Para não perder investimento, credores querem recuperação judicial rápida para Rodovias do Tietê

Debêntures detidas por mais de 18 mil investidores representam 91% das dívidas da insolvente Rodovias do Tietê

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São Paulo

Como única maneira de reaver o dinheiro investido, debenturistas da concessionária Rodovias do Tietê, que pediu recuperação judicial em novembro, querem aprovar o plano de recuperação rapidamente em articulação entre si. Bancos e corretoras representam a maior parte dos detentores dos papéis.

Os títulos representam 91,3% das dívidas de R$ 1,44 bilhão que a companhia listou na petição em que pede à Justiça proteção contra a falência, em 11 de novembro.

São 18 mil debenturistas, grande maioria pessoas físicas. Por ser um investimento de alta rentabilidade e com isenção de Imposto de Renda —debênture incentivada—, o papel foi um dos mais distribuídos e negociados logo após sua emissão, em 2013.

Essas foram as primeiras debêntures a serem lançadas sob esse modelo de isenção de IR.

Trecho da rodovia Marechal Rondon (SP-300) na cidade de Tietê; estrada é administrada pela Rodovias do Tietê, que pediu recuperação judicial  - Diogo Moreira - 16.ago.17/Governo de São Paulo

Em seu pedido de recuperação judicial, a Rodovias alega a sua dificuldade financeira deriva da crise econômica brasileira, que levou à queda no tráfego que reduziu o valor arrecadado com pedágios, sua principal fonte de receita. 

Com menor arrecadação e altos juros das debêntures — 8% ao ano mais IPCA— o valor a ser pago a investidores passou de 47% da receita líquida em 2014 para 71,5% em 2018.

Também pesaram na conta o aumento de R$ 1 bilhão de investimentos da empresa nas rodovias e multas da Artesp (agência reguladora estadual) por atraso em obras.

Os debenturistas se reuniram com a Rodovias em diversas assembleias, por 27 meses, sem chegar a um acordo sobre o pagamento dos papéis. Em 8 de novembro, os investidores declararam o vencimento antecipado da dívida. Sem ter como pagar, a companhia pediu recuperação judicial.

A Rodovias do Tietê, no entanto, ainda não teve seu pedido aceito pela Justiça. 

Antes de acatar a solicitação, o juiz Claudio Campos da Silva pediu uma avaliação prévia “da situação da empresa in loco [localmente], de modo a verificar suas condições de funcionamento”. 

O magistrado, que só vai decidir se dá início à recuperação judicial após a apresentação do estudo, deu à Deloitte 20 dias para a elaboração das análises. A consultoria, porém, ainda não havia entregado o documento até a última sexta (6).

Pessoas ligadas aos debenturistas dizem esperar que o relatório seja apresentado nesta segunda (9).

Paralela ao pedido de recuperação, existe uma nova disputa entre o agente fiduciário dos debenturistas, a Pentágono, e a concessionária.

Com a declaração de vencimento antecipado dos papéis, os representantes dos debenturistas passaram a ter direito ao controle da conta bancária em que a Rodovias do Tietê recebe os pedágios da concessão.

Quando pediu a recuperação judicial, a empresa argumentou ao juiz que deveria manter o controle da conta bancária para pagar impostos e fazer investimentos previstos no contrato de concessão.

A solicitação foi atendida pelo magistrado em liminar contestada pela Pentágono.

No embargo em que recorre da decisão, o agente fiduciário diz que o controle da conta é a garantia em caso de não pagamento, mas afirma que está interessado “no sucesso do processo de recuperação”.

A maior dificuldade da concessionária na negociação do parcelamento das debêntures foi conseguir quórum entre os detentores dos papéis.

A recuperação judicial facilitaria as coisas porque exige a maioria simples dos credores para a aprovação de um plano.

Hoje, a Rodovias do Tietê é controlada pela Líneas International Holding, em dificuldades financeiras, e pela AB Concessões. A AB tem dois acionistas: o grupo Bertin, em recuperação judicial, e a italiana Atlantia.

Uma das opções na mesa é a venda da empresa à Atlantia, único acionista com condição de fazer aportes.

A mudança societária, porém, precisaria do aval de Artesp, Cade (órgão antitruste) e CVM (regulador do mercado de capitais).

Outra opção é a da gestora Journey Capital: a criação de um fundo para reunir debenturistas. O investidor venderia o papel à gestora, e receberia uma cota. Em troca, faria negociação na recuperação judicial.

A Journey tem comprado as debêntures a 15% do seu valor de face. Tal prática leva gestoras a serem vistas como “fundos abutres”, já que se especializam em comprar papéis com alto risco de calote por um preço menor, na aposta de obter lucro ao final da recuperação judicial.

“De dois anos para cá, a companhia piorou muito, com geração de caixa aquém da projetada. Não vejo hipótese da debênture recuperar valor de face”, diz Glauco Legat, da Necton.

Para ele, o papel ainda pode dar retorno. “Tem valor baixo, mas tem. Eu seguraria para ver o que acontece na reestruturação da dívida. Não vale vender agora”.

A XP, uma das corretoras que mais comercializou a debênture, congelou o saldo dos investidores em junho e marcou o papel a zero em 19 de novembro.

Debêntures oferecem risco por não serem cobertas pelo FGC (Fundo Garantidor de Crédito). Em casos de recuperação judicial, os debenturistas são ressarcidos com o valor estipulado no plano de recuperação.

A máxima de diversificar investimentos também serve para debêntures. Cada papel custa a partir de R$ 1.000, mas há fundos que requerem aportes menores, geralmente a partir de R$ 100, e têm uma cesta diversificada.

Linha do tempo

2009 Rodovias do Tietê arremata por R$ 542 milhões concessão para operar por 30 anos o Corredor Leste da Rodovia Marechal Rondon, com gestão de 415 quilômetros de rodovias e acessos.

2013 Emissão das 1.065.000 debêntures simples no montante de de R$ 1,065 trilhão com vencimento em 2028

2014 Queda na arrecadação dos pedágios com a crise econômica

2015 Mais da metade da receita líquida é destinada ao pagamento de debêntures 

2017 Rodovias aumenta em R$ 1 bilhão custo de obras e pede, sem sucesso, revisão do contrato de concessão e de missão das debêntures

2018 Pagamento a debenturistas chega a 71,46% da receita líquida

8.nov.2019 Debenturistas votam pelo vencimento antecipado dos papéis e ganham controle da conta bancária que recebe arrecadação de pedágios da Rodovias do Tietê

11.nov.2019 Empresa entra com pedido de recuperação judicial na Justiça

13.nov.2019 Juiz determina que controle da conta bancária volte para a Rodovias do Tietê

19.nov.2019 XP marca debêntures a zero

4.dez.2019 Pentágono, representante dos debenturistas, recorre de decisão que liberou o controle da conta bancária para a Rodovias do Tietê

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