Justiça japonesa garante direito de fiança a Carlos Ghosn, da Nissan

Executivo pode deixar prisão nesta quarta (6) se pagar o valor, de quase R$ 34 milhões

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tóquio e Paris | Com agências de notícia

A corte de Tóquio garantiu a Carlos Ghosn, ex-presidente da Nissan e da Renault, o direito de fiança. O valor determinado na decisão desta terça-feira (5) foi de 1 bilhão de ienes (aproximadamente R$ 33,8 milhões).

Ghosn está preso desde o final de novembro, sob acusações de ter fraudado declarações a respeito de seus ganhos na Nissan por uma década. Ele nega e afirma que as acusações são resultado de oposição que sofria por ter como objetivo fortalecer os laços entre as montadoras Nissan e Renault.

Este foi o terceiro pedido de liberdade feito por sua defesa —os dois anteriores foram rejeitados.

Promotores japoneses apelaram da decisão do Tribunal Distrital de Tóquio, mas o recurso foi negado. Ghosn poderá deixar a cadeia após o pagamento da quantia.

Contudo, como os bancos japoneses já fecharam, o advogado do empresário, Junichiro Hironaka, apontou que não haverá como juntar o dinheiro da fiança ainda nesta terça. Por isso, a soltura do executivo só poderá acontecer na quarta-feira (6).

Em nota após a confirmação de sua fiança, o executivo afirmou que está decidido a se "defender vigorosamente".

"Agradeço infinitamente à minha família e aos amigos que me apoiaram durante esta provação terrível", afirmou, em comunicado emitido em Paris.

"Também quero agradecer a associações e militantes de direitos humanos do Japão e do mundo inteiro que lutaram pelo respeito à presunção de inocência e pela garantia de um processo justo", disse Ghosn.

O diretor-geral da Renault, Thierry Bolloré —que era adjunto de Ghosn e o substituiu no fim de janeiro no comando da montadora—, disse a uma rádio francesa nesta terça que a prisão do executivo foi um choque para a empresa. Mas evitou comentar a possível libertação do franco-brasileiro.

"Sempre fizemos questão de não assumir a posição de juízes", afirmou à RTL. "Aguardamos os resultados das investigações."

Bolloré aproveitou para reforçar o apreço que, segundo ele, a Renault tem pela parceria com as japonesas Nissan e Mitsubishi.

"Todos os envolvidos nessa aliança não param de repetir a importância vital dela. Nossos acordos são concebidos para que as relações [entre as firmas] sejam sempre igualitárias, e não relações de força", afirmou.

Ele se referia à informação de que a Nissan estaria há tempos descontente com os termos da parceria, vistos em Tóquio como excessivamente favoráveis à empresa francesa, que detém 43% da montadora japonesa. No sentido inverso, a Nissan controla 15% das ações da Renault.

SURPRESA

A decisão pela soltura de Ghosn foi uma surpresa porque o tribunal não havia demonstrado, até a data, qualquer sinal de que concederia a liberdade ao executivo.

Antes de saber o resultado da apelação dos promotores, o advogado da família Ghosn, François Zimeray, comemorou uma decisão que "põe fim a uma detenção absolutamente cruel e brutal".

"Obviamente é uma boa surpresa, uma boa notícia", ressaltou. Ele afirmou que a Promotoria "tem demonstrado, neste caso, sua deslealdade, apresentando acusações, por vezes, artificiais".

Sob a lei japonesa, a Promotoria pode manter um suspeito preso por até 22 dias enquanto investigam uma acusação, e, em seguida, solicitar repetidamente a extensão da prisão preventiva de um mês por cada acusação adicional.

Isso significa que os promotores podem, efetivamente, impedir que Ghosn saia da prisão se apresentarem novas acusações.

O pedido agora aceito ocorre dois dias depois da primeira entrevista para a imprensa do novo defensor do executivo, o advogado Hironaka, famoso no país por ter obtido absolvição de clientes em grandes disputas judiciais.

Além da fiança, a Justiça também impôs como condições da soltura que Ghosn não saia do Japão e seja vigiado por câmeras em sua residência.

Essas foram medidas propostas pelo próprio advogado de defesa para indicar que não haveria disposição de Ghosn para fugir ou adulterar evidências de crimes.  Hironaka considerou "convincente" a proposta apresentada.

Segundo a rede pública NHK, o tribunal estimou que o risco de fuga ou manipulação de provas é baixo.

O caso de Ghosn levantou críticas em relação à Justiça criminal japonesa, em especial pelos longos períodos de detenção a que suspeitos podem ser submetidos e aos interrogatórios feitos por horas sem a presença dos advogados de defesa.

VIOLAÇÕES

Na segunda, os advogados do executivo enviaram a um grupo de trabalho da ONU (Organização das Nações Unidas) um dossiê que mostraria que direitos do ex-presidente da Renault e da Nissan vêm sendo violados desde sua prisão no Japão.

"Decidimos levar o assunto aos órgãos da ONU responsáveis por garantir o respeito aos direitos fundamentais de todos", disse a família de Ghosn em um comunicado lido por François Zimeray em Paris.

"Carlos Ghosn está preso no Japão há mais de 100 dias", em um local de detenção "com regras medievais", denunciaram os familiares do empresário no comunicado.

Em recente entrevista à revista Paris Match, a mulher de Carlos Ghosn, descreveu as condições da detenção de seu marido como "deploráveis, até desumanas".

CRONOLOGIA

19.nov.
Presidente do conselho da Nissan, Carlos Ghosn é preso por supostas violações financeiras no Japão; o diretor da Nissan Greg Kelly também é detido, suspeito de envolvimento no caso

21.nov.
Tribunal de Tóquio mantém as prisões de Ghosn e de Kelly por 10 dias

22.nov.
Conselho da Nissan tira Ghosn da presidência do colegiado e Kelly da direção da montadora

25.nov.
Ghosn se pronuncia pela primeira vez desde a detenção e nega as acusações

26.nov.
Conselho de administração da Mitsubishi Motors remove Ghosn da presidência do colegiado

30.nov.
Tribunal de Tóquio aceita estender até 10 de dezembro a detenção de Ghosn

10.dez.
Procuradores de Tóquio indiciam oficialmente Ghosn por subdeclarar sua renda e prorrogaram sua detenção. Nissan também é indiciada por apresentar declarações financeiras falsas

11.dez
Tribunal de Tóquio rejeita recursoapresentadopelosadvogadosde Ghosn para ele ser libertado

12.dez.
Tribunal brasileiro decide que Ghosn deve ter acesso a apartamento no Rio de Janeiro para recuperar pertences

13.dez.
Nissan afirma que Ghosn e seus representantes não têm direito a acessar o apartamento do Rio e que o conteúdo de três cofres existentes no imóvel podem conter evidência contra o executivo. Na mesma data, o conselho administrativo da Renault ratifica Ghosn como presidente da multinacional

14.dez.
Nissan informa que representantes de Ghosn recuperaram documentos do apartamento corporativo no Rio

20.dez.
Tribunal de Tóquio decide não prorrogar a prisão de Carlos Ghosn

21.dez.
Promotoria de Tóquio faz nova acusação e consegueimpedirasoltura do empresário. Kelly, porém, deve deixar a cadeia

23.dez.
Justiça japonesa decide prolongar a detenção de Ghosn por mais dez dias

25.dez.
Tribunal autoriza liberdade de Greg Kelly, sob fiança de R$ 2,4 milhões

31.dez.
Prisão de Ghosn é prorrogada por mais 10 dias

2019​

8.jan.
Ghosn faz primeira declaração pública desde prisão e diz que foi detido injustamente

11.jan.
Promotoria apresenta novas acusações contra Ghosn

17.jan.
Tribunal de Tóquio nega pedido de liberdade sob fiança, e Ghosn deve permanecer detido até março

20.jan.
Ghosn aluga apartamento e oferece uso de monitoramento eletrônico para deixar prisão

22.jan.
Justiça nega novo pedido de liberdade sob fiança de Ghson

24.jan.
Ghosn renuncia à presidência da Renault, e executivos da montadora francesa e da Michelin assumem seu lugar

30.jan.
Em primeira entrevista desde prisão em novembro, Ghson diz que executivos da Nissan usaram conspiração e traição para barrar integração com Renault

7.fev.
Renault apura se Ghosn usou contrato com Versalhes para pagar casamento

12.fev.
Ghosn renuncia aos postos de presidente do conselho e de presidente-executivo da Renault, mas se mantém como diretor

13.fev
Principal advogado de Carlos Ghosn, o ex-promotor Motonari Otsuru, pede demissão. Ele é substituído por Junichiro Hironaka

15.fev
A Ordem dos Advogados do Brasil envia documento à federação japonesa de advogados pedindo intervenção no caso do executivo, afirmando que ele seria vítima de tortura

4.mar
Família e advogados de  Ghosn enviam documento para grupo da ONU apontando violações na prisão do executivo

5.mar
Carlos Ghosn tem pedido de fiança aceito pela Justiça japonesa, que fixa pagamento no valor de cerca de R$ 34 milhões e exige monitoramento do executivo por câmeras

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.