BC descarta tabelar juro do cartão e diz que linha é diferente do cheque especial

Campos Neto diz que cartão de crédito brasileiro é cartão de débito com parcelado sem juros

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São Paulo

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou nesta sexta-feira (24) que o cartão de crédito tem um uso diferente no Brasil, quando comparado com outros países, e por isso deveria ser chamado de cartão de débito com parcelado sem juros.

Em sua fala, Campos Neto endossou uma crítica recorrente dos grandes bancos. A maior parte dos pagamentos no cartão de crédito é de compras do dia a dia ou parcelamento sem juros. Como a maioria dos consumidores paga a fatura em dia, eles não recebem juros e, portanto, não são remunerados pelo dinheiro emprestado. Essa é uma das principais explicações das instituições financeiras para as taxas do rotativo do cartão serem as mais caras do sistema financeiro.

“O problema do cartão de crédito no Brasil é que ele tem o nome errado. Não deveria chamar cartão de crédito. É um cartão de débito com parcelado sem juros. A massa de crédito em relação ao total é em torno de 15%, 16%. Em outros países, está entre 60% e 80%. O que é financiado é muito baixo. Isso gera várias distorções”, afirmou durante palestra em evento da XP Investimentos.

Campos Neto descartou, no entanto, qualquer intervenção no produto e afirmou que a situação não pode ser comparada com a do cheque especial, que passou a ser tabelado neste ano

O Presidente do Banco Central, Roberto Campos, Neto durante entrevista na sede do banco em Brasília
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante entrevista na sede do banco em Brasília - Andre Coelho - 09.jan.2020/Folhapress

“Não entendemos que tenha nenhuma associação desse produto com o cheque especial. Não estudamos nenhum tipo de intervenção, de nenhuma forma, nesse produto”, afirmou. “Se transformou em um negócio diferente do que era, mas queria enfatizar que não temos nenhuma medida nesse sentido.”

Desde o começo do ano, os bancos não podem cobrar mais de 8% ao mês no cheque especial. Como compensação, passaram a ter o direito de cobrar uma tarifa dos clientes que desejam ter a linha de crédito, mesmo que não utilizem o dinheiro. Na prática, a tarifa serviria para remunerar o banco por deixar o dinheiro disponível. No entanto, apenas o Santander decidiu cobrar a nova tarifa.

Segundo o presidente do BC, com a queda na taxa básica de juros, existia uma expectativa por parte dos reguladores de que o uso do parcelado sem juros iria cair, com redução no número de parcelas.

 

“Só que está acontecendo o contrário”, afirmou. “Como quem toma a decisão de fazer o parcelamento sem juros no final é o vendedor, ele entende que, se ele parcelar sem juros, abaixa a parcela e cabe na prestação”, afirmou.

Os bancos lançaram há um ano a linha de parcelamento com juros, na qual quem financia o cliente é efetivamente o banco. O lojista recebe as vendas à vista. Ainda não foram divulgadas estatísticas sobre esse novo produto.

Sobre a atividade econômica, o presidente do BC afirmou que as projeções do mercado para o desempenho da economia no quarto trimestre têm oscilado muito e que os efeitos esperados do FGTS por alguns analistas pode estar superestimado.

Os economistas presentes ao evento questionaram Campos Neto sobre o ritmo mais fraco da atividade que aparece em alguns dados do quarto trimestre em relação a projeções mais otimistas feitas no final do ano passado.

O presidente do BC afirmou, por exemplo, já esperar um desempenho um pouco mais fraco da indústria, principalmente por conta da desaceleração das vendas de caminhões e da crise Argentina, e que o saque do FGTS não está tão alto e que parte do dinheiro foi usado para pagar dívidas e não para consumo.

“A gente está nessa projeção de crescimento com vários elementos não recorrentes. A gente tem o FGTS, e eu tenho mostrado nas minhas apresentações que o sacado na média não está tão alto, em torno de 50%. Também é preciso entender o que vem para consumo e o que está sendo usado para pagar dívida”, afirmou.

 

“Eu vejo uma velocidade muito grande [de mudança] nas expectativas de crescimento. Tem gente que estava em 0,4%, foi para 1%, caiu para 0,7%. A nossa expectativa mudou pouco. A gente achava que ia ter essa parte da indústria um pouco para baixo, que no FGTS o sacado não era tão alto quanto as pessoas estavam incorporando nas contas.”

O presidente do BC falou também sobre política monetária e repetiu o discurso de que é necessária uma política estimulativa, mas que o atual estágio do ciclo econômico recomenda cautela. Disse também que as próximas decisões do Copom (Comitê de Política Monetária, que volta a se reunir na segunda semana de fevereiro) continuarão dependendo da evolução da atividade.

Questionado diversas vezes por representantes do mercado financeiro sobre a diferença entre o ritmo atual de crescimento e o potencial do país, afirmou que ainda há espaço razoavelmente grande até que a recuperação possa gerar pressões inflacionárias.

Campos Neto afirmou que a política monetária está mais potente por conta de uma série de mudanças que ocorreram no mercado de crédito, com aumento das linhas sem subsídios, por exemplo, e que isso também gera incerteza. Afirmou, no entanto, que o BC está aumentando a pressão no cano e trocando o encanamento ao mesmo tempo, mas que os efeitos disso não são imediatos.

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