Inflação pós-greve de caminhoneiros trava ganho real de trabalhadores

Negociações salariais têm sido mais difíceis com inflação acumulada entre 4% e 5%

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São Paulo

pressão inflacionária herdada da paralisação de caminhoneiros tem dificultado o ganho real dos trabalhadores nas negociações coletivas entre sindicatos e patrões.

Dados do último boletim Salariômetro da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) mostram que, em março, o reajuste mediano negociado foi de 4%. A inflação acumulada em 12 meses até fevereiro —calculada pelo INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor)— e que serve de referência para o período, no entanto, foi de 3,9%.

O movimento de caminhoneiros no fim de maio do ano passado provocou uma crise de abastecimento no país que levou a uma explosão de preços. O resultado foi que o INPC acumulado passou de 1,76% em maio de 2018 para 3,53% em junho e passou o restante do ano mais próximo de 4%.

"Nós ainda vamos ter uma inflação acumulada expressiva até junho. Em julho, ela cai. O que dá para ver é que, provavelmente, não teremos aumentos reais expressivos até junho", diz Hélio Zylberstajn, professor da FEA-USP (Universidade de São Paulo) e coordenador do Salariômetro. 

 

O problema é que também no início de 2019 a inflação tem surpreendido para cima, com alta nos preços de alimentos e combustíveis. Em abril, o INPC em 12 meses chegou a 5,07%, maior patamar desde janeiro de 2017.

"A tendência é que a inflação caminhe mais para o centro da meta do governo, de 4,25%, mas ainda em nível superior àqueles padrões que vínhamos observando de 3%, antes do repique do ano passado. Alimentos tiveram um impacto maior no início deste ano, mas a tendência é de reversão", diz Clemente Ganz Lúcio, diretor-técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos).

Os trabalhadores da construção civil, cuja data-base é maio, já haviam conseguido apenas repor o INPC na convenção que vigorou entre 2018 e 2019. 

"Como nossa reposição foi em maio do ano passado, durante os últimos 12 meses o trabalhador perdeu cerca de 3% do poder de compra", diz Antonio de Souza Ramalho, presidente do Sintracon (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo).

A categoria, que reúne 400 mil trabalhadores, está em negociação salarial e pede 5% de aumento real. "Pensamos em greve neste mês, a negociação deste ano segue dura", diz Ramalho.   

Os metroviários de São Paulo acabam de fechar sua negociação. Conseguiram 4,99% de reajuste, o que repõe o IPC-Fipe, índice que usam como parâmetro, diz Wagner Fajardo, coordenador do sindicato da categoria. No ano passado, ele havia ficado em 1,29%.

"Embora não tenhamos conseguido avanço real, pelo menos não tivemos retrocesso", disse. 

Para ele, no entanto, a greve dos caminhoneiros costuma ser usada como bode expiatório. "O que deteriorou a situação foi o descontrole de preços da Petrobras. Ela [a greve] foi uma reação a uma política de preços que gerava inflação."

No caso dos metalúrgicos, cuja data-base é setembro, a FEM-CUT/SP (Federação dos Sindicatos de Metalúrgicos da Central Única dos Trabalhadores de São Paulo) estimava uma inflação acumulada de 3% em 2018 e, pleiteando 5% de aumento, projetava conseguir 2% de ganho real. 

Mas o INPC acumulou 3,64% nos 12 meses até agosto do ano passado. "Cada vez que a inflação sobe mais do que a gente prevê, acaba impactando a possibilidade de aumento real", diz Luiz Carlos da Silva Dias, o Luizão, presidente da FEM-CUT/SP.

Para este ano, Luizão diz que a inflação acumulada pode ser até um pouco superior aos 3,64% do ano passado, "já que nos meses iniciais de 2019 ela tem se mostrado um pouco maior", afirma. 

Na projeção do Salariômetro, o INPC acumulado até agosto deve ficar em 3,6%.

"Certamente não será um ano tão fácil", diz Luizão.

"O repique da inflação dificulta as negociações especialmente em um contexto econômico de baixo dinamismo, em que as empresas têm um desempenho muito desfavorável e o emprego está travado", diz Lúcio, do Dieese.

Na categoria de alimentação, o setor de massas e biscoitos conseguiu em outubro do ano passado um reajuste real de 0,36%. Segundo Rubens Gomes, vice-presidente do Sindeeia (Sindicato da Alimentação de São Paulo e Região), a greve atrapalhou a negociação porque as empresas ficaram paralisadas e com estoques represados.

"Como você vai discutir aumento real de salários? Qual embasamento você tem quando as empresas têm prejuízos enormes? A greve afetou drasticamente as negociações e o trabalhador pagou a conta", diz Gomes.

Para compensar, ele diz que a categoria buscou ganhos em benefícios, como a cesta básica, que foi ajustada em 15%.

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