Sojicultor dos EUA sofre com guerra comercial

Entre setembro e dezembro, volume embarcados nos terminais da Cargill na Louisiana caíram 40%

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Gregory Meyer

Os últimos 370 km do rio Mississippi sustentaram por muito tempo o poderio americano nos mercados de alimentos globais. Dez terminais de grãos se erguem como fortalezas acompanhando suas curvas, recebendo safras das fazendas rio acima, armazenando-as em silos de concreto e enviando-as sobre os diques para os porões de navios estrangeiros. Juntos, podem exportar 500 mil toneladas por dia. 

Mas neste ano a alta temporada, no outono, não veio. A quantidade de cereais e sementes oleaginosas que passa pelos portos fluviais do Mississippi caiu 9% sobre 2017. 

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Colheita de soja na Carolina do Norte; sobretaxa da China ao produto americano derrubou embarques - Charles Mostoller - 29.nov.18/Reuters

A Cargill, maior corretora agrícola do mundo, desativou várias vezes seus dois terminais no rio, incluindo um fechamento de cinco dias em novembro quando os trabalhadores ficaram em casa, sem remuneração. "Nunca fizemos isso", disse Jeremy Seyfert, diretor do terminal. "Fechamos a usina por cinco dias porque não havia o que carregar."

Entre setembro e dezembro, os volumes de soja embarcados nos terminais da Cargill na Louisiana caíram 40% em relação ao ano anterior.

O distúrbio na foz do Mississippi é um resultado agudo da guerra comercial EUA-China. Depois que Donald Trump impôs novas tarifas aos produtos chineses, Pequim revidou com taxas sobre as exportações americanas, incluindo a maior parte de seus US$ 20 bilhões em venda de commodities.

As exportações de soja, de US$ 12 bilhões em 2017, foram as mais atingidas. A conquista dos campos agrícolas pela semente oleaginosa nos últimos 20 anos se resumiu em geral a agricultores americanos jogando com a demanda chinesa por proteína para alimentar porcos e frangos. 

Pequim aumentou as tarifas sobre a soja em 25 pontos percentuais em julho, tirando a safra americana do maior mercado mundial e fazendo disso um símbolo da deterioração das relações bilaterais.

As esperanças cresceram no cinturão agrícola dos EUA depois que Trump e o dirigente Xi Jinping, se reuniram em Buenos Aires no fim do ano e concordaram em não intensificar sua disputa por 90 dias, período que termina em 2 de março. Pequim comprou nas últimas semanas alguns milhões de toneladas de soja para sua reserva governamental, em um sinal de boa vontade.

Mas o mercado está cético sobre a possibilidade de uma distensão permanente.

"A realidade é que estamos nas fases iniciais de uma nova Guerra Fria", disse Jan Lambregts, chefe global de pesquisa de mercados financeiros no Rabobank, um credor no setor de alimentos e agricultura. 

"A China atirou a luva: quer ser o número um. Os EUA responderam dizendo que isso não vai acontecer. Nesse contexto, não posso ver um acordo duradouro."

Mesmo que Pequim e Washington façam as pazes, as consequências do impasse da soja de 2018 serão duradouras. Veteranos do mercado lembram que um embargo americano em 1973 às exportações de soja provocou a ascensão do Brasil como grande ator no setor. 

"Quando você é marcado com o símbolo de um fornecedor inconfiável, é difícil recuperar completamente as vendas perdidas", disse Scott Irwin, economista agrícola na Universidade de Illinois.

A segurança alimentar é prioridade para Pequim. A incerteza sobre as relações com os EUA poderá levá-la a diversificar ais suas fontes de soja. 

O maior vencedor na guerra comercial até agora foi o Brasil, pois a China comprou a sua colheita anterior. As margens de lucro bruto para os agricultores superaram 50% em Mato Grosso, comparadas com uma média histórica de 30%, segundo Guilherme Bellotti, analista sênior do Itaú BBA. 

Financial Times, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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