Sem esperança na Argentina, vendas internas são aposta das montadoras

Com vizinho em crise, indústria prevê alta nas compras de pessoas físicas sob impulso do crédito

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São Paulo

A indústria automotiva espera muito do mercado interno e pouco da Argentina. As metas e previsões divulgadas por associações do setor mostram fé no crescimento das vendas no varejo e nenhuma esperança na retomada do parceiro comercial.

A Anfavea (associação que representa as montadoras) acredita que os emplacamentos devem crescer 9,4% em 2020, enquanto as exportações, que já tiveram resultados ruins em 2018 e 2019, devem cair 11%.

O problema está no principal destino dos carros brasileiros. De acordo com a Adefa (associação dos fabricantes instalados na Argentina), foram vendidos 372,5 mil veículos de passeio e comerciais leves no país vizinho em 2019, uma queda de 45,4% em comparação a 2018.

Na foto, vários carros na estrada
Anfavea acredita que os emplacamentos devem crescer 9,4% em 2020 - Rubens Cavallari - 26.dez.2019/Folhapress

Segundo Pablo Di Si, presidente da Volkswagen na América do Sul, as exportações foram menos prejudicadas devido a novos contratos. A empresa envia o sedã Virtus para o México e o utilitário compacto T-Cross para mercados da África.

Mas a perda no mercado argentino é vultosa. A média de emplacamentos da Volks naquele país caiu de 11 mil para 5.000 unidades por mês, diz o presidente da montadora.

Em uma entrevista realizada em dezembro, Di Si afirmou que a montadora chegaria perto de fechar no azul em 2019, mas que esse objetivo só deverá ser atingido em 2020.

Com a necessidade de aumentar a rentabilidade para bater metas, o principal objetivo do ano para as fabricantes é retomar a comercialização no varejo e assim evitar que as vendas diretas (que têm margem de lucro menor) se sobreponham. Em 2019, 45,7% de todos os carros de passeio e comerciais leves foram vendidos para pessoas jurídicas, principalmente locadoras.

Para atrair consumidores, é preciso facilitar o financiamento, o que já ocorreu em 2019. O presidente da Volks acredita que a retomada do crédito será mantida.

“As projeções dos bancos indicam aumento de 10% ao ano, nos próximos três anos, do valor disponível para concessão de crédito”, afirma Di Si.

Rodnei Bernardino de Souza, diretor do Itaú Unibanco, confirma que houve crescimento na oferta de crédito no segmento de veículos leves e afirma que parte dessa expansão se deve ao mercado de venda direta para pessoas jurídicas.

“Estamos otimistas em termos de controle dos níveis de inadimplência e de demanda nas modalidades de crédito atuais. Ainda que a velocidade de crescimento não seja a mesma vista no último ano, o mercado dá sinais firmes de que seguirá em alta”, diz Souza.

Segundo o executivo, o Itaú investe em tecnologia para facilitar as consultas de informações sobre financiamentos e, para pessoas físicas, oferece opções com parcela balão, em que uma prestação final de valor mais alto é paga ou refinanciada no fim do plano.

Essa modalidade de parcelamento, que já vem sendo oferecida por outros bancos ligados a montadoras, permite prestações mais baixas, embora não signifique redução real na taxa de juros praticada, algo esperado devido ao patamar atual da Selic, que caiu para 4,5% ao ano.

 
 
 

Ao apresentar as previsões da Anfavea para 2020, o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes, associou a queda da taxa básica de juros a uma melhora nas vendas.

“Com a Selic em seu patamar mais baixo, há espaço para baixar a taxa que mais nos interessa, que é o CDC (instrumento financeiro para financiamento de automóveis)”, disse Moraes em entrevista realizada há uma semana.

Opções mais atraentes de crédito também devem impulsionar as revendedoras independentes.

“O crescimento na venda de veículos novos se reflete diretamente no mercado de usados. A cada 10 veículos novos vendidos, aproximadamente 8 seminovos são utilizados como forma de pagamento e passam a ser comercializados no segmento de usados”, calcula Márcio Leitão, diretor-executivo do grupo BMZ Auto Brokers.

Contudo, a queda no juro básico ainda é pouco sentida nos financiamentos oferecidos hoje nos sites das montadoras.

Em janeiro de 2018, quando a Selic estava em 7%, financiar um Toyota Etios Sedã em 36 parcelas mediante entrada de 30% e mais uma parcela final de mesmo percentual significava pagar 25,6% a mais no fim plano em comparação ao preço do veículo quando zero-quilômetro.

Hoje, com a taxa básica em 4,5% e repetindo o mesmo formato de parcelamento, o veículo terá custado 24,7% a mais.

Diferenças maiores podem surgir em outras modalidades de crédito para a compra de automóveis, mas ainda se espera a chegada de opções a custo mais baixo e também a adoção de modelos de comercialização comuns em mercados europeus e americanos.

A Selic atual pode abrir espaço para o leasing operacional, modelo predominante nos EUA. É um aluguel de longo prazo, em que o locatário paga um valor equivalente à depreciação do veículo ao longo dos meses. No fim do contrato, tem a opção de devolver o automóvel ou comprá-lo.

 

“Os vários anos de estabilidade econômica abrem essa oportunidade, mas sou muito cuidadoso com isso. A indústria vai começar a experimentar [o leasing operacional], mas não de forma massiva”, diz Pablo De Si, da Volks.

Na visão de executivos, a oferta do leasing operacional seria primeiramente direcionada a um público de alta renda e com interesse em trocar de carro em períodos curtos, inferiores a três anos. 

Dessa forma, a locação seria renovada constantemente, como ocorre nos EUA.

Esse tipo de plano necessita de regulações, e, na opinião Dirlei Dias, gerente de vendas e marketing na Mercedes-Benz do Brasil, parece distante do mercado.

“Ainda não enxergo que o modelo de leasing americano seja o que o cliente brasileiro quer. Hoje, 52% dos nossos carros são financiados, e aproximadamente metade desses parcelamentos é feita pelo banco da montadora até com opção de taxa zero para alguns veículos. A taxa Selic ajuda muito nisso.”

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