Tesouro reduz a diferença aplicada na recompra de título que rende Selic

Segundo especialistas, mudança melhora retornos principalmente dos investidores de curto prazo

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São Paulo

O Tesouro Direto, sistema do governo que facilita a negociação de papéis públicos, reduziu a diferença de preço entre a venda e a compra (o chamado spread) de títulos Tesouro Selic. 

Para especialistas, a medida deve beneficiar principalmente investidores de curto prazo.

Os papéis que seguem a taxa básica de juros da economia eram vendidos a um preço, mas recomprados pelo governo, antes do vencimento, a um valor 0,04 ponto percentual menor. 

Esse spread, que corrói a rentabilidade de aplicações, foi reduzido na sexta-feira (5) para 0,01 ponto percentual.

Para entender o efeito final da mudança é preciso ter em mente que a dinâmica do mercado é parecida com o do câmbio: quando alguém compra dólar segue uma determinada cotação de mercado, mas se quiser revender depois da viagem, receberá menos reais de volta.

Segundo Paulo Marques, gerente de relacionamento institucional do Tesouro Direto, essa diferença ajuda a evitar prejuízos a investidores e também ao governo por possíveis oscilações de taxas de juros.

Essa diferença era menos perceptível para os investidores quando a Selic estava na casa de dois dígitos. No entanto, a queda para o atual piso histórico de 6,50% ao ano torna qualquer custo extra evidente.

“Temos que lembrar que o risco-Brasil caiu, e a taxa de juros caiu junto. Hoje os investidores olham para as aplicações e dizem ‘puxa, como rende pouco’, tendo em vista as nossas rentabilidades de dois anos atrás”, afirma Berenice Righi Damke, professora de finanças do Insper.

Além do spread para venda antecipada, investidores precisam pagar a taxa de custódia da B3 (da ordem de 0,25%) e Imposto de Renda (que em até seis meses é de 22,5% sobre o rendimento). 

Resgates inferiores a 30 dias sofrem ainda cobrança de IOF (mais conhecido como Imposto de Operações Financeiras).

Com todos os custos, investidores começaram a comparar a rentabilidade com a da caderneta de poupança, que atualmente paga 70% da Selic, mas não tem desconto de Imposto de Renda e nem outros custos. A principal desvantagem, além do baixo rendimento, é a carência de 30 dias —a data do aniversário da poupança, que é quando o rendimento é creditado.

Conforme o Tesouro Direto foi simplificando o sistema de investimento, planejadores financeiros passaram a citar títulos públicos como uma alternativa tão segura quanto a poupança, só que mais rentável, para reserva de emergência —aquele dinheiro economizado para cobrir despesas não programadas e que precisa estar disponível rapidamente.

“A gente costuma usar investimentos mais líquidos e conservadores como reserva de emergência, porque consegue ter acesso a recursos de maneira rápida”, afirma Roberto Agi, planejador financeiro pela Planejar (associação que certifica profissionais).

Além da poupança e do Tesouro Selic, são recomendados também os fundos DI. O BTG e a corretora Órama oferecem fundos que investem em Tesouro Selic, mas sem cobrança de taxa de administração e com valores mínimos de investimento baixo. O objetivo é justamente conquistar novos investidores, decepcionados com a rentabilidade ainda mais espremida pelos custos do Tesouro Direto após a queda da Selic.

Para Cesar Caselani, professor de finanças da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas), há um conflito na comparação de poupança com o Tesouro Selic. 

Apesar de o título público oferecer possibilidade de resgate diário, ele tem um prazo de vencimento longo. Atualmente, por exemplo, o Tesouro Selic disponível à venda vence em 2025.

Seria de se esperar, portanto, uma penalidade para o resgate antecipado, diz. A diferença de preço entre venda e compra não existe quando o investidor carrega o papel até o vencimento –nesse caso, a rentabilidade é exatamente a contratada.

“É querer colocar no mesmo patamar um título com natureza de longo prazo com uma caderneta de poupança, que tem prazo de 30 dias”, afirma Caselani.

Quando um banco ou empresa emite um título de longo prazo, esse investimento costuma não ter liquidez. O motivo é simples: o dinheiro é usado para um projeto de duração semelhante, e o resgate antecipado poderia comprometer o planejamento. 

No caso de uma empresa, o dinheiro deixaria de ir para obra porque precisaria ser devolvido para o investidor, que desistiu de emprestar.

Segundo Marques, do Tesouro Direto, não é o caso dos títulos públicos vendidos pelo Tesouro Direto, que representam uma parcela ínfima da dívida pública federal. O governo não recompra títulos da dívida pública de grandes compradores.

O gerente afirma ainda que o spread não é uma penalidade, apenas uma prevenção para eventuais prejuízos.

Segundo ele, a explicação está na precificação dos títulos, feita três vezes ao dia. Entre a coleta de preços no mercado secundário (onde é feito o grosso das negociações da dívida pública, entre grandes bancos, por exemplo) e a formação do preço para o pequeno investidor, se passa um tempo que pode ter alterado as condições de mercado. O spread ajuda a suavizar isso.

Com métodos mais eficientes de cálculo, afirma, foi possível reduzi-lo no Tesouro Selic, que sofre menos oscilações de mercado.

No caso do Tesouro IPCA+ e no Tesouro Prefixado, outros títulos públicos negociados pelo Tesouro Direto, ainda não há indicações de reduções de spread no curto prazo.

Planejadores financeiros recomendam que esses investimentos sejam mantidos até o vencimento para evitar prejuízos justamente pelo risco das oscilações de preços no mercado. Se mantidos, o Tesouro honra exatamente a rentabilidade contratada.

Marques afirma, porém, que esse também é um comportamento típico de investidores de Tesouro Selic.

“Em um chute seguro, as pessoas carregam até o vencimento, se não for até, é muito próximo.”
O Tesouro não tinha esse dado disponível até a conclusão desta reportagem.


Principais títulos públicos

Tesouro Selic
Acompanha a taxa básica de juros da economia. Se a Selic sobe, o ganho sobe; se recua, ele diminui junto
Recomendação: minimizar riscos de regaste antecipado ou acredita que o juro vá subir

Tesouro IPCA+
Paga a variação da inflação e mais uma taxa de juros prefixada
Recomendação: garantir poder de compra em períodos mais longos, como no planejamento para a aposentadoria

Tesouro Prefixado
Paga uma taxa de juros combinada na contratação, que não muda mesmo que a Selic suba ou caia
Recomendação: diante de projeção de queda ainda maior da Selic

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