Presidente do conselho da Nissan deve perder o posto após prisão no Japão

Executivo nascido no Brasil, Carlos Ghosn é investigado por fraude financeira

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Paris e Tóquio

O presidente do conselho de administração da Nissan, Carlos Ghosn, foi preso nesta segunda-feira (19) por supostas violações financeiras no Japão. Ele é suspeito de sonegação, ao declarar às autoridades uma renda inferior à real.

O presidente-executivo da Nissan, Hiroto , irá propor ao conselho de administração da empresa a destituição de Ghosn em reunião marcada para quinta-feira (22).

Carlos Ghosn, presidente do conselho de administração da Nissan; ele foi preso por supostas violações financeiras no Japão
Carlos Ghosn, presidente do conselho de administração da Nissan; ele foi preso por supostas violações financeiras no Japão - Geoff Robins/AFP

Admirado por salvar a montadora japonesa da falência, Ghosn também é executivo-chefe da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi. A empresa afirmou que Ghosn ocultou sua renda do fisco durante anos e que “várias outras práticas ilícitas foram descobertas, como o uso de bens da empresa com fins pessoais”.

Ele e outro diretor da montadora, Greg Kelly, são alvo de investigação interna há meses, segundo nota divulgada pela Nissan, que afirmou colaborar com os procuradores. 

Representantes de Ghosn não foram localizados para comentar o caso. 

O presidente francês, Emmanuel Macron, disse que trabalhará para preservar a estabilidade da aliança Renault-Nissan e que ainda era cedo para comentar as acusações. “Como um acionista, o governo francês continuará vigilante quanto à estabilidade da aliança”, disse.

O governo tem 15% do capital da Renault. Segundo a mídia local japonesa, Ghosn teria declarado renda de € 38 milhões (R$ 163 milhões) menor do que a real.

A prática teria começado em 2011 e durado mais de cinco anos. O salário do executivo é objeto de controvérsia há anos. Ele chegou a ganhar mais de € 15 milhões (R$ 64,4 milhões) pelo acúmulo de funções na Nissan e na Renault, mas o valor caiu em 2017, quando deixou de ser o executivo-chefe da montadora japonesa.

Em junho, ao ser reconduzido ao posto de número um da empresa francesa, aceitou um corte de 30% no salário —uma demanda de acionistas —e a nomeação de um número dois, Thierry Bolloré.

As ações de Renault e Nissan despencaram nas Bolsas da Europa nesta segunda, após a notícia da prisão. A Bolsa japonesa já estava fechada quando o fato foi divulgado. 

Nascido no Brasil, descendente de libaneses e cidadão francês, Ghosn, 64, iniciou carreira na Michelin, na França, onde trabalhou por 16 anos, e foi para a Renault. Ele chegou a Tóquio em 1999 para recolocar a Nissan nos trilhos, no momento em que a empresa acabava de se unir à francesa Renault.

Foi nomeado presidente-executivo dois anos depois.Com cerca de US$ 20 bilhões (R$ 75 bilhões) em dívidas, a Nissan sofreu um tratamento de choque na época. Houve demissões, encerramento de parcerias e fechamento de linhas pouco produtivas.

Apelidado de “cortador de gastos”, transformou um grupo à beira da falência em empresa lucrativa com volume anual de negócios de quase € 100 bilhões (R$ 429 bilhões), o que lhe valeu grande admiração no Japão —chegou a ser personagem de mangá.

Após o plano de recuperação, a companhia registrou lucros recordes. Em 2005, o executivo passou a presidir também a Renault, sendo a primeira pessoa a liderar duas montadoras simultaneamente. Em 2008, Ghosn passou a acumular a liderança do conselho de administração da Nissan.

Em abril de 2017, entregou o bastão para Hiroto Saikawa, ainda permanecendo à frente do conselho de administração. Passou a se concentrar na aliança da Renault com a Mitsubishi Motors, que ele levou para o topo da indústria automobilística mundial.

No mesmo ano, a empresa havia investido na Mitsubishi, após a companhia ser afetada por escândalo sobre falsificação de dados sobre emissão de poluentes.

A parceria Renault-Nissan-Mitsubishi é, hoje, uma aliança constituída de distintas empresas ligadas por participações cruzadas não majoritárias.

As acusações contra Carlos Ghosn, que construiu essa aliança sozinho, acumulando funções como nenhum outro executivo desse nível até então, são um duro golpe no trio franco-japonês que reivindica o título de primeiro conglomerado automobilístico mundial.

No ano passado, foram 10,6 milhões de carros leves vendidos, superando os concorrentes Toyota e Volkswagen.

Durante a superlotada entrevista à imprensa na sede da Nissan, nesta segunda, Saikawa descreveu Ghosn e Kelly como “mandantes” das irregularidades e disse sentir “forte indignação”.

Na entrevista, houve momentos em que Saikawa parecia determinado a derrubar a imagem de seu predecessor como salvador da empresa, referindo-se a mudanças que Ghosn “deflagrou” mas atribuindo o crédito real ao valor “propiciado por grande número de trabalhadores”.

Tradução de Paulo Migliacci  

Com Reuters, AFP e Financial Times

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