Descrição de chapéu Coronavírus

Grandes empresas mudam rotinas para continuar a produção na pandemia

Indústrias e prestadores de serviços essenciais aumentam os seus estoques, alteram logística e mexem no dia a dia dos funcionários

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São Paulo e Valinhos (SP)

Enquanto as pessoas deixam as ruas para evitar o contágio pela Covid-19, há milhares empresas que alteraram seus processos e adotaram novos protocolos de segurança para manter o abastecimento do país.

Barreiras de acrílico na linha de produção, medição de temperatura do corpo por câmera térmica e uso de hipoclorito e amônia para desinfetar fábricas e centros de distribuição são alguns procedimentos que a Folha acompanhou em grandes empresas de setores como alimentação, higiene, farmacêutico e energia, que não podem parar.

A rotina de Thiago Degresi, 33, é um exemplo de como a dinâmica do trabalho nas empresas foi alterada no detalhe. Há dez anos, ele pega um ônibus fretado a duas quadras de onde mora, em Campinas, que o leva até a fábrica da Unilever na vizinha Valinhos. Ele é operador de máquina na produção do sabonete Dove. Em casa, fica a esposa, a depiladora Marianne Ferreira, grávida do primeiro filho do casal.

No centro de distribuição da Nestlé, funcionário faz sanitização com cloro nas dependências de toda a área da empresa como forme de combate ao coronavírus
No centro de distribuição da Nestlé, funcionário faz sanitização com cloro nas dependências de toda a área da empresa como forme de combate ao coronavírus - Eduardo Knapp/Folhapress

“A pandemia mudou tudo porque ela tem que ficar em casa, não pode fazer atendimento. Eu mesmo, que sempre gostei de praticar atividade física fora de casa, só saio para ir ao mercado”, diz. De resto, é só trabalho e casa.

Dentro do fretado que Thiago pega todo dia, há menos trabalhadores do que o habitual, e os lugares são marcados para que ninguém se sente lado a lado —muitos trabalham de casa, e os que moram longe dos pontos do ônibus vão à fábrica de táxi pago pela Unilever.

Degresi trabalha das 13h50 às 22h. Ao chegar, tem a temperatura corporal medida e passa por uma câmera térmica que checa zonas de calor do corpo.

A unidade de Valinhos tem 250 mil metros quadrados e produz, além do Dove, sorvetes Kibon e outras marcas de sabonetes, como Lux e Rexona.

O diretor da fábrica, Gleison Santos, instalou um comitê de crise que se reúne diariamente desde 16 de março para monitorar as condições sanitárias do local e discutir como manter a produção.

Metade dos cerca de mil funcionários da unidade está em home office ou em licença remunerada. O restante se divide em três turnos.

“A planta do Dove é a responsável por abastecer o Brasil e exporta o produto para toda a América Latina, exceto o México. Não podemos parar.”

Degresi trabalha no turno com mais três operadores em uma linha que faz, por minuto, 1.500 sabonetes. É o responsável pela manutenção das máquinas e pelo controle de qualidade.

A distância mínima entre funcionários passou a ser de dois metros, inclusive nos vestiários e na fila do refeitório. Para se servir no restaurante, o funcionário precisa lavar as mãos e colocar luvas de plástico, e só é permitido sentar uma pessoa por mesa.

No ramo alimentício, as maiores empresas redesenham até formatos das linhas de montagem para garantir que fábricas continuem a funcionar.

Na Nestlé, responsável desde a fabricação dos produtos até a colocação dos itens nas gôndolas dos supermercados, todas os elos da cadeia sofreram mudanças.

Em Araras (SP), onde a empresa fabrica achocolatados, cafés e embalagens em lata, foi preciso até colocar barreiras de acrílico em algumas linhas para garantir o distanciamento de trabalhadores.

“Fizemos uma análise e mudamos processos para garantir ao menos a distância de um metro e meio entre as pessoas. Em algumas linhas, mudamos a configuração física e a velocidade de produção”, diz Ismael Souza, gerente da planta.

Normalmente, segundo ele, no local trabalham 1.300 funcionários. Hoje, são 900.

Diariamente, entram e saem 80 caminhões do local por uma portaria exclusiva destinada à logística. Para entrar na unidade, todo caminhoneiro responde a um questionário sobre estado de saúde e tem a temperatura aferida.

“Eles têm álcool em gel à disposição e não há contato físico com ninguém no processo de carga e descarga”, diz.

Os processos de limpeza na fábrica e nos centros de distribuição incluem pulverização rotineira com amônia e hipoclorito, por exemplo.

A empresa tem 2.600 funcionários que fazem reposição em supermercados. Para evitar o uso de transporte público, 72% deles usam aplicativos de transporte pagos pela empresa ou vão de carona com supervisores da Nestlé. A empresa também forneceu a eles capacetes e álcool em gel.

Na Ambev, fábricas e centros de distribuição operam com capacidade reduzida.

A cervejeira restringiu o número de pessoas nas áreas comuns das unidades, passou a medir a temperatura dos funcionários e aumentou o número de ônibus fretados que transportam os operários. Cada um leva, agora, até 20 pessoas. Nos refeitórios, só três pessoas podem sentar em mesas de oito lugares.

Na logística, a empresa usa 4.500 caminhões. Pelas novas regras, os funcionários que atuam nos veículos devem trabalhar de janelas abertas e, na entrega, manter distância mínima de dois metros de qualquer pessoa.

No McDonald’s, os funcionários passaram a usar máscaras e luvas no atendimento aos clientes no dia 6. Todos os pedidos são embalados para viagem. No interior dos restaurantes, fitas no chão sinalizam a distância que deve ser mantida entre as pessoas.

Funcionários dos McDonald’s que atendem ao público usam máscaras desde 6 de abril; antes, já utilizavam luvas
Funcionários dos McDonald’s que atendem ao público usam máscaras desde 6 de abril; antes, já utilizavam luvas - Karime Xavier/Folhapress

Outro setor que não pode parar é o farmacêutico. Na BI (Boehringer Ingelheim), que fabrica remédios usados no tratamento hipertensão, asma e diabetes, entre outros, a demanda por produtos aumentou, segundo o diretor-executivo Marc Hasson.

“Subiu a procura por medicamentos em março, mas temos dito aos distribuidores que não teremos desabastecimento. Temos uma rede internacional de logística e um suporte na Alemanha que nos ajuda a procurar rotas e alternativas de embarque.” Segundo ele, não há risco de ruptura na cadeia de fornecimento.

A BI tem 1.000 funcionários no Brasil. Desses, 600 seguem a rotina na produção. Como precaução, as visitas às fábricas foram proibidas, e os ônibus fretados, duplicados. Nos assentos, são colocadas capas descartáveis em cada viagem.

Na área de energia, a BPBunge, que produz etanol e bioenergia a partir da cana, além de fazer açúcar, mudou a rotina em suas 11 usinas nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Goiás e Tocantins. Dos 9.500 funcionários, 200 foram para home office, e foram colocados em licença remunerada os que são de grupos de risco.

Na pandemia, a empresa passou a produzir álcool em gel para doar a funcionários e seus familiares e ao sistema público de saúde. No campo, tratores e colheitadeiras passaram a ter higienização a cada mudança de turno.

A empresa diz que a pandemia não afetou seus contratos e que aumentou estoques.

“Existe uma probabilidade de precisar substituir matérias-primas, a depender da duração da pandemia, mas monitoramos isso ao máximo em tempo real e temos resguardo”, afirma o diretor industrial, Wilson Lucena.

Na Hydro, gigante da extração e produção de alumínio, um quarto dos funcionários trabalha de casa. Em sua operação no Pará, antes mesmo de entrar no ônibus da empresa, cada funcionário tem a temperatura medida, segundo o diretor de operações, Carlos Eduardo Neves.

A empresa também tem um terminal no porto de Vila do Conde (PA). Ali, todos os navios que vêm de fora obedecem a quarentena de 14 dias, afirma Neves.

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