Japão diz que fuga de Carlos Ghosn é injustificável

Executivo fugiu após empresa de segurança interromper monitoramento, diz agência

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Tóquio

Quase uma semana após o ocorrido, as autoridades japonesas condenaram neste domingo (5) a fuga injustificável de Carlos Ghosn para o Líbano e rejeitaram suas acusações contra a Justiça japonesa.

O ex-presidente das montadoras Renault e Nissan chegou ao Líbano na segunda-feira (30) passada em circunstâncias ainda pouco claras, embora estivesse proibido de deixar o Japão, onde estava em liberdade condicional desde o final de abril de 2019, à espera de julgamento por delitos financeiros.

"O sistema penal do nosso país dispõe de procedimentos adequados para estabelecer a verdade nos casos e é administrado corretamente, de modo a garantir os direitos humanos fundamentais. A fuga de um réu em liberdade sob fiança é injustificável", afirmou, em comunicado, a ministra da Justiça japonesa, Masako Mori.

As autoridades japonesas não puderam traçar a saída do território de Carlos Ghosn e, portanto, suspeita-se que ele tenha usado meios ilegais para deixar o país, afirmou.

"É extremamente lamentável que tenhamos chegado a essa situação", acrescentou. A ministra também confirmou o cancelamento da fiança de Carlos Ghosn e a emissão de uma notificação vermelha da Interpol para solicitar sua prisão.

Carlos Ghosn, ex-chefe da Nissan, ao deixar a detenção em Tóqui em Abril de 2019
Carlos Ghosn, ex-chefe da Nissan, ao deixar a detenção em Tóqui em Abril de 2019 - Issei Kato - 19.nov.2019/Reuters

"Não sou mais refém de um sistema judicial japonês parcial, onde prevalece a presunção de culpa, a discriminação é generalizada e os direitos humanos não são respeitados", disse Carlos Ghosn na terça-feira (31).

Acredita-se que ele partiu no domingo do Aeroporto Internacional de Kansai, perto de Osaka (oeste do Japão), em um avião privado e depois pegou outro em Istambul com destino a Beirute.

Segundo as autoridades turcas, dois estrangeiros o ajudaram em seu itinerário até Istambul. Após a prisão na quinta-feira de sete indivíduos na Turquia, dos quais quatro pilotos, cinco foram mantidos em prisão preventiva.

O ex-chefe teria deixado sua residência em Tóquio após a empresa privada de segurança contratada pela Nissan parar de monitorá-lo, disseram três fontes com conhecimento do assunto à agência Reuters, neste sábado (4). 

A Nissan havia contratado uma empresa de segurança privada para observar Ghosn, que estava solto sob fiança e esperando julgamento, para checar se ele se encontraria com pessoas envolvidas no caso, disseram três fontes. 

Mas seus advogados disseram à empresa de segurança que parasse de monitorá-lo, porque seria uma violação dos seus direitos humanos, e Ghosn planejava entrar com uma queixa contra a empresa, disseram as fontes. 

A empresa de segurança interrompeu a vigilância em 29 de dezembro, disseram as fontes. 

Um de seus advogados, Junichiro Hironaka, afirmou a repórteres em novembro que eles estavam considerando passos para evitar perseguição a Ghosn. 

Um porta-voz da Nissan recusou-se a comentar.

A emissora pública japonesa NHK, citando fontes da investigação, afirmou que uma câmera de vigilância colocada pelas autoridades na casa de Ghosn mostrou-o saindo sozinho por volta do meio-dia de domingo e não o mostrou retornando. 

Não está claro como Ghosn, que tem cidadania francesa, brasileira e libanesa, foi capaz de orquestrar sua saída do Japão. Ele entrou no Líbano legalmente com um passaporte francês, uma fonte disse à Reuters. 

Uma operadora turca de aviões privados afirmou na sexta-feira que Ghosn usou uma das suas naves ilegalmente em sua saída do Japão, com um funcionário falsificando registros de locação para excluir o seu nome dos documentos. 

Ghosn tem dito que falará publicamente sobre sua fuga em 8 de janeiro. 

Crime

Ghosn foi preso no final de novembro de 2018 no Japão e passou 130 dias na prisão, antes de obter a liberdade sob fiança.

O magnata do setor automobilístico, seus parentes e sua defesa clamam sua inocência e afirmam que ele foi vítima de um "complô" orquestrado pela Nissan para derrubá-lo, com a cumplicidade das autoridades do país.

Ghosn e seu círculo também denunciaram as condições estritas de sua liberdade sob fiança. Ele era proibido, por exemplo, de falar com sua esposa Carole, um "castigo" para desmoralizá-lo, de acordo com sua defesa.

Organizações de defesa dos direitos humanos, como a Anistia Internacional, criticam há anos o sistema judicial japonês, muito diferente do dos países ocidentais, e baseado, segundo eles, na repetição de interrogatórios para que o réu acabe confessando.

O Ministério Público de Tóquio, responsável pela investigação, também reagiu oficialmente, pela primeira vez neste domingo, à fuga, chamando-a de crime.

Os investigadores japoneses temiam esse cenário e por isso se opuseram à libertação sob fiança, lembrou o MP em comunicado.

"O acusado Ghosn tinha recursos financeiros abundantes e muitos pontos de fuga para o exterior. Foi fácil para ele fugir", disse.

O franco-libanês-brasileiro de 65 anos tinha uma influência significativa no Japão e em todo o mundo, e havia um "risco real" que destruísse evidências relacionadas ao seu caso, acrescentou.

Ao fugir para o exterior, Ghosn também desrespeitou o juramento que fez de permanecer no Japão para se defender durante o julgamento, disseram os investigadores.

"Ele quis escapar da punição de seus próprios crimes. Não há razão para justificar esse ato", concluíram.

Com agências de notícias

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