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Coronavírus, o debate econômico

BID reuniu US$12 bi para financiar retomada

Instituição têm recursos para atender setor privado, demandas de saúde pública, redes de seguridade e atender políticas fiscais para aliviar os impactos econômicos

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Alexandre Meira da Rosa

A atual crise sanitária, econômica e social que atinge o mundo, profundamente globalizado, não tem precedentes. Ainda assim, lições da história poderão ajudar nos desafios mais imediatos, bem como no planejamento da etapa seguinte, a da retomada do desenvolvimento.

As múltiplas dimensões desse problema exigem resposta por meio de políticas econômicas e sociais veementes dos Estados nacionais, como já se vê, mas sobretudo será necessário fortalecer o multilateralismo e suas instituições, assim como se viu no pós Segunda Guerra e décadas subsequentes.

A crise causada pela Covid-19 se dá de imediato na oferta e demanda em todo o mundo. Como uma pandemia, medidas drásticas –e necessárias– têm sido tomadas para conter o coronavírus e, como efeito colateral, causam uma parada súbita na demanda e oferta de muitas atividades econômicas. Em uma economia internacional integrada, tanto do ponto de vista financeiro como produtivo, o que se inicia na China, logo passa para Europa, EUA, América Latina e uma crise se dá em todo o mundo de forma sincronizada.

Funcionário usa máscara e protetor facial em Tóquio, Japão - Charly Triballeau/AFP

As projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI), publicadas em abril, indicam a gravidade da crise em 2020. A queda do PIB dos EUA poderia chegar a -5,9%, na Alemanha -7%, -6,5% no Reino Unido e -7,5% na zona do euro. Os mais pessimistas na virada do ano apostavam que a China cresceria 5 ou 6%, mas as projeções atuais do FMI estão em torno de 1%.

Se é grave nessas economias, para a América Latina e o Brasil os problemas econômicos e sociais tendem a ser ainda mais preocupantes. Nessas estimativas do FMI, a recessão no Brasil poderia chegar a -5,3%, na Argentina a -5,7% e México -6,6%.

Na América Latina e Caribe, como um todo, a queda seria de -5,2%. Ademais, são economias mais vulneráveis às commodities, fluxos financeiros e comerciais, à volatilidade na taxa de câmbio ou à desaceleração do turismo e remessas, tão importantes aos centro-americanos e caribenhos. Diante disso, a capacidade de atuar com aportes de liquidez e estímulos fiscais não é equivalente às economias desenvolvidas.

Nas economias dolarizadas, a margem de manobra da política monetária é reduzida e a crise de financiamento se agrava. Finalmente, são países com sistemas de proteção social relativamente mais frágeis e possuem grandes desigualdades sociais, elementos que devem acentuar os efeitos da pandemia e da crise econômica.

A resposta de vários países do mundo tem sido se preparar, no espaço doméstico, para um cenário comparável a uma economia de guerra, no qual o Estado planeja a plena utilização dos recursos produtivos para abastecer as necessidades da guerra.

Na atual crise, com uma diferença, o Estado precisa, primeiro, planejar a oferta de bens, serviços sanitários e atividades essenciais, as quais operam a plena utilização da capacidade e, segundo, conter ociosidades em várias atividades que estão paralisadas. A isso se associa enfrentar o desemprego e a queda na renda das famílias. No campo financeiro e monetário, os bancos centrais estão atuando com intensidade para conter dificuldades de liquidez nos mais variados mercados.

No Brasil não deve ser diferente. Será necessário conter o vírus ao mesmo tempo em que se deverá responder com políticas econômicas e sociais, para proteger as empresas e, em especial, os desempregados, mais pobres e vulneráveis. Mais do que isso, por ser um problema grave e que transcende fronteiras nacionais, resta fortalecer o multilateralismo. Sobretudo as instituições que poderão apoiar o Brasil e a América Latina, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Banco Mundial, Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), Novo Banco de Desenvolvimento (NBD, o Banco dos BRICS), FMI, agências das Nações Unidas e outras instituições.

O BID, em particular, é a principal fonte de financiamento multilateral para a América Latina e o Caribe. Foi fundado em 1959, quinze anos após a Conferência de Bretton Woods que ao final da Segunda Guerra criou o Banco Mundial, FMI e consolidou uma arquitetura internacional para a reconstrução e o desenvolvimento.

Atualmente, o BID é um banco regional que vai muito além de oferecer financiamento em moeda forte a juros baixos e prazos longos. O banco também mantém diálogo estratégico, aporta cooperação técnica e conhecimento. No caso do Brasil, o banco tem sido importante financiador da infraestrutura dos estados e municípios, bem como da modernização do setor público nacional. O BID também já se consolidou como uma plataforma de mobilização de recursos e uma instituição chave na integração regional, o que deverá ser muito importante na resposta à crise atual.

Nos últimos dias, o BID se mobilizou para colocar à disposição dos seus países membros ao menos U$S 12 bilhões. O BID Invest, instituição do Grupo BID que atende ao setor privado, dedicará US$ 5 bilhões. Serão recursos do Grupo BID para saúde pública; redes de seguridade para populações vulneráveis; produtividade e emprego; e políticas fiscais para aliviar os impactos econômicos.

O BID também é ativo na coordenação com outras instituições multilaterais, de modo que em conjunto, os montantes poderiam chegar a várias dezenas de bilhões de dólares. São volumes importantes e já colocados à disposição, mas insuficientes.

A crise é profunda, com implicações conjunturais e estruturais. Terminada a pandemia, a realidade econômica, social e mesmo geopolítica não será como antes. Deverá mudar de tal forma e dimensão que exigirá um novo consenso internacional que fortaleça novamente organizações como a nossa.

Após a Segunda Guerra houve coordenação global para a reconstrução e o desenvolvimento, que fundou uma arquitetura internacional favorável ao crescimento do comércio e das economias. É certo que as políticas para o desenvolvimento foram executadas nos espaços nacionais, mas foi também a ação multilateral que marcou décadas de crescimento, tanto na Europa e Estados Unidos, como na América Latina.

Portanto, assim como a devastação da Segunda Guerra redefiniu a arquitetura internacional e fundou instituições multilaterais importantes, o drama da atual pandemia exige novamente que o mundo, e especialmente a América Latina, fortaleça a articulação regional e internacional para o desenvolvimento. Nessa tarefa, as instituições multilaterais serão centrais e estarão prontas para responder ao desafio.

Alexandre Meira da Rosa

Vice-presidente de Países do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)

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