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Plano de Guedes tem 'quase nada' para combater crise do coronavírus, diz Maia

Presidente da Câmara afirma que não pode nem imaginar que ministro 'possa ter pensado de forma tão medíocre'

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Brasília

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirma que a agenda dos próximos 45 dias será focada no combate aos efeitos econômicos do coronavírus. Na sua opinião, o governo tem de apresentar medidas de curto prazo para discussão. Segundo ele, a ausência disso incomodou deputados e senadores que se reuniram com o ministro Paulo Guedes (Economia) na quarta (11).

“Guedes não tinha uma coisa organizada ou não quis falar. Se olhar os projetos, tem pouca coisa que impacte a agenda de curto prazo ou quase nada”, disse.

Maia recebeu a Folha nesta quinta (12) na residência oficial da presidência da Câmara.

As propostas econômicas em andamento no Congresso, listadas por Guedes em ofício enviado aos parlamentares na terça (10), segundo o deputado, não resolvem a turbulência dos próximos meses.

Para Maia, a reforma administrativa, ainda a ser enviada pelo governo, não é uma solução no momento.

“A reforma administrativa estar atrasada incomodava até 15 dias atrás”, afirmou.

O presidente da Câmara disse ainda que terá sido “medíocre” se Guedes pensou em transferir a responsabilidade para os deputados sobre a solução da crise ao ter cobrado a votação da agenda. “Não posso acreditar que um homem de 70 anos, com a experiência dele, tenha mandado isso com essa intenção. A crise é tão grande que a gente não tem direito de imaginar que o ministro da Economia de uma das maiores economias do mundo possa ter pensado de forma tão medíocre.”

Rodrigo Maia é o presidente da Câmara dos Deputados - Adriano Machado/Reuters

Os parlamentares ficaram frustrados com Guedes porque não ouviram medidas concretas e ele ainda tentou dividir a responsabilidade dizendo que a solução é política. Como o senhor avaliou o encontro e a reação dos colegas? 
Compreendi o que ele [Guedes] quis dizer. Precisamos continuar olhando projetos de lei e emendas constitucionais que ajudam a melhorar o ambiente de negócios no país. Em relação a essa parte da participação dele, entendi muito bem. O que preocupou os parlamentares é que certamente teremos impacto de curto prazo e que essas reformas de médio e longo prazo não vão resolver. Temos uma crise de pandemia de um vírus que começa a crescer no Brasil.

O que incomodou os parlamentares é que não sentimos e não vimos, se ele [Guedes] não podia falar ou se ainda não organizou, as soluções para os problemas de curto prazo, como nos setores da aviação civil e de serviços.

São dois eixos: como impacta a saúde dos brasileiros e como impacta a vida econômica e social. São duas urgências. Essa primeira está bem organizada. Por outro lado, como o governo vai reagir em relação à queda da atividade e a algum risco de perda de emprego? Essa parte incomodou os deputados e senadores. A falta dessa parte.

O que eu falei a alguns deputados é que certamente o governo agora está começando a fazer suas simulações. Nós queremos ajudar o governo também, claro, com a organização do diagnóstico feito por eles. A indústria automobilística, por exemplo, teve um resultado em setembro ruim. O setor de serviços vai desempregar muito? O setor de aviação precisa de apoio? Como faz com as empresas de turismo que compram assentos nos aviões, quartos de hotel olhando o futuro e vai começar a ter um cancelamento?

O setor de entretenimento vai começar a cancelar eventos como já está acontecendo nos Estados Unidos. Essas variáveis de curto prazo é que eu acredito que os deputados e senadores sentiram falta na apresentação do Guedes.

O que se entende da mensagem do Guedes é que as medidas do governo virão desde que o Congresso aprove alguma coisa que esteja lá, dividindo a responsabilidade. O senhor sentiu essa mensagem por parte dele? É possível aprovar alguma coisa a curto prazo para que o governo destrave suas medidas?
Não posso imaginar que, numa crise desse tamanho, o ministro tenha encaminhado uma lista de 19 projetos para transferir a responsabilidade para nós. Não posso acreditar que um homem de 70 anos, com a experiência dele, tenha mandado esses projetos com essa intenção. Não acredito nisso. A crise é tão grande que a gente não tem direito nem de imaginar que o ministro da Economia de uma das maiores economias do mundo, o com mais poder desde a redemocratização, possa ter pensado de forma tão medíocre. Eu tenho certeza de que não. Não imagino isso, e não tenho direito, com o risco de tantos brasileiros serem atingidos do ponto de vista da saúde e do ponto de vista econômico por essa crise, imaginar que alguém teve essa percepção. Naquele momento, como ainda não havia um plano de contingência na área econômica, talvez ele, para tentar suprir essa lacuna de curto prazo, tenha encaminhado os projetos de médio e longo prazo.

Bolsonaro não subestimou a crise?
Na área da saúde, o governo desde o começo tem tratado conosco o assunto de forma correta e competente. O que estou dizendo é que talvez ele [Guedes] tenha mandado esses projetos porque viu que a situação ia piorar muito mais rápido do que imaginou e resolveu encaminhá-los para dar uma sinalização de que tem uma agenda. Queremos que o governo construa as soluções que vão minimizar os efeitos na saúde pública e na crise na vida das pessoas na área econômica área social. O governo precisa liderar isso.

Foi uma forma de pressionar o Congresso, não?
Entre uma pressão do Guedes e o risco de perder a vida de brasileiros com o vírus, somado ao risco de ampliação de desemprego no Brasil, não vou estar preocupado se ele fez isso para pressionar. Essa não é a pressão que nos incomoda. A que nos incomoda é a gente ainda estar desconfortável em relação à resposta que o poder público, os três Poderes, precisa dar. Em relação ao curto prazo, ele [Guedes] não tinha uma coisa organizada ou não quis falar de anúncio a ser feito pelo presidente. Se você olhar os projetos, tem pouca coisa que impacta a agenda de curto prazo ou quase nada. Temos um problema de seis meses.

Incomoda a demora do envio das reformas administrativa e tributária?
A reforma administrativa estar atrasada incomodava até 15 dias atrás. Hoje, o que me angustia e preocupa é, sob a liderança do Poder Executivo, mostrar à sociedade brasileira uma união para superar os próximos seis meses. O que incomoda e angustia é que a gente ainda não tem um plano de contingência para superar essa crise e os impactos na vida das pessoas na economia. A reforma administrativa não é parte dessa solução. Nos próximos 45 dias, nossa prioridade vai ser a agenda com o governo e o Supremo para superar essa crise.

O próprio presidente havia minimizado a crise do coronavírus...
Parece-me que não, se o ministro da Saúde está sendo tão elogiado. Talvez ele (Bolsonaro) tenha minimizado para acalmar as pessoas.

Não é uma tática dele jogar a responsabilidade ao Congresso em meio a um cenário de agravamento da crise econômica?
Quanto mais a gente reafirmar que temos respeito pela pauta econômica do Executivo, a gente vai fortalecendo nossa posição tirando o discurso de alguns de transferir a responsabilidade ao Poder Legislativo. Reafirmando a responsabilidade, a gente tira as forças do discurso que às vezes passam por dentro do Palácio do Planalto e às vezes no ministério da Economia.

O senhor fala em responsabilidade do Congresso, mas o Congresso derrubou uma medida considerada importante pelo governo, um veto do presidente, e aumenta os gastos públicos em R$ 20 bilhões com o BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Trabalhei para manter o veto e disse aos parlamentares que havia sido um erro a votação. Todo o mundo sabia que a crise do vírus estava crescendo. Nós estaríamos apenas colocando lenha na fogueira e de alguma forma ajudando o governo a fazer um discurso de transferir responsabilidades para o Legislativo.

O momento de gerar uma despesa de forma racional ou menos racional foi completamente equivocado. Geramos uma despesa de R$ 20 bilhões e sinalizamos que pode ter um risco de desorganização da pauta pelos próximos seis meses. Aí eu falo, como se faz para votar a PEC do Fundeb na próxima semana? Além do erro de ter votado um projeto que a gente sabe que não tinha previsão orçamentária.

Foi uma retaliação à questão dos protestos?
Da minha parte, não. Porque eu acho que isso [a nova despesa] deve ser inconstitucional.

Mas e o resultado?
O resultado acho que não foi uma retaliação ao protesto porque ninguém é contra o protesto. Foi uma retaliação a esse ambiente que dá a impressão de que alguma forma o governo estava patrocinando uma manifestação contra o Poder Legislativo. Pode ter sido isso, talvez.

O governo vai questionar a votação do BPC no Supremo e no TCU (Tribunal de Contas da União).
Certamente. Como presidente, eu tenho que respeitar o resultado da votação, mesmo não tendo ficado satisfeito, ter ficado incomodado, eu respeito muito o plenário da Câmara. Não é apenas o que eu gosto ou o que eu defendo que precisa ser aprovado. Vivemos numa democracia. Principalmente, porque era uma votação da sessão do Congresso, que não sou eu que presido,. Eu não posso tomar uma decisão que vá contra a decisão de 300 deputados. Mas eu acredito que o Poder Executivo está certo e tem as condições de questionar uma decisão que vai de fato desorganizar o Orçamento público brasileiro.


Raio X

Rodrigo Maia (DEM-RJ), 49 anos

Parlamentar de sexto mandato, foi eleito presidente da Câmara pela primeira vez em 2016, para um "mandato tampão" de seis meses depois de o ex-deputado Eduardo Cunha (MDB-RJ), que ocupava o cargo, ter renunciado. Foi reeleito em 2017, para um mandato de dois anos. Em 2019, já na nova legislatura, foi mais uma vez escolhido para presidir a Câmara dos Deputados por mais um biênio.

​Tem naturalidade chilena e é filho do ex-prefeito do Rio, César Maia. Assumiu a Secretaria de Governo carioca quando tinha 26 anos, na gestão de Luiz Paulo Conde, sucessor de seu pai.

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