Família Civita vende Abril pelo preço simbólico de R$ 100 mil

Empresário Fábio Carvalho, com apoio do BTG, vai negociar dívida de R$ 1,6 bi

Nelson de Sá
São Paulo

A família Civita fechou a venda do Grupo Abril para o empresário Fábio Carvalho, das redes de lojas Casa & Vídeo e Leader, sediadas no Rio, e deixou a imprensa depois de 68 anos.

O valor do negócio, simbólico, é de R$ 100 mil. O grupo tem uma dívida de R$ 1,6 bilhão, sendo dois terços com Itaú, Bradesco e Santander, e está em recuperação judicial desde 16 de agosto. A expectativa é que a compra esteja concluída em um mês e meio.

Carvalho, que é advogado, tem um histórico de assumir empresas em dificuldades para buscar eventual retomada. Para viabilizar a nova compra, ele tem o suporte da Enforce, do BTG Pactual, que conversa com os três bancos para adquirir com desconto a dívida de R$ 1,1 bilhão.

O BTG está em seus planos também para investimento e parceria. "É um banco com o qual a gente tem relação há muitos anos", diz. "É o único banco de porte que tem área específica dedicada a financiamentos para empresas em reestruturação. Área da qual a gente já tomou muito dinheiro emprestado e já pagou muito dinheiro de volta."

Por enquanto, o que antecipa é injetar, no fechamento da operação, esperado para fevereiro após a aprovação pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), R$ 70 milhões de recursos próprios.

Logotipo da Editora Abril em prédio do grupo na marginal Tietê, em São Paulo
Logotipo da Editora Abril em prédio do grupo na marginal Tietê, em São Paulo - Mastrangelo Reino - 25.nov.10/Folhapress

Ele afirma que o Grupo Abril "vem evoluindo muito rapidamente no controle do desempenho financeiro", nestes quatro meses em recuperação judicial, e "com esse reforço vai atingir nova estabilidade". Não há previsão de cortar mais títulos de revistas.

"Queremos evitar que um processo de crise venha a afetar um dos grandes ativos do grupo, que é sua história, seus padrões de jornalismo", disse.

"A gente quer manter e partir para melhor, com a adoção de novas plataformas para oferecer esse conteúdo."

Um dos projetos teria como parceiro o próprio BTG. "Onde existe uma demanda grande, não só do BTG, é por mais fluxos de visitantes digitais focados em investimento. Esse é o princípio por trás de empresas como Infomoney. É uma oportunidade que a gente vai explorar, sim."

Para tanto, o grupo "tem a Exame, tem uma tradição de cobertura de negócios". Embora repita não ser o único, Carvalho diz que "o BTG é manifestamente interessado nesse tipo de audiência".

De maneira geral, o empresário diz que se trata de um conteúdo "de alta demanda, alta valorização", que será buscado também por todos os concorrentes, mas que, embora seja aquele "do momento, o que está em voga", há outros em evolução.

O objetivo maior, diz, é "encontrar novos paradigmas para a instituição imprensa". Trata-se de "desafio não só empresarial mas institucional, de encontrar a forma de fazer jornalismo com sustentabilidade e qualidade, devolvendo um pouco mais de racionalidade às conversas" no país.

"A gente acabou de passar por momentos de debates bem rasos, extremados", acrescenta. "Está muito claro que a conversa precisa voltar a ficar mais rica."

Após propor o negócio há quatro meses, Carvalho foi diagnosticado com câncer no intestino, ainda no princípio. O tratamento que se seguiu, ao mesmo tempo em que o negócio avançava, incluiu quimioterapia e foi bem-sucedido, afirma: "Recuperei rápido, novo em folha".

Antes de se lançar como empresário com a Casa & Vídeo, Carvalho atuara em diversos processos de recuperação de empresas realizados pela consultoria Alvarez & Marsal, onde trabalhava. A primeira foi a companhia aérea Varig, e a última, a própria Casa & Vídeo.

Ele deve assumir em fevereiro como presidente-executivo do Grupo Abril, no lugar de Marcos Haaland, sócio da mesma Alvarez & Marsal que foi chamado para iniciar a recuperação.

Em nota, Giancarlo Civita, que presidia o grupo, afirmou sobre Carvalho: "A família delega a ele a tarefa de administrar os desafios e as oportunidades que estão no horizonte da nova mídia. Fábio reúne as características de empreendedor e a visão de negócio que os novos tempos exigem".

Ainda sobre as dívidas e o processo de recuperação judicial, Carvalho afirmou que "o privilégio legal e moral é dos mais necessitados, as [dívidas] trabalhistas".

Paulo Zocchi, presidente do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo, afirmou que "a recuperação judicial prossegue, com seus ritmos e prazos, e o sindicato tem uma posição clara". "Todas as dívidas trabalhistas e dos freelancers têm de ser pagas o mais rápido possível e na íntegra."

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