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Coronavírus, o debate econômico

Dado da indústria significa apenas que fundo do poço não foi tão profundo quanto se imaginava

Recuperação da produção será gradual e consistente somente a partir do segundo semestre.

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Renata Mello Franco

O resultado negativo da produção industrial de abril reflete os efeitos deletérios da pandemia do novo coronavírus sobre o setor, principalmente no segmento de transformação, já que a produção do setor extrativo ficou estável. Devido à necessidade de distanciamento social, o setor foi fortemente impactado tanto pelo lado da oferta quanto pelo lado da demanda.

Em relação à oferta, a necessidade de paralisação total ou parcial das fábricas por motivos sanitários afetou o nível de produção tanto diretamente, pela interrupção da produção, quanto indiretamente, pelos efeitos prejudiciais causados às cadeias produtivas.

Como uma das consequências —e não apenas por esse motivo—, os bens intermediários apresentaram a maior queda mensal observada em sua série, de 14,8% na margem.

Pelo lado da demanda, o aumento da incerteza e a deterioração do cenário econômico nacional e internacional levaram as pessoas a rever suas decisões de consumo, e empresas, suas decisões de investimento.

Para as empresas, a dificuldade de traçar um horizonte para a recuperação econômica e de fazer previsões acerca de seus negócios inviabilizam novos investimentos, bem como postergam os já contratados, o que influencia fortemente o desempenho dos segmentos produtores de bens de capital, cuja produção caiu inéditos 41,5%.

Além disso, o mercado externo também não tende a cooperar, já que os prognósticos para o fluxo de comércio mundial não são bons.

Apesar do câmbio desvalorizado, o que ajuda a impulsionar alguns segmentos, o desempenho das exportações da indústria de transformação só não foi pior neste ano, até aqui, devido à demanda externa ainda aquecida por bens não duráveis.

Ainda pelo lado da demanda, o aumento do desemprego e a redução da renda fizeram com que a procura por bens não essenciais pelas famílias despencasse, refletindo na produção de bens duráveis, semiduráveis e alguns segmentos de não duráveis.

Como destaque negativo, pelo segundo mês consecutivo o segmento de veículos automotores apresentou perdas mensais intensas, acelerando a queda de 28% observada em março para 88,5% em abril
—com variação interanual de -99,9% na produção de automóveis. Vale mencionar a queda de 58,3% na comparação interanual da produção de eletrodomésticos, com destaque para a linha branca (-75,2%).

De fato, como esses produtos possuem maior custo de aquisição, sua demanda depende da certeza que as pessoas têm em relação à manutenção da sua renda, algo que não é possível diante do cenário econômico tão adverso

Na contramão, apenas os segmentos de alimentos, farmacêutica e limpeza e perfumaria, itens considerados essenciais durante essa pandemia, apresentaram aumento de produção na margem. A

Apesar de a queda da produção não ter sido tão intensa quanto a mediana das previsões de mercado, isso significa apenas que o fundo do poço da atividade industrial não foi tão profundo quanto se imaginava. E, para os próximos meses, os prognósticos ainda não são bons.

A edição de maio da Sondagem da Indústria de Transformação da FGV Ibre mostra um setor ainda acentuadamente abalado pela crise. O crescimento marginal da confiança e do nível de utilização da capacidade instalada sinaliza uma melhora muito tímida no mês, tendência que deve persistir em junho.

A recuperação da produção industrial será gradual, e de forma consistente, somente a partir do segundo semestre.

Renata Mello Franco

É pesquisadora da FGV Ibre

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