Com disputa, ágio em leilão de aeroportos vai a R$ 2,2 bi

Percepção é que valor final foi elevado porque governo subavaliou potencial de terminais

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Com forte concorrência e presença de diversas companhias estrangeiras, o leilão de 12 aeroportos regionais, realizado nesta sexta-feira (15), arrecadou R$ 2,38 bilhões em outorga para os cofres do governo federal e R$ 3,5 bilhões em investimentos, que serão aplicados ao longo dos 30 anos dos contratos. 

Foram leiloados três blocos, nas regiões Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. 

A espanhola Aena, a suíça Zurich e o consórcio Aeroeste, liderado pela brasileira Socicam, pagaram R$ 2,16 bilhões acima do valor mínimo exigido pelo governo, o que representa um ágio de 986% .

Investidores de consórcios perdedores consideraram que o ágio final foi muito elevado porque os lances mínimos definidos para o certame foram subestimados.

Ainda assim, a avaliação é de que o resultado foi positivo e que sinaliza otimismo dos investidores em relação ao crescimento do país. A percepção é que as próximas rodadas de leilões, já anunciadas pelo governo, tenham resultado igualmente favorável.

"O leilão foi um sucesso e é fruto de um contato de concessão mais equilibrado. Existe uma aposta no país. Os investidores conseguem vislumbrar os próximos passos do setor. Ele já sabe que há uma perspectiva de que aeroportos como Congonhas e Santos Dumont sejam leiloados. Isso torna o mercado muito mais atrativo", diz Bruno Werneck, sócio do escritório Mattos Filho, que representou a Vinci, uma das competidoras. 

No caso do bloco do Nordeste, o principal ativo do leilão, o lance mínimo exigia o pagamento de R$ 171 milhões na assinatura do contrato. Ao fim da disputa entre a espanhola Aena e a suíça Zurich, o valor subiu para R$ 1,9 bilhão. 

A vencedora foi a estatal Aena, responsável pelo aeroporto de Madri-Barajas e com operações no México, na Colômbia e no Reino Unido. 

No Brasil, este será o primeiro investimento da companhia, que já havia participado de leilões no passado, sem sucesso. 

A empresa vai operar seis aeroportos no Nordeste e terá que fazer R$ 2,15 bilhões de investimentos. O aeroporto internacional de Recife é o principal ativo do bloco.

A suíça Zurich não conseguiu superar o lance da espanhola, mas levou outro bloco, da região Sudeste, que inclui os aeroportos de Vitória (ES) e Macaé (RJ). 

A proposta foi de R$ 437 milhões de outorga ao governo, também bastante superior ao valor mínimo exigido no edital, de R$ 46,9 milhões.

A Zurich já possui atuação no país, mas mantém seu apetite por mais aeroportos. Além de ser sócia de Confins (MG), a empresa assumiu o aeroporto internacional de Florianópolis na última rodada de concessões de 2017. 

O grupo também voltou a manifestar interesse por Viracopos, em Campinas, que está em recuperação judicial.

"O aeroporto de Viracopos nos interessa, mas sua estrutura financeira está completamente arruinada. Isso precisa ser resolvido", disse Stefan Conrad, presidente da operação na América Latina.

Para dar lances competitivos, as empresas estrangeiras podem ter se beneficiado do acesso a financiamento mais barato fora do país, com juros mais baixos, diz o analista do Credit Suisse Felipe Vinagre.

A Aena, que deverá fazer os maiores desembolsos deste leilão, vai financiar os investimentos com recursos próprios, disse Juan José Alvarez, diretor internacional do grupo. 

A Zurich afirmou que a intenção da companhia é "buscar recursos no mercado brasileiro", mas não quis dar mais informações sobre sua estrutura de financiamento.

No caso da espanhola Aena, a empresa também pode ter aceitado pagar um preço mais alto para entrar no país, segundo analistas.

"Há uma motivação estratégica da empresa, para aprender sobre o mercado brasileiro e estar pronta para os próximos leilões, que talvez tenha sido mais forte do que a intenção de extrair uma alta rentabilidade", afirma Vinagre, do Credit Suisse.

A perspectiva de novas rodadas de aeroportos e de uma retomada do crescimento do país foram fatores determinantes nos lances dos estrangeiros, avalia Marcos Ganut, diretor-executivo da Alvarez e Marsal.

"Se analisar o crescimento na Europa e em outros países do mundo, o potencial de valorização no Brasil é maior", diz. 

A alemã Fraport e a francesa Vinci outros dois grupos internacionais que eram grandes apostas no leilão— também fizeram lances, porém, bem mais tímidos. 

No bloco do Nordeste, as propostas das duas empresas foram as mais baixas entre as seis ofertas recebidas. 

A Fraport também deu um lance no bloco do Sudeste, e ficou em último lugar, entre quatro proponentes.

Embora o mercado já tivesse consciência de que apareceriam muitos competidores, os altos lances vencedores surpreenderam a todos, segundo a advogada Renata Martins, sócia do escritório Siqueira Castro, que atuou para a alemã Fraport.

A avaliação é a de que os contratos atuais trazem mais risco do que os da rodada anterior porque os blocos não são homogêneos e alguns aeroportos são mais superavitários do que outros.

Após a quarta rodada de concessões —dos empreendimentos de Florianópolis, Porto Alegre, Salvador e Fortaleza—, que consolidou a entrada de estrangeiros no setor no Brasil, Martins afirma que já existe, hoje, uma certa segurança das empresas internacionais no mercado brasileiro.

"Já se tinha noção de que a concorrência seria alta. Por isso, as propostas iniciais foram um pouco mais elevadas. Mas por que foram tão altas, esse é o x da questão. Já vimos isso no passado, a sustentabilidade de propostas com outorga inicial muito elevada vai ser um desafio para o governo daqui para a frente", diz ela.

Para a advogada, a Fraport tinha apetite, mas buscou fazer uma proposta sustentável. "Algumas arriscam mais, outras são mais conservadoras."

Outros grupos que apresentaram propostas, mas não levaram nada foram a brasileira CCR, uma das principais concessionárias de infraestrutura do país, e o consórcio do fundo de investimentos Pátria.

Ambos fizeram lances para o bloco do Nordeste. 

O lote de quatro aeroportos do Centro-Oeste, o menor dos três ofertados nesta sexta-feira, foi arrematado pelo consórcio Aeroeste —formado pela Socicam (responsável pelo Terminal Rodoviário Tietê) e a Sinart.

As companhias ofereceram um lance de R$ 40 milhões, bastante superior ao valor mínimo, de apenas R$ 800 mil. Os investimentos previstos são de R$ 770,6 milhões.

Especialistas afirmam que há uma tendência de que empresas de terminais rodoviários busquem participação em aeroportos regionais, porque há sinergias nas operações.

Também deve ser confirmada neste ano uma tendência iniciada em 2017, de maior uso do mercado de capitais e menor participação do BNDES para financiamento, segundo Marcelo Allain, coordenador de aeroportos da Abdib (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base).

"Essa tendência foi reforçada, entre outras coisas, porque foi criada a TLP [Taxa de Longo Prazo], que substituiu a TJLP [Taxa de Juros de Longo Prazo]. Então o custo BNDES foi alinhado ao mercado", diz.
Próxima rodada terá aeroportos no Sul, Manaus e Goiânia.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.