Fundação Carlos Chagas é investigada por gestão de investimentos duvidosos

Entidade dedicada a concursos públicos aplicou R$ 650 milhões em créditos de empresas deficitárias

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São Paulo

A FCC (Fundação Carlos Chagas), uma das maiores realizadoras de concursos públicos do país, está sendo investigada pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal por investimentos duvidosos que fez desde 2013.

Está em análise o uso de cerca de R$ 650 milhões na compra de créditos de empresas em dificuldades financeiras e em fundos de investimentos geridos pela Diamond Mountain (DMI Group).

A gestora de recursos é investigada em inquérito no STF (Supremo Tribunal Federal) por supostamente ter como sócio oculto o senador Edison Lobão (MDB-MA).

Prédio do Tribunal de Contas do DF
Prédio do Tribunal de Contas do Distrito Federal - Pedro Ladeira/Folhapress

Se ficar comprovada a falta de diligência da fundação na aplicação de seu patrimônio, ela pode perder o contrato que fez, sem licitação, com a Câmara Legislativa do Distrito Federal e enfrentar questionamentos em todo o país.

Sob sua gestão estão em andamento 55 concursos públicos para prefeituras, estados e tribunais espalhados pelo país. Boa parte deles foi contratada sem licitação.

A lei permite esse tipo de contratação desde que seja feito por entidade sem fins lucrativos e que não haja dúvida sobre a reputação ético-profissional do órgão contratado.

A Folha teve acesso a uma série de documentos anexados a processos judiciais e administrativos que envolvem a FCC. Com eles, é possível ter uma dimensão dos investimentos.

O patrimônio da fundação há dois anos era de R$ 1 bilhão. Desse total, cerca de R$ 360 milhões estão aplicados em cédulas de crédito bancário e debêntures.

Trata-se, no caso, de dívidas de empresas pouco conhecidas, que estão sendo questionadas na Justiça ou extrajudicialmente —ou seja, estão sem pagamento.

Boa parte das cerca de 20 empresas do portfólio entrou em dificuldades financeiras e deixou de pagar financiamentos. Algumas alegam que repassaram pagamentos aos bancos, que teriam cedido os créditos à fundação, mas não repassaram os pagamentos.

Cerca de outros R$ 300 milhões foram colocados nos fundos Mirzam Investimentos e Diamond Mountain Corporativo. Os fundos são geridos pela Diamond, administrados pela Planner Corretora e têm como cotista exclusivo a FCC.

Entre os ativos comprados pelos fundos está a Terra Limpa Participações, empresa que se tornou o estopim do processo que agora corre no Tribunal de Contas do Distrito Federal.

A Terra Limpa é investigada por supostamente ter inflado patrimônio com a aquisição de falsas propriedades em diferentes locais do país, entre eles o Maranhão, estado de Lobão.

Em 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, com base em depoimentos de ex-sócios da Diamond, pediu abertura de inquérito no STF alegando que Lobão poderia ser sócio oculto da Diamond.

O advogado de Lobão, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, diz que o inquérito não teve nenhum andamento ou acrescentou fato novo ao que se suspeitava. Kakay pediu o arquivamento antecipado do inquérito, que está com o ministro Luís Barroso.

Na Justiça de São Paulo, no processo civil que envolve a Terra Limpa, no entanto, não há nenhuma menção objetiva a Lobão.

O processo é movido por Paulo de Moraes Nunes, servidor do Senado que pede indenização de R$ 51 milhões da Diamond, da Planner corretora, da Fundação Carlos Chagas e de Arquimedes Celeri, um dos sócios da Terra Limpa. 

De um lado, Nunes argumenta que vendeu sua empresa Florestal para a Terra Limpa com a promessa de virar sócio. Ao fazer o negócio, diz ter repassado a companhia com 80 funcionários, fornecendo para grandes empresas, sem nenhum título protestado ou pagamentos atrasados.

Em 12 meses, diz ele, essa situação mudou e a empresa foi destruída.

A Diamond, responsável pela gestão da Terra Limpa, diz que Nunes entregou uma empresa em ruínas. Planner e FCC alegam não terem nada a ver com o processo. Caberá à Justiça definir as responsabilidades.

O processo, porém, foi suficiente para levantar dúvidas entre integrantes do plenário do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que aceitaram uma investigação sobre o caso para apurar a reputação da FCC.

No processo, a fundação coloca na conta do ex-presidente Fernando Calza Freire todos os maus investimentos que possam ter sido feitos.

A fundação move um processo contra Freire por gestão temerária. Freire, por sua vez, refuta que tenha feito as aplicações sozinho e insiste no processo que a fundação forneça seu balanço.

Segundo pessoas que conhecem o caso, a fundação poderia se complicar se anexasse o balanço, já que não teria reconhecido as perdas dos investimentos. Se reconhecer as perdas, pode perder o equilíbrio econômico que lhe permite participar de licitações.

A FCC afirma, no processo, que tomou todas as medidas de compliance (procedimento legais) desde que descobriu aplicações temerárias. No caso dos fundos administrados pela Diamond, diz que contratou uma empresa independente para avaliar o patrimônio e promover sua liquidação. 

A fundação afirma ainda que não o fez até agora porque não havia liquidez nos ativos, mas que suspendeu desde maio qualquer novo aporte no fundo.

A denúncia recebida pela Procuradoria do Tribunal de Contas diz que a fundação continuou fazendo aportes mesmo depois da saída de Calza Freire e que não tomou nenhuma medida para destituir a Planner ou a Diamond.

Somente na semana passada a Diamond foi destituída da gestão, segundo informes enviados à CVM (Comissão de Valores Mobiliários).

O diretor da Planner, Arthur Figueiredo, disse à Folha que não há irregularidade nas propriedades da Terra Limpa.

A Diamond não tem telefones ou site ativo. Os advogados da empresa, do escritório Sergio Bermudes, renunciaram ao processo na semana passada. Pessoas próximas informaram que nem eles conseguiam contato com a empresa.

Arquimedes Celeri e Paulo Nunes não quiseram fazer comentários.

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