Proposta da marca hoje é tão importante quanto produto, diz diretora da Natura

Empresa foi alvo de boicote após lançar campanha protagonizada por casais lésbicos

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São Paulo

A publicidade não se preocupa mais em vender só produtos, mas também propostas. Nesse ambiente que favorece a criação de campanhas alinhadas ao posicionamento das empresas, o consumidor busca autenticidade e histórias com que possa se identificar. Ainda que, nas redes sociais, toda tomada de posição esteja sujeita a críticas e pontos de vista contrários.

Essas foram algumas das análises feitas pelas participantes do programa Arena do Marketing, realizado pela Folha, em parceria com a ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing). A edição de junho contou com a presença da diretora global da marca Natura, Maria Paula Fonseca, da professora da ESPM Tatiana Amendola Sanches e da colunista da Folha Joana Cunha, que mediou a discussão.

Em maio, a Natura apresentou nas redes sociais uma campanha de apoio à diversidade para promover sua linha de maquiagem Natura Faces. O vídeo da ação no YouTube mostra três casais fora do padrão, formados por mulheres lésbicas, uma transexual e uma drag queen, que se beijam e têm suas histórias de amor contadas ao longo da propaganda.

As reações à peça publicitária se dividiram, com mais críticas do que demonstrações de apoio: há 4.900 reações negativas contra 4.600 que foram a favor da propaganda. Após a polêmica, a empresa publicou nota reforçando seu apoio à diversidade e à causa LGBT.

Na visão de Maria Paula, a importância de se posicionar está ligada à mudança no perfil dos consumidores ao longo das últimas décadas. “É claro que o produto tem que ser bom, mas a pessoa hoje também sente que precisa se identificar com a proposta da marca.”

Segundo a diretora global da marca Natura, Maria Paula Fonseca, apesar de ameaças de boicote —no Twitter, internautas tentaram promover a hashtag #BoicoteNatura—, o impacto da ação nas vendas de produtos foi positiva. Depois da divisão de comentários nas primeiras peças da campanha, as ações seguintes também passaram a ter recepção mais positiva, afirmou.

A diretora contou que o objetivo não era criar uma campanha agressiva nem fazer barulho na internet. Para ela, trata-se de um desenvolvimento natural da política de apoio à diversidade da marca, que já existe há anos.

Programa Arena do Marketing, realizado pela Folha em parceria com a ESPM - Reinaldo Canato/Folhapress - Programa Arena do Marketing, realizado pela Folha em parceria com a ESPM - Reinaldo Canato/Folhapress

Política que, para Maria Paula, independe de governos e partidos. No caso da Natura, essa posição existia antes do governo Bolsonaro —que, em abril, ordenou a retirada do ar de propaganda do Banco do Brasil que era marcada pela diversidade — e deverá continuar existindo após seu término, disse.

Do ponto de vista do mercado, promover maior diversidade na comunicação com o consumidor e também entre funcionários é positivo para a empresa, pois permite que ela atenda diferentes públicos, disse a executiva. Foi esse posicionamento que fez com que a empresa estabelecesse a meta de, até 2020, ter ao menos 50% dos cargos de diretoria ocupados por mulheres. Hoje, 38% das vagas na empresa são ocupadas por mulheres.

Campanhas como essa refletem também uma mudança na relação do público com o conceito de beleza, de acordo com a professora da ESPM Tatiana Amendola Sanches. “Antes a televisão apresentava modelos padronizadas, perfeitas, e as pessoas aspiravam a ser como elas. Hoje está mais próximo de como somos realmente. As redes sociais e as selfies mostram que existem belezas reais."

Segundo Tatiana, o momento inicial das redes, em que as pessoas queriam vender imagens perfeitas de si mesmas, está sendo superado por uma vontade dos internautas de se mostrarem como são e como pensam de fato. O que também gera, de maneira inevitável, comentários críticos e posições contrárias, pois as redes são bastante democráticas, afirmou.

Durante a conversa, a professora trouxe à tona outro caso emblemático. A marca de desodorantes Axe, que costumava fazer propagandas em que o homem e a masculinidade eram valorizados como objetos de desejo, mudou sua linha publicitária nos últimos anos. Em 2017, lançou uma campanha que questionava a masculinidade tóxica .

“Muitas vezes o homem é tóxico com o próprio homem, e a ideia da marca era justamente questionar esse padrão. Mas um mundo ideal mesmo seria aquele em que não fosse necessário às empresas se posicionar para começarmos a discutir temas como esse”, concluiu.

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