Descrição de chapéu The Washington Post

Morte de jornalista em embaixada árabe esvazia conferência chamada de 'Davos no deserto'

Executivos e empresas de comunicação anunciam que não irão participar de evento

Washington | The Washington Post

O crescente número de empresas ocidentais que se distanciaram da Arábia Saudita após o suposto assassinato do dissidente Jamal Khashoggi está minando o esforço do reino em diversificar sua economia para além do petróleo.

Na sexta-feira (12) à tarde, uma dúzia de empresas de tecnologia, mídia e entretenimento abandonaram a conferência de investimentos saudita que será realizada entre os dias 23 e 25 deste mês. o evento é apelidado de "Davos no deserto", em referência ao fórum econômico suíço.

Uma das empresas que estava entre os beneficiários dos US$ 27 milhões (R$ 101 milhões) que a Arábia Saudita gastou fazendo lobby nos EUA em 2017, anunciou que iria parar sua representação. "Estamos encerrando nosso relacionamento", disse Richard Mintz, diretor administrativo do The Harbour Group.

Segurança observa movimento em frente ao consulado da Arábia Saudita em Istanbul, Turquia - Petros Giannakouris/AP

As empresas e os executivos que estão se afastando do reino, incluindo a Uber, e a Viacom, são os mesmos com que o príncipe herdeiro Mohammed bin Salman procurou  aproximação no ano passado, na tentativa de modernizar sua economia. e garantir empregos para sua população jovem. Mais de 60% dos sauditas têm menos de 30 anos.

Pode haver limites para a disposição do mundo corporativo de censurar os sauditas. Bancos e firmas de consultoria que obtêm grandes somas por emitir títulos para a Arábia ou oferecer conselhos estratégicos têm permanecido em parte fiéis aos seus planos de patrocinar ou participar da conferência de Riad, apelidada de Davos no deserto.

Até agora a Casa Branca evitou duras críticas, com o secretário do Tesouro, Steve Mnuchin, dizendo na sexta-feira (12) que ainda planeja participar da cúpula, declaração que foi condenada por democratas no Senado.

O presidente Donald Trump chamou a suspeita de Khashoggi de matar uma "coisa terrível", mas não chegou a atribuir culpa e notou que o dissidente não era cidadão americano.

Um grande objetivo do príncipe herdeiro é criar mais um setor privado para afastar as pessoas da folha de pagamento do setor público, segundo Karen Young, uma especialista saudita do American Enterprise Institute.

O governo turco disse a autoridades norte-americanas que possui gravações de áudio e vídeo provando que Khashoggi foi morto dentro do consulado saudita em Istambul este mês.

Autoridades sauditas negaram qualquer envolvimento no desaparecimento de Khashoggi, dizendo que ele deixou o consulado pouco depois de entrar.

Mohammed bin Salman chegou ao poder em junho de 2017, substituindo seu primo como príncipe herdeiro. Sob sua liderança, o reino lançou o plano Visão 2030, para atrair mais investimentos estrangeiros, impulsionando o papel das mulheres na força de trabalho e construindo um setor privado em outras indústrias além da energia.

Antes de os protestos contra o desaparecimento de Khashoggi começarem a ganhar força, a segunda conferência da Iniciativa de Investimento Futuro estava programada para atrair dezenas de altos executivos ocidentais.

Isso começou a mudar na noite de quinta-feira (11). O presidente-executivo da Uber, Dara Khosrowshahi, disse em comunicado que estava se retirando do evento, e também afirmou estar "muito perturbado" com os relatórios sobre Khashoggi.

"Estamos acompanhando a situação de perto e, a menos que surja um conjunto substancialmente diferente de fatos, não participarei da conferência da FII em Riad", disse Khosrowshahi.

Ativista usa máscara do príncipe saudita Mohammed bin Salman em Washington, durante protesto pelo desaparecimento do jornalista saudita Jamal Khashoggi - Jacquelyn Martin/AP

O investidor de tecnologia Steve Case também suspendeu os planos para participar da conferência e de uma reunião para um projeto de turismo saudita.

Bob Bakish, presidente-executivo da Viacom Inc., dona da MTV e do estúdio cinematográfico Paramount Pictures, também afirmou que deixará de participar da conferência.

O Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita, que está organizando o evento, não respondeu a um pedido de comentário.

Os anúncios das empresas foram seguidos por empresas de comunicação. O proprietário do New York Times e do Los Angeles Times, Patrick Soon-Shiong, cancelou a participação dos jornais no evento saudita. Sexta-feira de manhã, a CNN e a Bloomberg também cancelaram suas coberturas.

Figuras bem conhecidas no mundo da tecnologia dos EUA também se afastaram de um projeto saudita chamado NEOM, que tem o objetivo de construir um centro de tecnologia e turismo no noroeste do país.

Sam Altman, presidente da Y Combinator, afirmou que estava suspendendo o envolvimento com o conselho consultivo da NEOM "até que os fatos sobre o desaparecimento de Jamal Khashoggi sejam conhecidos".

Imagem obtida de câmeras de segurança mostra o Jamal Khashoggi entrando no consulado saudita em Istambul antes de desaparecer - CCTV/Hurriyet/AP

Mas as indústrias de finanças e consultoria têm permanecido em silêncio sobre o caso Khashoggi. Um porta-voz do JPMorgan disse na quinta-feira (11) que o banco não tem comentários sobre se o suposto assassinato afetaria os planos do presidente-executivo Jamie Dimon, que está na lista de palestrantes.

A empresa de investimentos Kohlberg Kravis Roberts & Co. também se recusou a comentar. Seu presidente, o general David Petraeus, e o vice-presidente, Joseph Bae, estão programados para falar no evento.

Mais de 30 empresas e executivos norte-americanos e europeus listados como patrocinadores ou palestrantes da conferência, incluindo MasterCard, McKinsey e Deloitte, não responderam aos pedidos de comentários.

Particularmente, vários lobistas sauditas disseram que estavam esperando por mais informações antes de tomar uma decisão sobre a continuidade da participação em atividades de lobby e relações públicas em Washington. Um lobista disse que sua empresa estava pensando em anunciar que doaria as taxas recebidas da Arábia Saudita para caridade.

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