A cotação do dólar segue em trajetória de alta, batendo os inéditos R$ 4,40 durante o pregão desta quinta-feira (20). Ao fim do pregão, a moeda perdeu força e fechou em alta de 0,6%, cotada a R$ 4,392, também recorde —o terceiro seguido. Na semana, o dólar acumula alta de 2%. No ano, há alta de 9,4%.
O recorde do dólar, porém, é nominal. Em termos reais (corrigidos pela inflação), a moeda americana ainda está longe de sua máxima de 2002. Se for considerado apenas o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), calculado pelo IBGE, o pico de R$ 4 naquele ano, equivale a cerca de R$ 10,80 hoje. Caso também seja levada em conta a inflação americana, o valor corrigido seria cerca de R$ 7,50.
Segundo analistas, o movimento reflete a cautela de investidores com o coronavírus, que afeta a economia global pela redução de atividades na China, epicentro do surto.
No Brasil, o impacto no PIB (Produto Interno Bruto) pode chegar a 0,54 ponto percentual, caso haja redução de 10% nos preços de matérias-primas, aponta o Goldman Sachs. No caso de queda de 10% no volume de exportações para a China, o PIB seria 0,34 ponto percentual menor.
A projeção do banco é de 2,3% de crescimento para o Brasil em 2020.
Com o temor ao impacto econômico do coronavírus, investidores buscam ativos mais seguros, como o dólar e o ouro e vendem ações.
O movimento levou a moeda americana a se valorizar ante a maior parte das divisas globais na sessão. Dentre emergentes, o real foi a sétima que mais se desvalorizou.
O grama de ouro subiu 0,8%, a R$ 227,90, maior valor nominal do plano real. O Ibovespa caiu 1,65%, a 114.586 pontos.
Nos Estados Unidos, Dow Jones e S&P 500 caíram 0,4% cada uma e Nasdaq, 0,7%.
No cenário doméstico, a Selic na mínima histórica também contribui para o dólar elevado por meio do carry trade, prática de investimento em que o ganho está na diferença do câmbio e do juros. Nela, o investidor toma dinheiro a uma taxa de juros menor em um país, no caso, os EUA, para aplicá-lo em outro, com outra moeda, onde o juro é maior, o Brasil. Com a Selic a 4,25% ao ano, essa operação deixa de ser vantajosa e estrangeiros retiram seus recursos, em dólar, do país, o que eleva a cotação.
“A Selic no atual patamar deixa o risco-retorno do Brasil muito baixo. Fora que a economia está com o crescimento fraco. Com esses fatores, o estrangeiro não vai deixar dinheiro aqui”, diz Fabrizio Velloni, chefe da mesa de câmbio e sócio da Frente Corretora.
Nesta quinta, o banco Fator reduziu a estimativa para o PIB brasileiro em 2020 de 2,2% para 1,4%, considerando, além do coronavírus e dados econômicos fracos, as eleições municipais e crises do governo de Jair Bolsonaro.
Neste ano, há saída de R$ 28 bilhões de investimento estrangeiro da Bolsa brasileira, mais da metade do déficit de 2019.
“O dólar a R$ 4,40 não é sustentável pela pressão inflacionária e o mercado sabe disso. Os investidores apostam na alta para ver até onde o Banco Central vai”, diz Velloni.
Nesta semana, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que a instituição está tranquila com relação ao câmbio, o que, no entendimento do mercado, indica que o BC não vê urgência em intervir para baixar o dólar.
Nesta quinta, o ministro da Economia, Paulo Guedes, também reiterou sua avaliação de que o patamar do dólar deve ser mais alto conforme os juros de equilíbrio caem.
“[O câmbio de equilíbrio] pode ser R$ 3,80, R$ 4, ou R$ 4,20. O câmbio é flutuante, o BC opera isso. Mas o patamar é inquestionavelmente mais alto”, disse Guedes.
O BC precisou intervir no mercado na semana passada enquanto o dólar batia novos recordes históricos.
“O posicionamento de Guedes e a sinalização de que o BC que não vai intervir abrem margem para o movimento comprador. Hora ou outra vamos ver uma intervenção do BC, ao menos para acalmar o mercado”, diz Stefany Oliveira, analista de investimentos da Toro Investimentos.
(Com Reuters)
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