Após fôlego inicial, PEC do Orçamento de guerra e auxílio complementar travam no Congresso

Ampliação de benefícios poderá gerar um custo próximo de R$ 140 bilhões no ano

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Brasília

Aprovados a toque de caixa na semana passada, a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Orçamento de guerra e o auxílio complementar a afetados pela crise do coronavírus emperraram no Congresso, em meio a divergências dos parlamentares sobre as medidas.

Na Câmara, o próprio presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) passou o fim de semana analisando a ajuda aprovada no Senado.

Segundo a equipe econômica, a ampliação excessiva de benefícios poderá gerar um custo próximo de R$ 140 bilhões no ano.

A preocupação de Maia e de outros deputados é com o impacto fiscal que a proposta pode gerar.

Já no Senado, um grupo de congressistas aponta que a aprovação da PEC do Orçamento de guerra abre precedentes graves e que não seria necessária neste momento.

Plenário da Câmara dos Deputados durante sessão do Congresso Nacional - Pedro Ladeira-24.set.19/Folhapress

Para senadores, não se pode banalizar a votação de emendas à Constituição, e o decreto que estabelece estado de calamidade daria ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) as ferramentas exigidas para enfrentar a pandemia.

Além disso, uma ala do Senado avalia que a PEC beneficia em excesso representantes do sistema financeiro, como bancos, e por isso cobram alterações no texto.

A presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), senadora Simone Tebet (MDB-MS), chegou argumentar que as mudanças na atuação do Banco Central precisam ser avaliadas de forma separada, sob risco de a fiscalização ficar prejudicada.

"Aproveitaram a PEC para inserir o dispositivo de o Banco Central atuar junto a pequenas e médias empresas, que não conseguem captar recursos com facilidade no mercado, e a possibilidade, portanto, de o Banco Central atuar junto ao mercado secundário. O problema não está tanto no mercado secundário, mas na forma como se daria essa fiscalização", diz a senadora.

A cúpula da Casa conversa com o presidente da Câmara na tentativa de alterar itens da emenda para deixá-la mais palatável aos senadores.

Nesta segunda-feira (6), Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), reuniram líderes partidários para tentar aproximar posições e colocar as matérias em pauta.

Apesar de enfrentar resistência na Câmara, o auxílio emergencial complementar é o que tem mais chances de destravar ainda nesta semana.

Para não ficar com o ônus de emperrar a ajuda financeira, Maia prevê votar o auxílio complementar, com o apoio de partidos de centro e esquerda.

O texto estende o auxílio emergencial (que varia de R$ 600 a R$ 1.200 por mês) a mais categorias, amplia a cobertura do BPC (benefício assistencial a idosos e deficientes carentes) e cria um programa de ajuda a empresas na manutenção do emprego diferente do anunciado pelo governo.

No caso da PEC, a oposição é mais forte e o presidente do Senado está tentando aparar arestas para levar a votação adiante.

Mesmo diante dos questionamentos, Alcolumbre garantiu nesta terça-feira (7) que a proposta será votada na próxima segunda-feira (13), de forma virtual.

Segundo ele, embora a proposta necessitasse de voto secreto, a Casa não tem estrutura para garantir o sigilo das votações de forma virtual --da mesma forma como seria em caso da realização no plenário. Ele, contudo, garantiu que será a única exceção.

"Essa será a única PEC votada de forma virtual. Os técnicos da Casa afirmam que ainda precisam de segurança jurídica para tomar decisões. Vamos dar as seguranças jurídicas que o governo precisa e fica como está. Será filha única de mãe solteira esta PEC", afirmou Alcolumbre.

Um dos principais entraves é o chamado grupo Muda, Senado!, que critica a apreciação remota da proposta.

A ideia é separar o Orçamento fiscal, que reúne desembolsos recorrentes com Previdência Social e custeio da máquina pública, por exemplo, do Orçamento extraordinário, criado para medidas a serem tomadas durante a pandemia da Covid-19.

Para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, a votação da PEC abre um precedente sério.

"Defendo que, sendo necessária a apreciação da PEC, que a gente reúna os senadores presencialmente. Vai todo mundo para o plenário do Senado, com os cuidados necessários, para apreciar a PEC", afirma.

Para ele, não haveria necessidade de uma PEC para segregar o Orçamento.

"Somos contra mudar a Constituição remotamente. É uma PEC controversa. Nós também divergimos da necessidade dela, porque achamos que o decreto de calamidade já atende as necessidades do governo."

Outro integrante do Muda, Senado!, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) também diz que o aumento dos gastos previstos no Orçamento de guerra não exigiria emenda constitucional.

"Estamos abrindo um precedente grave", afirma.

Ele defende ainda que não se banalize a votação de emendas à Constituição, "ainda mais em tempos de votação remota, com baixa possibilidade de debate e troca de ideias".​

"Temos críticas duras ao projeto porque ele dá autonomia e mais condição de o sistema financeiro ser beneficiado. Como sempre, o Orçamento da saúde, da educação, da infraestrutura, todas as áreas podem ser mexidas", disse o senador Weverton Rocha (PDT-MA), em vídeo.

"Mas, na guerra, sabe o que fica intacto? O dinheiro dos juros, dos bancos, das dívidas, fica separado sendo pago religiosamente mesmo na guerra. Então, ganhamos uma semana e até lá vamos debater", afirmou.

Diante das dúvidas, Tebet encaminhou questionamentos à Associação da Auditoria de Controle Externo do TCU (Tribunal de Constas da União) sobre a forma de votação da PEC.

Na resposta, a entidade afirma que as mudanças na Constituição precisam ser votadas de forma presencial pelos integrantes do Congresso. Segundo a entidade, a falta de debate em plenário pode trazer "graves ameaças à população e às empresas".​

Orçamento de guerra

O que prevê: criação de um regime extraordinário financeiro e de contratações para facilitar a execução do orçamento relacionado às medidas emergenciais. Com isso, o governo fica dispensado de cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, desde que as despesas sejam apenas para o período de calamidade, e não virem atos permanentes

Validade: de 20 de março a 31 de dezembro de 2010

Como funcionará: será formado um Comitê de Gestão de Crise, composto pelo presidente da República Jair Bolsonaro e pelos seus ministros, entre eles o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta e o da Economia, Paulo Guedes. Estados e municípios também serão representados no Conselho por meio de secretários de saúde, da fazenda e assistência social, mas não terão direito a voto

Funções do comitê: acompanhará contratos celebrados ou que serão assinados pela União, autarquias, empresas públicas e fundações públicas, tendo poder de anular, revogar ou retificar os termos dos processos. Também ficará a cargo do comitê a decisão sobre contratação de pessoal, obras, serviços e compras relacionados exclusivamente ao enfrentamento da situação de calamidade pública

Fiscalização: será feita pelo Congresso, por intermédio do Tribunal de Contas da União. Todos os atos do comitê poderão ser revistos em até 15 dias.

Créditos extraordinários: terão a urgência e pertinência avaliados pelo Congresso, durante o período de 15 dias úteis.

Regra de ouro: prevista na Constituição, ela proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes como salários, benefícios de aposentadoria, contas de luz e outros custeios públicos. Pela proposta, essa regra não será implementada, liberando os gestores do crime de responsabilidade fiscal durante o período

Banco Central: fica autorizado a comprar e vender títulos do Tesouro Nacional nos mercados secundários local e internacional, também fica autorizado direitos de crédito e títulos privados no âmbito de mercados financeiros, de capitais e de pagamentos. O capital mínimo do tesouro em questão será de 25%, e deverá ser autorizado pelo Congresso. A cada 45 dias, o Banco Central deverá prestar contas ao Congresso

Justiça: todas as questões judiciais que envolvam o comitê serão de competência do STJ (Tribunal Superior de Justiça)

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