OAB-SP critica grupo criado para fazer reforma trabalhista

Entidade que representa advogados questiona legitimidade por não ter sido convidada

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São Paulo

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo divulgou uma nota em que critica a criação, por parte do governo Jair Bolsonaro, do Grupo de Altos Estudos do Trabalho (Gaet), composto por ministros, desembargadores e juízes para propor nova rodada de mudanças nas leis trabalhistas. 

O grupo é uma iniciativa da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, que integra o Ministério da Economia, de Paulo Guedes. O grupo de trabalho vai tratar da “modernização das relações trabalhistas”, conforme adiantado pela Folha.

O objetivo é que membros do Judiciário auxiliem nos estudos de medidas na área de direito do trabalho e segurança jurídica, para que a proposta final tenho o menor volume possível de brechas para questionamentos legais. 

Segundo a OAB-SP, o grupo “perde legitimidade e carece de legalidade” por não incluir a entidade. 

“Sem nenhum demérito ou contestação a respeito da notória competência e seriedade dos nomes indicados para compor o referido Grupo de Trabalho, composto exclusivamente por ilustres membros do Poder Judiciário, o fato é que sua criação perde legitimidade e carece de legalidade, uma vez que exclui e desconsidera a entidade que representa a sociedade civil e a própria cidadania: a Ordem dos Advogados do Brasil”, afirma, em nota. 

A OAB-SP diz que o fato de não ter sido convidada para integrar o grupo constitui uma “significativa mudança de paradigma e de valores com o compromisso histórico com um padrão mínimo civilizatório”. 

Além de amarrar regras que ainda estão pendentes na avaliação de especialistas, o grupo de trabalho apresentará novas propostas. Uma delas tratará do fim da unicidade sindical. Hoje, a lei permite apenas uma entidade por base territorial —por município, uma região, estado ou país.

Com isso, a meta é promover a pluralidade sindical no Brasil. A reforma trabalhista durante o governo Michel Temer (MDB) já alterou regras para as entidades e acabou com o imposto sindical obrigatório.

O Gaet terá quatro órgãos temáticos. Um deles, composto pelos magistrados, é o Grupo Direito do Trabalho e Segurança Jurídica.

Os especialistas serão coordenados pelo ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho) Ives Gandra Martins da Silva Filho. Ele presidiu a corte durante a tramitação da reforma de Temer.

A coordenadora-adjunta será Ana Luiza Fischer Teixeira de Souza Mendonça. Ela é juíza da 3ª Vara do Trabalho em Juiz de Fora (MG).

Leia a nota da OAB-SP na íntegra:

“Nota da OAB/SP Sobre a Criação do Grupo de Altos Estudos do Trabalho”

"No dia 22.07.2019, o Secretário Especial da Previdência e Trabalho do Governo Federal, informou por Ofício ao Presidente do STF e do CNJ, a instituição de Grupo de Altos Estudos visando a modernização das relações trabalhistas.

Sem nenhum demérito ou contestação a respeito da notória competência e seriedade dos nomes indicados para compor o referido Grupo de Trabalho, composto exclusivamente por ilustres membros do Poder Judiciário, o fato é que sua criação perde legitimidade e carece de legalidade, uma vez que exclui e desconsidera a entidade que representa a sociedade civil e a própria cidadania: a Ordem dos Advogados do Brasil.

Dispõe o inciso I do art. 44 da lei 8.906/94 que cabe a OAB defender a C.F. e o Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social e pugnar pelo aprimoramento da cultura e instituições jurídica. O artigo 133 da C.F. deixa claro que a advocacia é indispensável à administração da justiça, além disso é obrigatória a participação da OAB em concursos públicos de ingresso nas carreiras jurídicas, inclusive da magistratura (art. 93, I, da C.F). Assim, a participação da OAB (advogado) em qualquer grupo oficial de trabalho no qual se pretenda promover alteração na ordem jurídica social é condição sine qua non para sua legitimidade.

O alijamento da advocacia na composição do referido grupo de trabalho representa uma significativa mudança de paradigma e de valores com o compromisso histórico com um padrão mínimo civilizatório e falta de respeito com a sociedade civil e com a entidade máxima que a representa.

Causa profunda perplexidade e receio que a ausência de integrantes da advocacia esteja pautada na premissa de impedir a voz da sociedade civil contra retrocessos sociais que, diuturnamente, se observa no processo legislativo protagonizado pelo governo federal.

A extinção do Ministério do Trabalho e seu encaixe no Ministério da Economia, sem que tivesse sido ouvida a OAB – e a sociedade civil - já indicara que, para o governo federal, o trabalho como valor não é mais concebido como fundamento ético da sociedade e sim como objeto do mercado de consumo, perdendo a centralidade que se lhe atribuía entre os valores dominantes pela própria Constituição Federal (art. 1, II, III e IV, art. 3, I, art. 7 da C.F.).

Esse ano foi proposta a medida provisória decaída que obrigava que a contribuição sindical espontânea se desse exclusivamente por boleto bancário. Também, a medida provisória da liberdade econômica que a pretexto de desburocratizar a economia alterava a legislação trabalhista em diversos pontos em contrabando legislativo contido pelo Presidente da Câmara dos Deputados.

O próprio objetivo indicado no Ofício SEI nº 201/2019 parte de equivocada e invertida premissa de privilegiar a liberdade econômica quando em choque com os direitos sociais.

Ocorre que, no seu preâmbulo e no seu artigo 1º, a C.F. estabelece a instituição de um Estado Democrático que tem por objetivo assegurar direitos sociais, o bem-estar, a igualdade e a justiça como valores supremos.

Os direitos trabalhistas foram os únicos para os quais o Constituinte Originário dedicou um capítulo específico inserido no Título dos Direitos e Garantias Fundamentais, indicando como essenciais na concretização dos valores da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Com essa especificidade o Constituinte Originário aponta a centralidade dos direitos trabalhistas dentre os valores dominantes estruturantes do Estado de Direito.

Com tal proposição, a Constituição Federal estabeleceu a obrigatoriedade da promoção pelo Estado brasileiro (Legislativo, Executivo e Judiciário) da defesa e proteção do trabalhador, como um dos princípios da ordem social e econômica brasileira a limitar a livre iniciativa econômica em conformidade com o princípio maior da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e da justiça distributiva (justa e solidária) que assegure aos trabalhadores uma existência digna, sendo cláusula pétrea inalterável sequer por emenda constitucional (Inc. IV do §4º do Art. 60 da C.F.).

É o que se espera seja observado pelo seleto grupo de juristas integrantes da mencionada Comissão.

Jorge Pinheiro Castelo
Presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/SP

José Francisco Siqueira Neto
Presidente da Comissão de Direito Sindical da OAB/SP

Ana Amélia Mascarenhas
Vice- Presidente da Comissão de Humanos da OAB/SP

 
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