Vetos na lei de proteção de dados flexibilizam responsabilidade do Poder Público

Lei Geral de Proteção de Dados foi publicada no Diário Oficial da União nesta quarta-feira

Paula Soprana
São Paulo

O presidente Michel Temer sancionou na tarde desta terça-feira (14) a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, objeto de debate há oito anos no Congresso.

A normativa cria um marco legal para a privacidade e a proteção de dados no país. O Brasil fica com proteção semelhante à da União Europeia, que em maio sancionou o Regulamento Geral sobre Proteção de Dados Pessoais (GDPR).

Presidente da República, Michel Temer, fala em cerimônia
Presidente da República, Michel Temer, em cerimônia de sanção da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais - Marcos Corrêa/PR/Folhapress

O texto original (PL 53/2018) criava a ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), um órgão fiscalizador independente, com poder de advertência e multa.

Como era esperado, Temer vetou a ANPD. O entendimento jurídico para a ação é de que o Legislativo não pode propor a estrutura e composição de um órgão a ser criado pelo Executivo.

A autoridade deve vir por meio de Medida Provisória ou projeto de lei e Temer já sinalizou que tomará uma iniciativa nesse sentido. Especialistas entendem que, sem a autoridade, a lei não tem eficácia.

Os outros vetos do projeto original foram trechos dos artigos 23, 26, 28 e 52. Todos eles envolvem como o Poder Público trata os dados pessoais. 

Foram vetadas algumas regras que impediam o compartilhamento de informações entre órgãos públicos e privados, bem como o uso compartilhado de banco de dados entre diferentes esferas do setor público. 

“Os vetos foram no sentido de proteger a administração pública, e em alguns casos essa preocupação é compreensível”, diz Fábio Pereira, sócio da área de Proteção de Dados do Veirano Advogados.

Em relação à autoridade, o advogado diz que a primeira empresa que sofresse uma sanção recorreria ao argumento de que ela é inconstitucional – o que dá mais sentido à decisão do governo em vetá-la num primeiro momento.

Para Andriei Gutierrez, gerente de Relações Governamentais da IBM, a “espinha dorsal” da lei foi mantida, e agora o debate deve focar na criação da autoridade. 

“A importância dessa autoridade é fundamental para o desenvolvimento econômico e social do Brasil nas próximas décadas. [A autoridade] vai ter que sentar com todas entidades setoriais: varejo, farmacêutica e automobilística, para que todos estejam em conformidade com a lei em 18 meses. O trabalho de educação será intenso", afirmou.

A nova lei vale para pequenas e grandes empresas privadas e públicas, e não apenas para as que coletam dados digitais.

Qualquer tipo de organização que captar e armazenar informações de cidadãos – de uma portaria de prédio a uma farmácia – deverão se adequar às normas de segurança e de proteção.

Para vários especialistas ouvidos pela Folha, os vetos fazem sentido politicamente, pois dão mais segurança ao governo. No entanto, não impediriam o funcionamento da administração pública, como foi argumentado por ministérios que solicitaram os vetos.

“A lei tem que ser analisada no texto integral e parte do texto fala que é possível processar ou tratar dados mediante o argumento do legítimo interesse. Então, me parece que na leitura global, não faz sentido jurídico, mas enxergo o receio do Planalto", diz Marcelo Crespo, da Patrícia Peck Advogados.

A lei entra em vigor em 18 meses após a sanção. A maior mudança que ela impõe é que cidadãos poderão ter acesso a informações de como seus dados são coletados, processados e armazenados em qualquer tipo de serviço. 

Fica excluído o uso de dados realizados para fins jornalísticos, artísticos, acadêmicos, de segurança pública e defesa nacional. ​

Apesar de dar segurança jurídica às empresas, que contam com dezenas de regras esparsas relacionadas à privacidade hoje no Brasil, os custos de adaptação são vistos vilões da lei.

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