“Nós queremos aprovar o que está aí. Se a capitalização, os parlamentares entenderem que está complicado, difícil de explicar agora, eles podem decidir deixar para outra oportunidade”, disse.
Dando a entender que não sabia de fala de Bolsonaro em Brasília, o ministro da Economia, Paulo Guedes, voltou a defender o novo sistema durante evento em Campos de Jordão, no interior de São Paulo.
A capitalização é uma proposta cara ao ministro. Ele disse em sua apresentação que o sistema tem capacidade de criar milhões de empregos.
“Vamos criar empregos e podem ser milhões de empregos rápidos se formos para a Previdência nova [a capitalização] por causa da desoneração dramática dos encargos trabalhistas”, disse ele.
Nessa capitalização sugerida pela equipe de Guedes haveria aportes individuais dos trabalhadores e os empresários deixariam de contribuir para a Previdência via folha de pagamento.
Esse é o modelo de Previdência adotado no Chile e que está sob questionamento por ter gerados benefícios que equivalem de 30% a 40% do salário mínimo do país.
“Como vai ser montado esse sistema [de capitalização] é uma discussão para um segundo momento”, disse.
“Além disso, passa o recado de que é a reforma dos banqueiros”, acrescentou o deputado do Novo.
No modelo chileno, os bancos administram os aportes dos trabalhadores e são remunerados por isso.
Entre economistas e analistas do mercado financeiro, o projeto também deveria ficar de fora da reforma neste momento. Para eles, o motivo é a dificuldade de debater o tema no Congresso.
“Por que trazer a capitalização? Todo o mundo sabe que não é factível”, disse Marcos Lisboa, presidente do Insper e colunista da Folha. “Vamos fazer o que dá pra fazer.”
Paulo Tafner, especialista em Previdência, diz que migração para um regime de capitalização da Previdência é um tema mais ligado a princípios do que à economia fiscal.
“No curto prazo, ter ou não ter capitalização não significa nada [para as contas públicas]”, afirma. A capitalização minimiza o risco de um déficit futuro nas contas públicas, mas isso ocorreria apenas no longíssimo prazo.
“Às vezes a gente briga por uma coisa muito tangível, que é conta fiscal, mas há momentos em que a gente briga por princípios. O presidente está sendo muito pragmático, privilegiando uma coisa muito tangível e negligenciando a defesa de um princípio que é a capitalização”, diz Tafner.
O mercado financeiro tampouco conta com a capitalização e concentra suas atenções na imposição da idade mínima, regras de transição e aumento da alíquota de contribuição para a Previdência.
Esses seriam os principais pontos para gerar a economia prometida de R$ 1 trilhão em dez anos, considerada essencial para deter a trajetória de crescimento do rombo das contas públicas.
Na conta atual do mercado, o governo teria condições de aprovar regras para a Previdência que poupem cerca de R$ 700 bilhões nos mesmos dez anos.
“A capitalização ainda é um tema muito árido e iria gerar um debate tão grande que poderia atrapalhar a reforma paramétrica [que impõe idade mínima para aposentadoria, hoje inexistente]”, afirma Gabriela Fernandes, economista-chefe da Gauss Capital.
A capitalização não impacta nessa conta e, por isso, a reação do mercado à fala de Bolsonaro foi anódina.
A Bolsa brasileira avançou 0,83% nesta sexta, a 97.108 pontos. O desempenho foi em linha com o exterior.
“Não foi algo agradável e nem uma surpresa para o mercado, que aguarda sinalizações mais claras de como a reforma vai sair no fim”, disse José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator.
“O importante é ter uma reforma que segure o gasto público por quatro ou cinco anos. Não importa qual projeto seja aprovado. Vai chegar no fim do ano e ficará claro que precisaremos de outra reforma. Até lá, a recuperação da economia e do mercado de trabalho terão efeitos sobre a Previdência. Se o mercado de trabalho formal não voltar, o cenário complica”, disse.
No café da manhã, Bolsonaro repetiu que não entende de economia e ressaltou que foram os economistas quem “afundaram o Brasil”. Mas disse também aquilo que o mercado financeiro desejava ouvir: “Minha sugestão é evitar mais dispositivos na PEC. Teto e tempo de serviço são mais importantes, o resto é depois”.
Participaram do encontro com o presidente os jornalistas Sérgio Dávila (Folha); João Caminoto (O Estado de S. Paulo), Alan Gripp e Paulo Celso Pereira (O Globo); e Vera Brandimarte (Valor Econômico).
Também estavam presentes: Aruana Brianezi (A Crítica); Linda Bezerra (Correio da Bahia); Carlos Marcelo Carvalho (Estado de Minas); Leusa Santos (Folha de Pernambuco); Leonardo Mendes Júnior (Gazeta do Povo); Gerson Camarotti e Natuza Nery (Globonews); Luciana Gimenez (Rede TV); Eduardo Ribeiro (TV Record); e Carlos Etchichury (Zero Hora).
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