Indústria cai 9,1% no coronavírus; produção de caixões, luvas e papel higiênico sobe

Foi a pior queda mensal desde a greve dos caminhoneiros de 2018, diz IBGE

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Rio de Janeiro

A pandemia do novo coronavírus derrubou a produção industrial brasileira em março, informou nesta terça (5) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A queda em comparação com o mês anterior, de 9,1%, é a pior desde maio de 2018, quando a greve dos caminhoneiros paralisou o país.

De acordo com o instituto, o desempenho de março de 2020 coloca a produção industrial brasileira no mesmo nível de agosto de 2003. A queda foi generalizada, atingindo todas as categorias econômicas e 23 dos 26 ramos pesquisados.

"Na raiz desse resultado há claramente os efeitos do isolamento social, que levou à paralisação das operações de diversos segmentos da indústria e, mais do que isso, levou a um recuo disseminado entre as atividades industriais", disse o gerente da pesquisa, André Macedo.

O primeiro caso conhecido de Covid-19 ocorreu em 25 de fevereiro. No mês seguinte, março, o país começou a sentir os efeitos econômicos do novo coronavírus, com fechamento de bares, restaurantes e comércio como forma de evitar avanço da pandemia.

Em relação a março do ano passado, a produção industrial brasileira caiu 3,8%, no quinto resultado negativo nessa base de comparação. No ano, a indústria brasileira acumula queda de 1,7%. Considerando apenas os meses de março, foi o pior resultado da série iniciada em 2002.

Foi também o recuo mais disseminado da série histórica, junto com maio de 2018, quando a greve dos caminhoneiros derrubou a produção industrial em 11%. "A diferença é que aquela produção foi reposta no mês de junho, algo que a gente não vai conseguir observar agora no mês de abril."

A principal influência negativa veio do setor automotivo, que teve queda de 28%, com paralisações e interrupções na produção. Após o início da pandemia, 64 das 65 fábricas do país tiveram as operações suspensas, provocando efeitos negativos também na cadeia de suprimento.

Outras contribuições negativas relevantes vieram de confecção de artigos do vestuário e acessórios (-37,8%), de bebidas (-19,4%), de couro, artigos para viagem e calçados (-31,5%), de produtos de borracha e de material plástico (-12,5%) e de máquinas e equipamentos (-9,1%).

Do lado positivo, estiveram apenas ramos de impressão e reprodução de gravações (8,4%) — que inclui impressão de jornais, revistas, periódicos, cartões e formulários, por exemplo — de perfumaria e produtos de limpeza e de higiene pessoal (0,7%) e de manutenção e instalação de máquinas e equipamentos (0,3%).

Macedo diz que a pesquisa identificou crescimento na produção de bens com elevada demanda durante a pandemia, além dosde produtos de limpeza e higiene. Na atividade de produtos diversos, por exemplo, houve alta na fabricação de caixões, luvas e seringas. Na indústria de papel e celulose, cresceu a fabricação de papel higiênico.

O instituto, porém, não abre os percentuais por produtos. "Mas são altas insuficientes para trazer a atividade em que estão inseridos e muito menos para trazer a indústria em geral para o terreno positivo", comentou o gerente da pesquisa.

Entre as grandes categorias econômicas, bens de consumo duráveis teve a queda mais acentuada na comparação com fevereiro, ao recuar 23,5%, com a queda na produção de automóveis. Os setores de bens de capital (-15,2%) e de consumo semi e não-duráveis (-12,0%) também tiveram taxas maiores do que a média nacional.

A expectativa é que os impactos sejam ainda maiores em abril, já que os dados de março captam efeitos da pandemia apenas a partir do último terço no mês. "Se a gente considerar que tem maior frequência de empresas comunicando férias coletivas, paralisações, é natural supor que tenhamos seguimento desse comportamento", disse Macedo.

" Acho que ainda não vimos o fundo do poço ", concorda a economista Renata de Mello Franco, da FGV/Ibre. Na última sondagem feita pelo instituto, no fim de março, os empresários da indústria previam um abril pior do que o cenário que já viviam.

Em março, segundo a FGV/Ibre, a indústria registrou o pior patamar de ociosidade dos últimos 20 anos. O Nuci (Nível de Utilização da Capacidade Instalada), aponta que, em média, as fábricas estão operando em 57,5% do que poderiam, nível 15,9 pontos menor do que os 73,4% registrados em dezembro de 2016, o pior momento da recessão iniciada em 2014.

"Em nenhuma crise a gente teve o Nuci caindo para baixo de 70 pontos. E foi uma queda muito rápida, em dois meses", comenta Franco. Ela admite que há ainda muita incerteza para fazer previsões, mas acha difícil que o setor retome as atividades rapidamente após o fim das medidas de isolamento.

"A indústria de transformação vinha dependendo muito do consumo interno e os empregos estão sendo afetados pela crise", analisa ela. "E o mundo interio está sofrendo com essa pandemia, todo mundo está se contraindo. Então é difícil ter um impulso tão grande do comércio exterior."

De acordo com o IBGE, após a queda de março, a produção industrial brasileira está 24% abaixo do melhor momento da série histórica, em maio de 2011. A diferença é maior do que os 23,9% do mês da greve dos caminhoneiros.

A crise do coronavírus pegou a indústria do país em um momento já complicado, com oscilações entre resultados positivos e negativos nos últimos meses. A taxa acumulada em 12 meses, que mostra o comportamento em um prazo mais longo, fechou março em queda de 1%, o décimo recuo consecutivo.

Analistas de mercado já esperam 3,7% de recuo no PIB em 2020, segundo o boletim Focus divulgado pelo Banco Central nesta segunda-feira (4). Na projeção do FMI (Fundo Monetário Internacional), a economia brasileira encolherá 5,3% em relação ao ano passado.

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