Cela austera no Japão contrasta com estilo de vida cosmopolita de Ghosn

Celas não dispõem de aquecedores, por medo de os detentos se ferirem, e tampouco rádios ou televisores

Tóquio | Reuters

Procuradores públicos japoneses confirmaram que Carlo Ghosn, o ex-presidente do conselho da Nissan, está preso no espartano Centro de Detenção de Tóquio, cujas diversas regras e restrições contrastam fortemente com o estilo de vida confortável e cosmopolita de que ele desfruta.

É provável que Ghosn esteja preso em uma pequena cela de 4,8 metros quadrados, com um vaso sanitário em um dos cantos, disseram especialistas que conhecem bem o centro de detenção.

Muitas das celas estão equipadas com os tradicionais tatames de palha japoneses e com um futon, para servir como leito. Outras têm camas em estilo ocidental, disse um repórter da agência Reuters que já visitou o local.

Os prisioneiros têm autorização para tomar banho a intervalos de alguns dias, ainda que não todo dia, disse Hideto Ninomiya, um advogado de defesa criminal que visitou o local três meses atrás.

As celas não dispõem de aquecedores, por medo de os detentos se ferirem, e tampouco rádios ou televisores, ele disse. Os suspeitos além disso não têm acesso a laptops ou celulares.

"Não há necessidade de conforto porque não estamos falando de um hotel", disse Yasuyuki Deguchi, professor da Universidade do Futuro em Tóquio. "Mas é um ambiente arrumado, higiênico e ordeiro".

Cintos e gravatas, bem como roupas de baixo longas, são proibidos, como forma de evitar tentativas de suicídio, disse Tsutomu Nakamura, antigo procurador público na capital japonesa, Tóquio.

O centro de detenção é bastante frio nessa época do ano, disse Takafumi Horie, um empresário de internet condenado por fraude, aos seus seguidores na rede social Twitter.

Ghosn foi detido na segunda-feira e ainda não foi acusado formalmente. A lei japonesa permite que suspeitos fiquem até 23 dias detidos antes que as autoridades precisem apresentar acusações contra eles.

A Nissan Motor, da qual Ghosn foi presidente-executivo até 2017, o acusa de usar dinheiro da empresa para fins pessoais e de conspirar com Greg Kelly, integrante do conselho da companhia, que também está preso, para declarar renda inferior à efetivamente auferida por Ghosn nos cinco anos iniciados em 2010.

Todos tratados do mesmo modo

O centro de detenção, uma torre na região leste de Tóquio, é o lugar em que o líder do culto apocalíptico Aum Shinrikyo, que realizou um ataque com o gás sarin contra o metrô de Tóquio em 1995, foi executado este ano, por enforcamento.

Nakamura descartou rumores de que Ghosn estava preso em uma cela especial para prisioneiros importantes, afirmando que "todos são tratados da mesma maneira, mesmo um primeiro-ministro ".

A comida servida aos prisioneiros consiste em geral de marmitas, com pouca variedade, acrescentou Ninomiya. Os detidos não têm autorização de dormir durante o dia, disse repórter da agência Reuters que já visitou o local.

Os prisioneiros têm contas na central de detenção e dinheiro pode ser depositado nelas para que comprem comida e produtos de higiene adicionais na loja interna. Seus parentes também estão autorizados a lhes enviar comida, livros, revistas e roupas.

O centro de detenção tem muitos estrangeiros entre seus prisioneiros, e está equipado para lidar com pessoas que falem outros idiomas, disse Deguchi,

"Ser estrangeiro não significa que você está em desvantagem, lá", ele disse. "O pessoal que trabalha lá está acostumado a prisioneiros estrangeiros".

As visitas de familiares e amigos estão limitadas a 15 minutos, uma vez por dia. Não estava claro, de imediato, quanto tempo de contato com seus advogados os detentos estão autorizados a ter.

Ao visitar clientes presos no local, Ninomiya conversa com eles em uma sala mas fica separado dos detentos por uma parede de vidro. Alguns dos detentos usam suas roupas comuns e outros usam uma calça e um agasalho de moletom fornecidos pelo centro de detenção, ele disse.

"Eles usualmente estão em choque e dizem que é especialmente difícil estar em uma cela individual, porque não podem falar com ninguém", disse Ninomiya.

A experiência é especialmente difícil "para membros da elite apanhados por crimes financeiros", ele acrescentou. "Eles não aguentam, e isso os faz querer confessar".
 
Tradução de PAULO MIGLIACCI

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