Trabalho por conta própria é o que mais cresce em sete anos

Empreendedorismo de necessidade e novas formas de trabalho levam a crescimento no número de trabalhadores com ou sem CNPJ

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São Paulo

A redução no número de trabalhadores desocupados no Brasil em 2019 ocorreu principalmente pelo avanço de uma categoria que vem crescendo nos últimos anos e que, segundo especialistas, pode indicar uma mudança no mercado de trabalho: o trabalhador por conta própria.

Nos oito anos em que o IBGE faz a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), 3,9 milhões de pessoas passaram a trabalhar de forma autônoma.

Percentualmente, o aumento é de 19% desde 2012 e só fica atrás dos empregadores (alta de 24,5% para 4,4 milhões).

O avanço pode sinalizar uma questão conjuntural --sempre que há menos emprego formal, mais pessoas vão para a informalidade ou se tornaram prestadores de serviço pessoa jurídica–​ e outra estrutural, ou seja, mais profunda no mundo do trabalho.

A crise que elevou o desemprego nos últimos anos empurrou o trabalhador para a informalidade. Uma vez que o trabalhador se adapta a essa nova condição, aponta o pesquisador Miguel Foguel, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o que era temporário passa a ser a nova realidade do trabalhador. 

Ou seja, o que era uma situação conjuntural –a falta de vagas formais– acaba alterando de forma estrutural o mercado de trabalho. Em outras palavras, o provisório torna-se permanente.

 
Isso pode ser notado pelo aumento da formalidade entre os autônomos. O ano passado terminou com 19,4 milhões trabalhadores por conta própria na informalidade, um avanço de menos de 2% sobre 2018. Já o número de autônomos formais, com CNPJ –como é o caso do MEI (Microempreendedor Individual)–, cresceu quase 9%, para 5,1 milhões.

O professor da Fipecafi, Samuel Oliveira Durso, considera que as atividades por conta própria ganham força com novas tecnologias, como é o caso de motoristas e entregadores de aplicativos.

Desde 2012, os setores que mais ganharam trabalhadores foram nos segmentos de alojamento e alimentação –alta de 43,60%–, onde estão, por exemplo, aqueles que vendem comida na rua, e de transporte, armazenagem e correio (18,41%), categoria em que se encaixam motoristas de apps.

"Esse tipo de trabalho torna-se mais atrativo em períodos de crise. Mas é mais inseguro, com menos direitos", diz.

Especialistas estimam que trabalho por conta própria deve continuar crescendo, assim como a formalidade no setor, por opção de trabalhadores que decidem deixar a rotina de um emprego formal, seja para atuar como prestador de serviços ou criar seu próprio negócio.

É o caso da cozinheira Isis Talita Marimon, 33 anos, que deixou o emprego em um restaurante em 2017 para se dedicar ao buffet que havia montado em paralelo um ano antes.

Depois de dois anos e meio como MEI, mudou de categoria e tornou-se microempresária e contrata mão de obra, geralmente temporária.

"De outubro para cá foi uma grande mudança. Tem mês que eu tenho até folha de pagamento", conta.

Nem todos, porém, estão satisfeitos com o trabalho autônomo e querem uma vaga de emprego com carteira assinada.

Isis Talita Marimon, 33, saiu de um restaurante em fevereiro de 2017 e desde então se dedica à própria empresa - Gabriel Cabral/Folhapress

A artesã Vanessa Selivon, 42, chegou a trabalhar em banco, mas acumulou experiência no setor de produção de eventos. Em 2016, quando perdeu o último emprego com carteira assinada, começou a produzir bolsas e nécessaires.

A costura, que até então era um hobby, assumiu papel de renda principal. "Quando a tal crise apareceu, as coisas ficaram mais devagar. Reduziram as equipes nas agências e eu parti para os freelas", diz.

"Como não conseguia nada fixo, decidi investir na costura criativa, intercalando com os eventos freelas que fazia."

Vanessa Selivon, 42, começou a produzir bolsas no ateliê que montou em casa, mas não desiste de tentar uma vaga com carteira assinada - Gabriel Cabral/Folhapress

Vanessa é MEI e, com isso, é segurada da Previdência Social e garante tempo para a aposentadoria. Mesmo assim, segue procurando trabalho —na semana passada, passou por duas entrevistas de emprego.

Para Daniel Duque, pesquisador do Ibre/FGV, a melhora no emprego ainda é lenta. A força de trabalho (os que trabalham ou buscam emprego) vem crescendo de modo devagar. A renda média dos trabalhadores, está estável.

A publicitária Eliane Aparecida de Souza, 40, passou 2019 entre aulas de estilismo de moda, pequenos trabalhos informais e envio de currículos.

“Estou sem trabalho formal desde 2016. Fiz revisão de texto e umas coisinhas só para preencher mesmo”, diz. 

Enquanto isso, segue rotina que inclui checar ofertas na internet. Todos os dias, envia ao menos três currículos.

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