Descrição de chapéu

O agro é sempre a primeira vítima nos disparates de Bolsonaro

A ira do presidente agora se volta contra a Europa, um bloco de países-chave para o agronegócio brasileiro

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São Paulo

Jair Bolsonaro já colocou o país em chamas várias vezes. E o agronegócio sempre foi o setor que mais esteve próximo de ser chamuscado.

Foi assim com as ameaças à China e com a intenção de transferência da embaixada brasileira de Israel para Jerusalém.

Mexeu com os chineses, os principais importadores de soja do Brasil, e com os árabes, os maiores compradores de carne de frango do país.

A ira do presidente agora se volta agora contra a Europa, um bloco de países-chave para o agronegócio brasileiro. Clima, desmatamento e fogo na Amazônia são os ingredientes dessa nova contenda.

Nesta sexta (23), França e Irlanda disseram que podem votar contra o acordo comercial entre União Europeia e Mercosul caso o Brasil não respeite os compromissos ambientais.

A Finlândia sugeriu que o bloco europeu considerasse urgentemente a possibilidade de banir importações de carne bovina brasileira, enquanto o Reino Unido declarou estar "profundamente preocupado" com o aumento das queimadas na Amazônia.

Já a Alemanha disse que os incêndios representam uma "situação urgente" e que o caso deve ser debatido.

O bom da história é que Bolsonaro, após alertado sobre os eventuais estragos comerciais de suas bravatas, se finge de morto e não toca mais no assunto. Foi assim com a China e com a transferência da embaixada em Israel.

O perigo dessa nova batalha de fogo encampada pelo presidente brasileiro contra a Europa é que, diferentemente das outras vezes, a revolta vem diretamente de consumidores, e não tanto de governantes, como mostram os protestos em frente às embaixadas brasileiras pelo mundo.

Nesse caso, as mídias sociais, que tanto ajudaram Bolsonaro a se eleger, podem espalhar um rastro de pólvora contra produtos brasileiros na Europa. E a Europa é espelho para boa parte do mundo.

Este não é momento de enfrentamento, mas de explicações, principalmente aos que não entendem muito bem a realidade do país.

A atitude do governo pode fechar portas do mercado externo para produtos brasileiros. A ameaça de que o Brasil é o celeiro do mundo e indispensável para quem necessita de alimentos é falsa.

O Brasil mantém um crescimento contínuo nas exportações do agronegócio. Em alguns segmentos, porém, a velocidade do crescimento brasileiro já fica abaixo da média da de outros países.

Dados da União Europeia indicam que as importações de carne bovina brasileira feitas pelo bloco caíram 2% no primeiro semestre deste ano, em relação a igual período de 2018. Já as importações europeias feitas na Argentina cresceram 14% no mesmo período.

O Brasil, sempre líder nas exportações de frango para a União Europeia, perdeu o posto nos últimos dois anos para a Tailândia. Só neste ano começa a reagir.

Os europeus representam um mercado de US$ 16 bilhões para o agronegócio brasileiro, sem considerar produtos como madeira, celulose e algodão.

Uma atitude impensada do governo pode colocar a perder o esforço de crescimento, feito dentro das regras, da grande maioria dos produtores brasileiros.

Esse castigo deveria recair apenas sobre os que burlam a lei. E é contra esses que o presidente deveria invocar o patriotismo e aplicar a legislação.

Não adiante buscar subterfúgios. Fica cada vez mais próximo o momento em que o consumidor, por mais distante que esteja do Brasil, terá conhecimento de onde e de como foi produzido o alimento que está ingerindo.

Bolsonaro deveria aprender com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que mexer com o mercado pode custar caro. A guerra comercial dos Estados Unidos contra a China recaiu mais fortemente sobre o agronegócio americano.

A fúria de Trump faz com que os americanos, maiores produtores mundiais de soja, terminem esta safra —que se encerra em 31 de agosto— com 29 milhões de toneladas estocadas em seus armazéns.

Esse volume, nunca atingido anteriormente no país, e que deveria estar na China, vai continuar influenciando os preços de mercado e os ganhos dos produtores por várias safras.

Apesar dos milhões de dólares derramados pelo governo dos Estados Unidos como subsídios ao campo, parte dos produtores já começa a pensar se fizeram uma boa escolha em votar em Trump.

Por aqui, o governo não tem esses bilhões de dólares para subsidiar produtores. Um eventual fechamento de mercado aos produtos brasileiros seria um desastre de grandes dimensões.

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