Zelotes suspeita que fraude foi acertada em reuniões com conselheiros do Carf

'Tribunal da Receita' receberia propinas de até R$ 272 mil para apagar débito de R$ 650 milhões

Fábio Fabrini
Brasília

Investigadores da Operação Zelotes suspeitam que fraude no julgamento de um recurso da siderúrgica Paranapanema pelo Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) foi combinada por integrantes do órgão em reuniões antes da apreciação do caso.

Conforme mensagem apreendida em uma das fases da operação, o economista Roberto Giannetti, ligado ao PSDB, e o advogado Vladimir Spíndola, suspeitos de articular o pagamento de propinas a conselheiros do Carf, se encontraram em abril de 2013 com o advogado Daniel Gudiño, relator do caso no conselho, que foi favorável ao pleito da empresa.

Roberto Giannetti e sua empresa, a Kaduna Consultoria, disseram que são infundadas as suspeitas levantadas pela operação. 

O texto da mensagem apreendida diz que a reunião ocorreu no escritório ao qual o então conselheiro era vinculado.

“O Daniel está a nossa espera para tratar do assunto em tela, conforme combinado. Agradeceria caso o Vlad [Vladimir] possa nos enviar o memorial antecipadamente, para nossa consulta”, escreveu Giannetti num e-mail para o então diretor jurídico da Paranapanema.

Outra reunião teria ocorrido em setembro seguinte. Segundo a investigação, Vladimir e a ex-conselheira do Carf Judith Armando viajaram ao Rio e se hospedaram no mesmo hotel, no Leblon, para mais tratativas relativas ao julgamento. Judith teria ajudado os integrantes do esquema, fornecendo subsídios técnicos.

O julgamento de um recurso da Paranapanema ocorreu numa das turmas do Carf. A decisão, publicada em 5 de julho de 2014, livrou a Paranapanema de um débito fiscal de R$ 650 milhões.

Giannetti e os demais investigados entraram na mira da Zelotes após a equipe de investigação da Corregedoria do Ministério da Fazenda encontrar suspeitas sobre o julgamento da Paranapanema.

Relatório do órgão subsidiou as apurações do Ministério Público Federal em Brasília. O procurador da República Frederico Paiva, responsável pelas investigações, pediu medidas de busca e apreensão contra os envolvidos, cumpridas em 26 de julho.

Segundo ele, três conselheiros que votaram a favor da empresa foram corrompidos num esquema supostamente articulado por Giannetti e Vladimir. Uma planilha apreendida na operação indica que Gudiño recebeu R$ 272 mil. Judith teria obtido o mesmo valor pela sua atuação, embora não estivesse mais no Carf na época da apreciação do caso.

Também teria ocorrido reunião para acertar o julgamento com a então conselheira Mércia Trajano, suspeita de ter recebido propina de R$ 150 mil. Ela foi um dos alvos de mandados de busca e apreensão na última fase da Zelotes em 26 de julho. Em sua casa, a Polícia Federal apreendeu R$ 373 mil em espécie, em Recife. Os investigadores suspeitam que o dinheiro é fruto de corrupção.

Após o julgamento, os investigados celebraram o resultado. “Temos que comemorar!!! Obrigado, Judith, você foi fundamental para a vitória!”, escreveu Vladimir apara a ex-conselheira em 10 de julho.

“Não imagina a felicidade desse momento: minha primeira grande vitória! Obrigada por ter me chamado para participar dessa empreitada. Vamos juntos a mais outros sucessos”, respondeu ela.

Outro Lado

O advogado de Daniel Gudiño, José Estevam Macedo Lima, afirmou, em nota divulgada nesta sexta (10), que seu cliente  "é um advogado experiente  que atua sempre com ética e alicerçado na mais pura técnica jurídica". 

"Todos seus votos sempre foram fundamentados e técnicos. Todas as ilações apontadas, que supostamente envolvem Daniel na operação Zelotes, não possuem qualquer amparo mínimo de indícios", disse.

Macedo acrescentou que Daniel nega "todos os fatos ilícitos em que se baseiam a acusação e tem a certeza de sua inocência".

Mércia Trajano, em nota, disse à reportagem que jamais recebeu propina para votar a favor da Paranapanema. Ela sustentou que sua manifestação no julgamento foi técnica, fruto de sua “livre convicção e entendimento”.

“Acompanhei o relator pelas conclusões e justifiquei meu voto através de uma declaração de voto”, diz a nota. A ex-conselheira negou ter tido reuniões com Roberto Giannetti ou Vladimir Spíndola. Explicou ter recebido memoriais de defesa, o que é uma prática comum no universo do direito.

A ex-conselheira afirmou que o dinheiro apreendido em sua casa não é seu, mas de seu namorado, um “industrial falido”, e é proveniente da venda de um imóvel.

O advogado de Judith, Sérgio Moraes, disse que não responderia aos questionamentos da Folha. “Judith, oportunamente, irá exercer o seu direito de defesa perante as autoridades judiciárias, ocasião em que apresentará os esclarecimento.

Em nota sobre a operação, Roberto Giannetti e sua empresa, a Kaduna Consultoria, disseram que são "totalmente infundadas as suspeitas levantadas" na Operação Zelotes. Eles afirmaram que "estão abertos a prestar qualquer informação e colaborar integralmente com a Justiça Federal para elucidação de qualquer fato".

O advogado de Vladimir Spíndola, Brian Alves Prado, afirma que seu cliente foi formalmente contratado para atuar no caso Paranapanema e, em decorrência do compromisso firmado, prestou serviços jurídicos, emitindo notas fiscais e recolhendo os tributos dos valores recebidos.

“O que chama atenção é Vladimir ter sido alvo de nova busca e apreensão [em 26 de julho] sobre os mesmos fatos da primeira busca, em 8 de outubro de 2015, notadamente porque –naquela oportunidade– apresentou nove pastas de documentos ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal, evidenciando sua lícita atuação, tendo a autoridade policial devolvido todo o material há dois anos, após não ter visualizado a prática de crime”, acrescentou.

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