FHC foi o melhor ministro da Fazenda que o país já teve, diz ex-assessor do PT

Em livro, ex-ministro da Comunicação de Dilma narra a trajetória de 14 comandantes da pasta

Flavia Lima
São Paulo

O exercício do poder visto pelo cargo mais complexo da máquina pública (o de ministro da Fazenda), ou "Pior Emprego do Mundo", como descreve o jornalista Thomas Traumann em livro a ser lançado na próxima semana.

O texto reúne os principais desafios de política econômica enfrentados pelos ministros da área desde o fim da década de 1960, assim como a relação marcada por tensão com os respectivos presidentes. Os principais ocupantes do cargo foram entrevistados, com exceção de Pedro Malan.

No governo Dilma entre 2011 e 2015, Traumann avalia que o ministro da Fazenda de um eventual governo Fernando Haddad (PT) seria mais parecido com Antonio Palocci do que com Guido Mantega. E não hesita ao dizer que o melhor ocupante do cargo foi Fernando Henrique Cardoso.

Thomas Traumann foi ministro da Comunicação Social da ex-presidente Dilma Rousseff - Danilo Verpa/Folhapress

Thomas Traumann, 51, é jornalista e consultor de comunicação. Formado pela UFPR (Universidade Federal do Paraná), trabalhou nas redações da Folha de S.Paulo, Veja e Época. Esteve no governo entre 2011 e 2015, como porta-voz e ministro de Comunicação Social de Dilma Rousseff (PT). Hoje participa de pesquisas na FGV (Fundação Getulio Vargas). 

 

Por que se almeja tanto o pior emprego do mundo?

Alguns acham que podem consertar as coisas, como o Bresser [governo Sarney], que tinha estudado inflação. Outros pelo partido, como o Antonio Palocci. E há, lógico, a vaidade.

O Delfim Netto é o nosso grande personagem?

O Mário Henrique Simonsen [governo Geisel] funcionou por um bom tempo como contraponto ao próprio Delfim, atacou o congelamento de preços no Sarney, é consultado pelo Collor e é um dos sujeitos que dá aval ao Plano Real, até porque tinha sido professor de teóricos do plano.

Delfim, por ser mais longevo, é há mais tempo uma espécie de ombudsman dos ministérios da Fazenda.

Por que o papel do ministro da Fazenda extrapola o cargo?

O ministro da Fazenda é poderoso. Do patrocínio da Caixa a time de futebol ao preço da passagem de ônibus, tudo passa pela mesa do ministro.

Os ministros não entendem a pressa dos políticos?

É uma relação tensa, as agendas são muito distantes. O próximo ministro tem um problema fiscal gigante e 13 milhões de desempregados. O presidente vai querer imprimir a sua marca, crescer. Enquanto um tem 10, 20 índices para tratar todos os dias, o outro só tem um: a popularidade.

O mercado financeiro volta a pressionar a esquerda?

Em 2002, o nervosismo era maior. O Brasil chegou a fazer acordo com o FMI, o presidente chamou os candidatos para dar uma espécie de aval. O mercado estimou um dólar altíssimo, superado. Lula fez uma carta aos brasileiros que não teve resultado algum nos dias seguintes. Nossa memória diz que o problema foi resolvido ali, mas não foi. O mercado não estava nem aí para ela. Mas faz parte do jogo. O que faz o mercado? Pressiona.

O sr. cita a parceria incomum entre Mantega e Meirelles. Dá para falar o mesmo de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes?

Ali eu falava de duas pessoas de economia. Um presidente do BC muito ortodoxo e um ministro muito heterodoxo. Aqui é o presidente.

Um presidente eleito, no pior cenário, tem 48, 49 milhões de votos. Bolsonaro vai delegar isso? Se for eleito, haverá tensão muito grande em relação a quanto ele vai conceder. Afinal de contas, os votos serão dele e não do Paulo Guedes.

Num eventual governo do PT, o ministro estará mais para Mantega ou Palocci?

Se olhar só o programa do PT seria Mantega. Pelo perfil do Haddad, diria que será mais parecido com Palocci.

Quem seria um bom ministro da Fazenda?

Acho que terá de ter negociação muito próxima com o Congresso mais poderoso da história.

Quem foi o melhor ministro da Fazenda ?

O FHC, que usou a política a favor da economia. Usou a fraqueza do Congresso, em razão da CPI do Orçamento, para conseguir fazer um ajuste fiscal de cara. E a própria candidatura para fazer com que o PFL e o PSDB apoiassem suas medidas. O Palocci consegue autonomia do Lula para montar uma equipe que não tinha votado no PT e uma retomada em curto período. O que é também fundamental.

E o menos sintonizado?

Maílson da Nóbrega [Sarney] enfrentou situação calamitosa de inflação de 40% ao ano. Tem o fim do governo Dilma, com apostas como manter o Mantega.

O sr. deixou o governo Dilma após vazarem críticas suas à comunicação. Foi uma boa hora?

Queria ter deixado logo depois das eleições. Já tinha dado como experiência.

Uma inspiração foi tentar explicar o Brasil a sua irmã, que morava fora. O que diria a ela hoje?

De tédio não morreremos.

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