Com gasolina em baixa e alimentos em alta, inflação é pior para mais pobres

País teve nova deflação em maio, mas preço da cesta básica continua subindo

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Rio de Janeiro

Embora o país tenha fechado em maio o segundo mês consecutivo de deflação, o preço dos alimentos segue pressionando o bolso principalmente das famílias mais pobres, que foram mais atingidas pelo desemprego e perda de renda após o início da pandemia do novo coronavírus.

De acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o preço dos alimentos acumula alta de 3,70% no ano, enquanto o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) caiu 0,16%. Os produtos da cesta básica continuam subindo acima da inflação geral.

O cenário mostra que os indicadores de inflação também vêm sendo distorcidos pela mudança radical no perfil da atividade econômica brasileira após o início da pandemia, assim como ocorre com os dados de mercado de trabalho e das contas públicas, por exemplo.

No caso da inflação, os resultados foram puxados para baixo pela queda do preço dos combustíveis, que têm grande peso nos indicadores e responderam ao recuo da cotação internacional do petróleo após o início da pandemia.

Em maio, o grupo Transportes recuou 1,9% puxando o IPCA para deflação de 0,38%, a maior para o mês desde quando o IBGE começou a divulgar o indicador, em 1980.

Os preços da gasolina, diesel e do etanol caíram 4,35%, 6,44% e 5,96%, respectivamente. O preço das passagens aéreas, que recuou 27,14% no mês também colaborou, mas a gasolina teve a principal contribuição individual, de 0,5 ponto percentual.

Já os preços dos alimentos subiram 0,24% no mês, puxados pela alimentação em domicílio, que se tornou rotina para mais famílias após a quarentena e ficou 0,33% mais cara. São indicadores menores do que no mês anterior, de 1,79% e 2,24%, respectivamente.

"Mas é um aumento sobre outro aumento", ressaltou o gerente da pesquisa do IBGE, Pedro Kislanov. Nos últmos três meses, os produtos alimentícios registram aumento enquanto os não alimentícios vêm em queda.

Em 12 meses, enquanto o IPCA acumula alta de 1,88%, os alimentos sobem 6,48%. O cenário é especialmente danoso para a população de baixa renda, que destina 22% de seu orçamento para comprar comida, enquanto os transportes absorvem outros 9,4%.

Isto é, elas gastam mais dinheiro com itens que vêm sendo reajustados do que com aqueles em deflação. No caso das famílias com mais de 25 salários mínimos, é o oposto: 7,6% da renda fica com alimentação e 15,3%, com transporte.

"A inflação foi mais forte para a baixa renda, pois quanto menos se ganha mais se compromete o orçamento com a compra de alimentos", diz o economista André Braz, da FGV. A percepção é comprovada por dois indicadores de inflação mais adequados a famílias com menor renda.

O INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) do IBGE fechou maio com deflação de 0,25%, menor do que a do IPCA. Neste indicador, que pesquisa uma cesta de compras de famílias com renda de um a cinco salários mínimos, os alimentos subiram 0,40% em maio.

Já o IPC-C1 (Índice de Preços ao Consumidor-Classe 1) da FGV, que mede a inflação de famílias com renda de até 2,5 salários mínimos, caiu 0,30% em maio, contra 0,54% do IPC-BR, o indicador mais amplo da instituição.

Com base nos dados divulgados nesta quarta (10) pelo IBGE, Braz aponta que os produtos incluídos na cesta básica tiveram alta de 0,36% em maio, depois de subir 1,81% em abril e 1,25% em março.

A sequência de aumentos ocorrem em um momento em que o desemprego atingiu em cheio o trabalhador informal, que já tem rendas mais baixa. Segundo o IBGE, dos 4,9 milhões de brasileiros que perderam o trabalho em abril, 3,7 milhões eram informais.

"A sobrevivência dessas famílias piora com a abrupta redução dos postos de trabalho", diz o economista da FGV. "Sem renda a sensação é que a inflação é mais alta."

Uma mistura entre fatores sazonais, quebras de safras e alta procura foram responsáveis pela alta do preço dos alimentos nos primeiros meses da pandemia, mas o mercado espera que a situação se normalize nos próximos meses.

"Todo mundo continua comendo, indo mais ao supermercado e pode ter algum problema de logística coma pandemia, mas daqui para a frente a gente espera desaceleração, até porque entra em um período menos chuvoso", diz a economista Júlia Passabom, do Itaú.

Mesmo assim, ela espera que a inflação volte ao azul já em junho, com efeitos dos reajustes dos preços dos combustíveis feitos pela Petrobras desde o início de maio. "Houve alguns aumentos na gasolina que podem, sim, vir a impactar o índice de junho", concorda Kislanov, do IBGE.

A pressão, porém, não deve ser suficiente para elevar substancialmente os indicadores nos próximos meses, se confirmadas as expectativas de retomada lenda da economia. Para o Itaú, a inflação deve fechar o primeiro semestre perto de zero e o ano, próximo a 1,8%. O banco Mizuho fala em 1,5% e o MUFG, em 1,7%.

Em todos os casos, bem abaixo da meta de 4%, com 1,5 para coma ou para baixo, estipulada pelo Banco Central para 2020.

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