Proteção extra, menos horas de serviço e banho na chegada: a rotina de quem não está em casa

Para quem continua na ativa, máscara e álcool em gel se tornaram imprescindíveis no cotidiano

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São Paulo

Em meio à pandemia do coronavírus, uma das recomendações repetidas à exaustão é a da necessidade de manter o distanciamento social. Para os milhares de passageiros que transitam pelas estações de metrô em São Paulo todos dias, a quarentena voluntária nem sempre é uma opção.

Quem trabalha em áreas consideradas essenciais, por exemplo, continuou na ativa, apenas com cuidados redobrados. A política de isolamento tem a redução da propagação do vírus seu objetivo final e, com isso, lojas, escritórios, bares e restaurantes tiveram de fechar as portas.

Muitos estabelecimento, no entanto, continuam funcionando da porta para dentro.

A mudança drástica na atividade econômica já deixou suas marcas. Nos meses de março e abril deste ano, 1,5 milhão de trabalhadores formais no Brasil passaram a ter o direito ao seguro-desemprego por terem sido demitidos.

O número de solicitações foi 31% maior do que o mesmo período do ano passado.

No primeiro trimestre de 2020, o desemprego subiu em todas as regiões do Brasil, segundo a Pnad Contínua, pesquisa realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Apenas no período entre janeiro e março deste ano, 1,2 milhão de pessoas ficaram desocupadas –sem trabalho formal ou informal.

O quadro ainda deve piorar, pois o agravamento da pandemia no Brasil se inicou apenas a partir da segunda semana de março.

A pesquisadora Maria Andreia Lameiras, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), diz que as próximas pesquisas deverão trazer também o efeito da redução nas horas trabalhadas. Para o IBGE, há subutilização da força de trabalho quando a pessoa não consegue cumprir um mínimo de 40 horas semanais.

Políticas de manutenção de emprego adotadas pelo governo Jair Bolsonaro, como a autorização para que empresa reduzam salário e jornada de maneira proporcional, deverão impactar esse quadro de horas trabalhadas.

A auxiliar administrativa Lucimara Barbosa, 28, trabalha em uma livraria na região central, para onde tem ido só dois dias na semana. Nos outros, trabalha a partir da casa em que mora com a família em Mauá, na Grande São Paulo.

Em junho, terá a jornada e o salário cortados pela metade. Diante da indefinição quanto à duração da crise econômica e da redução salarial –que inicialmente vai durar três meses– talvez precise trancar a graduação em administração de empresas.

Foi também a necessidade de economizar com os gastos da casa que levou a pensionista Maria de Fátima Lopes, 66, a atravessar as 11 estações da linha vermelha do metrô desde Itaquera, onde mora, para aproveitar o dia de liquidações em um supermercado popular no Parque Dom Pedro, região central de São Paulo.

O esforço, calculava, valeu a pena. Voltaria para casa com “uma porção de coisas” e apenas R$ 40 a menos na conta. Até a quarentena começar, complementava a renda como cuidadora de outras duas idosas. Com a pandemia, o trabalho cessou e o corte de gastos ficou mais urgente.

Para quem continua na ativa, máscara, álcool gel e cuidados com a higiene acabaram incorporados à nova rotina.

Para sair da casa onde mora com a esposa na Vila Matilde, o auxiliar de escritório Angelo Victor Malacrida, 41, providencia camadas extras de proteção. São quatro máscaras de tecido e mais uma viseira com um placa de acetato.

Desde o início da quarentena, sua rotina na assessoria de cartório onde trabalha está reduzida: vai dia sim, dia não ao escritório. A esposa, que é caixa em uma loja no Brás, está de licença e teme ser demitida.

Para quem trabalha por conta própria, a crise sanitária do coronavírus pode colocar em risco não só sonhos, mas também o nome limpo na praça.

Lucimari de Almeida, 52, é costureira há 15 anos e, em dezembro do ano passado se formou em design de moda. Tem com a mãe um ateliê de costura na região central, onde atendem principalmente consertos e ajustes de roupas dos funcionários do Tribunal do Justiça, na praça João Mendes, na região da capital.

Com o TJ-SP vazio e todo o ecossistema de escritórios de advocacia no entorno, além da Faculdade de Direito da USP, também às moscas, o trabalho mingou.

Ela continua indo ao ateliê duas vezes na semana. Primeiro, reforçou a produção de máscaras de proteção e agora tenta se organizar para produzir patches (emblemas que podem ser costurados a peças em tecido). “Agora tenho 36 parcelas de um empréstimo que eu só volto a pagar em agosto.”

No trabalho em setores considerados essenciais, as novidades na rotina são o uso da máscara e a higiene reforçada.

Alguns, como é o caso de Edilson Ferreira dos Santos, 40, não tiveram mudanças nem no horário de trabalho.

Segurança patrimonial em uma agência bancária da região da Sé, Santos agora também ajuda a controlar o fluxo de pessoas, filas, distanciamento e lotação do elevador. Com a pandemia, a esposa ficou sem trabalho e o filho, que buscava emprego, agora perdeu as esperanças.

“Já estava difícil antes. Agora é que ninguém acha trabalho mesmo.”

Elisangela Bonato Forte, 44, é servidora da Fazenda estadual. Lá, parte dos funcionários, aqueles de grupos de risco, estão trabalhando de casa. Ela é dos que segue indo à repartição. Vem todos os dias de Guaianases e, nos últimos dias com o novo rodízio, percebeu o metrô mais cheio.

Da nova rotina com a Covid-19, ela conta que, além do uso intenso do álcool gel, fica também o novo sistema ao chegar em casa. “Tiro toda a roupa e vou direto para o banho antes mesmo de falar com alguém.”

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