Governo vê na China saída para a Embraer

Após acordo com Boeing fracassar, membros da equipe econômica analisam possibilidade de parceria com asiáticos

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Brasília

Após o fracasso da operação entre Embraer e Boeing, membros da área econômica consideram que a busca de negociações com a China pode ser a saída para a companhia brasileira.

A disponibilidade de recursos e o potencial de crescimento do mercado asiático são vistos como facilitadores desse processo.

A hipótese foi levantada em meio às discussões sobre o futuro da Embraer, que abriu uma batalha com a Boeing.

Ainda não há diretriz concreta por parte do governo sobre os próximos passos que serão tomados em relação à companhia. Para membros da equipe econômica, alguns fatores são listados como favoráveis a essa solução por meio de operações ou parcerias com companhias chinesas.

Diferentemente da já madura situação da aviação regional na Europa e nos Estados Unidos, a avaliação é que a China está em plena expansão desse mercado.

Produção do jato regional ARJ21, da Comac, em Xangai; governo brasileiro tem poder de veto na Embraer - Ding Ting-7.mar.20/Xinhua

Outro fator é a abundância de recursos do país asiático, que já começa a dar sinal de saída da crise provocada pela pandemia do coronavírus.

O governo chinês tem uma estatal que produz jatos para voos regionais, a Comac (Commercial Aircraft Corp of China), que tenta competir nesse mercado e já fez parcerias com gigantes mundiais.

A visão não é unânime no Ministério da Economia. Uma ala da pasta alerta para o fato de que a Embraer tem características estratégicas e, por isso, não dá para considerar apenas o valor oferecido para dar aval a uma operação desse tipo. Há quem defenda até que a Embraer siga sozinha com suas operações, sem parcerias.

No sábado (25), foi oficializado o cancelamento da compra da área de aviação civil da Embraer pela Boeing, o que teria sido o maior negócio aeroespacial da história brasileira.

O acordo, que começara a ser costurado em 2017, teve o apoio do Planalto durante a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB) e foi ratificado pelo presidente Jair Bolsonaro no começo de 2019.

Privatizada em 1994, a Embraer é uma empresa de capital aberto e pulverizado.

No entanto, o governo detém uma ação especial, chamada de golden share, que pode ser usada para barrar a transferência de controle para outra companhia, impedir mudança de sede e capacitação de terceiros em tecnologia para programas militares.

Esse poder de veto não quer dizer que a União é dona da empresa. A golden share garante esse direito mesmo quando a União tem participação minoritária no capital social da companhia.

Esse mecanismo é uma forma de o governo manter certo controle sobre uma empresa privatizada, especialmente as consideradas estratégicas.

A cúpula militar do governo, que nunca foi unânime sobre o acordo entre as duas empresas, tem a avaliação de que a desistência é uma oportunidade para que Bolsonaro adote mais cautela na atual política de privatizações.

Na avaliação do núcleo fardado do Palácio do Planalto, o setor aeroespacial é estratégico para a proteção do país. Por isso, o compartilhamento de tecnologia poderia fragilizar a defesa aérea.

Os militares ouvidos pela Folha ponderam, no entanto, que a quebra do acordo em meio à crise econômica causada pelo novo coronavírus não é animadora.

O cenário, para eles, demonstra que outras empresas brasileiras correm o risco de perder grande valor de mercado ao longo da pandemia.

Apesar do discurso de parcimônia com o plano de privatizações da ala liberal do governo, os militares não defendem a reestatização da empresa.

No sábado, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos aproveitou o negócio frustrado para emitir uma nota pedindo a reestatização da Embraer.

Em uma rede social, o secretário especial de desestatização do Ministério da Economia, Salim Mattar, também rechaçou a ideia dos sindicalistas de que o governo retome o controle da empresa.

Ao anunciar o cancelamento da operação, a Boeing afirmou ter rescindido o contrato porque a fabricante brasileira não teria cumprido todas as suas obrigações para executar a separação da sua linha de aviões regionais.

A Embraer divulgou nota acusando a Boeing. "A Embraer acredita firmemente que a Boeing rescindiu indevidamente o MTA (Acordo Global da Operação) e fabricou falsas alegações", diz o texto.

O objetivo, segundo a nota, seria tentar evitar compromissos de fechar a transação e pagar à Embraer o preço de compra de US$ 4,2 bilhões (R$ 23,5 bilhões na sexta).

A fabricante brasileira afirma que tomará as medidas cabíveis contra a Boeing "pelos danos sofridos".

Em 2019, o processo de separação custou R$ 485,5 milhões à empresa.

A Boeing passa por dificuldades financeiras, embora a empresa negue que sejam o motivo da rescisão.

Uma crise interna foi motivada pela paralisação da produção do 737 MAX por problemas técnicos que geraram acidentes fatais e a queda de demanda mundial de aviões pela pandemia do coronavírus.

A crise da Covid-19 também desvalorizou a Embraer, levantando dúvidas sobre o preço a ser pago pela brasileira.

"Há vários meses temos mantido negociações produtivas a respeito de condições do contrato que não foram atendidas, mas em última instância, essas negociações não foram bem-sucedidas", disse Marc Allen, presidente da Boeing para a parceria com a Embraer e operações.

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