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Tributar transação financeira seria um desastre para o país, diz economista

CPMF funcionou apenas porque juros e alíquotas eram baixos, afirma autor de proposta que cria o IVA

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São Paulo

O economista Bernard Appy, diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal) e idealizador da proposta de reforma tributária encampada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP), vê no imposto sobre transação financeira defendido por Flávio Rocha uma ameaça de distorção e insegurança para a arrecadação.

Bernard Appy, diretor do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal), durante seminário ITR: justiça tributária, promovido pela Folha e o Instituto Escolhas - Reinaldo Canato 10.abr.19/Folhapress

"A CPMF, no Brasil, funcionou relativamente bem porque ela tinha alíquota baixa e os juros eram muito altos. Se você tem alíquota alta e juros baixos, e os juros hoje estão muito mais baixos do que eram na época em que a CPMF vigorava, o estímulo à desintermediação financeira é muito forte." 


A principal crítica feita pelos líderes da outra proposta de reforma tributária, do grupo Brasil 200, é a de que o IVA é um imposto do passado e eleva informalidade. Como o sr. vê esses comentários?

Há vários países que têm IVAs bastante simples, com regras uniformes e que conseguem arrecadar muito bem sem nenhum grande problema de informalidade na ponta. 

A experiência internacional mostra que, mesmo em países em desenvolvimento, com o modelo de IVA simples, você consegue tratar bem a informalidade. 

Essa discussão de que o IVA é um imposto velho não é verdade. Nenhum país relevante no mundo está pensando em abandonar o IVA. 

O grosso da discussão sobre tributação da nova economia tem a ver com Imposto de Renda, e não com IVA. A tributação do consumo tem algumas questões específicas, como importação de intangíveis pela internet, quando você tem dificuldade em que o fornecedor do intangível se registre como contribuinte no país. Mas é uma questão muito pontual. 

E o outro ponto é que um imposto sobre transações financeiras de alíquota elevada, como tem sido sugerido pelo Brasil 200, é desastroso do ponto de vista da economia.

Por quê?

O impacto que o imposto tem sobre a economia cresce exponencialmente com a alíquota do imposto, ou seja, um imposto sobre transações financeiras com alíquota baixa, é distorcivo, mas talvez o impacto não seja tão relevante. Já o sobre transações financeiras com alíquotas altas é muito distorcivo. 

O Brasil 200 diz que o 0,6% que o ministro Paulo Guedes mencionou é satisfatório e ter certeza de que até 1% não distorce.

O Brasil 200 tem um texto publicado pedindo um imposto de transações financeiras com alíquota de 5,6%. Seria 2,8% em cada ponta.

 

Eles falam que seria gradual. 

Se falar que é gradual, precisa colocar no papel. Mesmo que seja gradual, se a alíquota do imposto for alta, ela é muito distorciva. 

A economia vai se organizar para otimizar as transações financeiras, que é uma coisa simples de fazer.

Por eficiência você acaba fazendo mais transações financeiras do que precisaria para economizar tempo, por exemplo, para se organizar de uma forma eficiente. Se tiver uma alíquota mais elevada, com certeza isso vai mudar. 

Por que seria ruim a volta de uma CPMF?

No Brasil, a CPMF funcionou relativamente bem porque tinha alíquota baixa e os juros eram muito altos. Se você tem alíquota alta e juros baixos, e os juros hoje estão muito mais baixos do que eram na época em que a CPMF vigorava, o estímulo à desintermediação financeira é muito forte.

E, em vários países que criaram impostos sobre transações financeiras, vê-se claramente a receita caindo ao longo do tempo. Isso certamente aconteceria no Brasil se houvesse alíquota alta em um cenário de juros baixos. 

Ou seja, você joga uma insegurança para as finanças públicas enorme em cima de um tributo cuja receita pode flutuar enormemente em função da forma como a economia se organiza. Isso não acontece com um imposto neutro como o IVA. E a economia vai ser organizar para pagar menos. 

O imposto do Brasil 200 é insonegável, por ser todo feito dentro do sistema bancário?

Não é verdade. Se você encontrar algum traficante de drogas que opera por dentro do sistema bancário, vai se surpreender. 

O tributo que você pega dentro do sistema bancário incide sobre operações não econômicas dos agentes que já estão na economia formal, como alguém que compra um carro usado, um imóvel. 

Segundo ponto: quem paga o imposto são as operações não econômicas dos agentes que estão na economia formal. Você transfere dinheiro para um parente seu. Vai pagar imposto. Essas operações é que vão acabar sendo tributadas. Fora os efeitos econômicos, que são as críticas normais ao imposto cumulativo. 

A incidência cumulativa aumenta custos de investimento, reduz a competitividade da produção nacional. 


Bernard Appy, 57

Diretor-executivo do CCiF (Centro de Cidadania Fiscal) desde 2015, foi secretário-executivo e secretário  de Política Econômica  do Ministério da  Fazenda e presidente  do conselho de administração do Banco do Brasil (2003 a 2009)

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