Bolsonaro prevê R$ 100 bi para 'super Bolsa Família' e vagas em creches

Fim do abono salarial e corte em incentivos tributários seriam fontes de recursos

Julio Wiziack Mariana Carneiro
Brasília

A equipe de Jair Bolsonaro (PSL) prepara duas propostas de grande porte na área social que serão financiadas com o cancelamento de cerca de R$ 68 bilhões em benefícios hoje direcionados a trabalhadores e empresários.

Os dois novos programas custarão quase R$ 100 bilhões por ano ao governo.

Se o candidato for eleito, a ideia é ampliar o Bolsa Família criando uma dimensão "super" ao programa que virou a grande marca da era petista.

A outra proposta prevê a universalização de creches para bebês e crianças de até três anos de idade.

Ambas as iniciativas acenam para famílias com renda domiciliar per capita de até um salário mínimo, especialmente do Norte e do Nordeste, e preservam o acesso de mulheres ao mercado de trabalho.

São os eleitores mulheres e de grupos mais pobres os que apresentam maior resistência à candidatura do capitão reformado do Exército.

Para implementar esses programas, os assessores de Bolsonaro planejam acabar com o abono salarial, incorporando esses recursos —R$ 19 bilhões, em 2019—, e cancelar incentivos tributários para empresas no montante de R$ 49 bilhões por ano.


De onde virá  o dinheiro
R$ 19 bi - em 2019 serão destinados ao programa do 'super Bolsa Família' e de universalização do acesso às creches no país com o fim do abono salarial
R$ 49 bi - anuais serão incorporados ao programa por meio do cancelamento de incentivos tributários para empresas 
R$ 30 bi - por ano sairão do Orçamento da União e já são destinados atualmente ao Bolsa Família, que ganhará outro nome no eventual governo Bolsonaro


Os outros R$ 30 bilhões sairão do Orçamento da União já destinado ao Bolsa Família --que seria ampliado e ganharia outro nome.

Hoje, o programa atende 47 milhões de brasileiros, 21% da população, principalmente no Nordeste, onde Bolsonaro perdeu para Fernando Haddad (PT) no primeiro turno da eleição presidencial.

Ainda sem nome, o "super Bolsa Família" de Bolsonaro foi desenhado por Sergei Soares, ex-presidente do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada) e mestre em economia pela UnB (Universidade de Brasília).

A ideia, segundo Soares, é rever os diversos benefícios sociais hoje pagos pela União e unificá-los, como foi feito com a criação do Bolsa Família.

"Hoje é uma colcha de retalhos", disse. "Há sobreposições [de programas], sem articulação", afirmou Soares.

O especialista disse que recebeu de Paulo Guedes, assessor econômico de Bolsonaro, a orientação para racionalizar os gastos, aproveitando o que já existe para criar um novo "marco de proteção social".

A ideia é ter padronização de regras.

Inicialmente, a proposta de Soares previa a unificação de cinco benefícios. Além do Bolsa Família e do abono, ele pretendia incorporar o salário-família, as deduções de Imposto de Renda e o BPC (Benefício de Prestação Continuada).

No entanto, a legislação em vigor não permite a eliminação dos três últimos programas. Com isso, a equipe optou pelo formato mais enxuto.

Pela proposta, os beneficiários que deixarem de receber o abono salarial serão incorporados ao novo programa.

A principal mudança é garantir que os beneficiários do super Bolsa Família possam continuar recebendo até 75% dos recursos caso consigam emprego.

Hoje, quem consegue um emprego com carteira perde direito ao benefício, o que, segundo críticos, estimula a dependência dos cadastrados à ajuda do governo federal.

Nesta quarta (10), em vídeo, Bolsonaro anunciou ainda que pretende criar um "13º salário" para o Bolsa Família. Os recursos viriam do combate às fraudes no programa.

Em outra frente, está o programa que prevê a universalização de creches em período integral para crianças que vivem em lares com renda domiciliar per capita de até um salário mínimo por mês.

A previsão é que esse processo ocorra em três etapas, começando com famílias que vivem com renda mensal domiciliar per capita de até um quarto do salário mínimo.

O público-alvo será identificado a partir do cadastro único do Bolsa Família.

O projeto prevê creches públicas e o credenciamento de escolas mantidas por entidades não governamentais, como igrejas e associações civis.

O cadastramento, nesse caso, será feito pelas prefeituras.

O PNE (Plano Nacional de Educação) tem como meta atender 50% das crianças com essa idade até 2024, com recursos da União, dos estados e dos municípios.

Hoje, 26% das crianças de baixa renda são atendidas.

Embora haja demanda pelo atendimento público, o PNE não prevê a cobertura de 100% das crianças, uma vez que o ensino nessa idade não é obrigatório e muitos pais optam por manter o cuidado em casa.
A obrigatoriedade só começa aos quatro anos.

A ideia da equipe de Bolsonaro é centralizar na União a condução dessa política, que pretende dar assistência às 2,6 milhões de mulheres que precisam trabalhar e não têm com quem deixar os filhos.

No Nordeste, elas chefiam quase 1 milhão de lares. No Norte, são cerca de 300 mil.

"Essa política tem o potencial de melhorar significativamente a condição das mulheres de mais baixa renda no Brasil, permitindo melhores condições também no mercado de trabalho", diz a proposta a que a Folha teve acesso.

Seus aliados afirmam que a política também ajudaria a reduzir a diferença salarial entre homens e mulheres. Bolsonaro vem sendo criticado, na campanha eleitoral, por não apresentar respostas ao problema.

O investimento anual para levar o plano de creches em tempo integral adiante varia de R$ 4.000 a R$ 7.000 por criança —o que corresponderia a um custo de manutenção de R$ 29 bilhões a R$ 49 bilhões por ano.

Os recursos, ainda segundo a proposta, serão levantados com o cancelamento de até 20% dos benefícios tributários concedidos a empresas.

"O novo governo visa os indivíduos e menos os incentivos para empresas", diz a proposta.

"Diversos estudos mostram a ineficácia desses programas de incentivo. O governo federal vai construir um mapa de quais dessas políticas devem ser suspensas."

O plano, porém, é de difícil execução.

Quando Michel Temer assumiu a Presidência, o Ministério da Fazenda fez uma avaliação de cerca de 300 incentivos fiscais em vigor que, caso fossem cancelados ou modificados, poderiam gerar economia de cerca de R$ 15 bilhões.

A ideia acabou revista porque a equipe econômica não conseguiu convencer o Congresso a derrubar as leis que criaram esses incentivos.

A opção que restou foi cancelar programas que iam vencendo. Mesmo assim, houve resistência.

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