportações da China aos Estados Unidos - o equivalente a 2,2% das exportações totais do país - terão sido afetados. Como afirmou o China Daily, jornal oficial do governo chinês, em um artigo de opinião, "o conflito comercial entre os dois países é um jogo de empurra, no momento".

Mas se o governo Trump cumprir sua mais recente ameaça de impor tarifas a outros US$ 200 bilhões em produtos importados da China, elevando o total de produtos afetados a US$ 250 bilhões, o equivalente à metade das exportações chinesas ao maior parceiro comercial do país - e a 11 % das exportações totais da China - estará sujeito a tarifas de 25%. No ano passado, a China exportou US$ 505 bilhões em produtos aos Estados Unidos.

Em contraste, a China - que importou US$ 130 bilhões em bens americanos no ano passado - já tributou, ou ameaçou tributar, US$ 110 bilhões em exportações americanas.

Em resposta à mais recente ameaça de Trump, de uma tarifa de 25%, o Ministério do Comércio chinês anunciou que retaliaria com tarifas de entre 5% e 25% sobre produtos americanos. Produtos que sejam mais difíceis de obter de outros fornecedores que não os Estados Unidos terão alíquota tributária menor. As autoridades chinesas por enquanto isentaram as exportações de petróleo dos Estados Unidos da retaliação.

Tendo esperado em vão por um resultado positivo, elas agora estão se preparando para o pior. "Algumas pessoas detestam ver o despertar de um leão, ou a decolagem de um dragão, e se sentem desconfortáveis por uma população de mais de 1,3 bilhão de pessoas estar vivendo uma vida melhor", afirmou o Diário do Povo, o principal jornal do Partido Comunista chinês, em um editorial na quinta-feira. "Mas ficaremos firmes".

Tradução de PAULO MIGLIACCI

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