Empregados do Facebook fazem paralisação virtual em protesto contra mensagens de Trump

Eles protestam contra decisão da empresa de não tomar providência em relação a mensagens postadas pelo presidente

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Nova York

Dezenas de empregados do Facebook, em uma rara crítica pública à sua empresa, protestaram contra a decisão dos executivos de não tomar qualquer providência com relação a mensagens inflamatórias postadas pelo presidente Donald Trump na plataforma de mídia social, na semana passada.

Os empregados, que declararam que se recusavam a trabalhar a fim de demonstrar sua solidariedade aos manifestantes de todo o país, acrescentaram uma mensagem automática aos seus perfis digitais e respostas de email, anunciando que tinham deixado o escritório em protesto.

O grupo de protesto –que está realizando uma espécie de abandono virtual do trabalho porque a maioria dos trabalhadores do Facebook está trabalhando de casa em função do coronavírus– foi um entre diversos grupos de empregados do Facebook que pressionaram os executivos da empresa a adotar uma postura mais dura contra as mensagens de Trump.

Dentro da companhia, membros da equipe circularam petições e ameaçaram se demitir, e alguns empregados expressaram sua insatisfação em público, no Twitter e em outros veículos. Mais de uma dúzia de atuais e antigos empregados da companhia descreveram a inquietação como o mais sério desafio à liderança do presidente-executivo Mark Zuckerberg desde que o Facebook foi fundado, 15 anos atrás.

“A retórica do ódio do presidente dos Estados Unidos, que advoga a violência contra os manifestantes negros, não merece defesa sob a rubrica da liberdade de expressão”, escreveu um empregado do Facebook em um fórum interno de discussões, de acordo com uma cópia do texto vista pelo The New York Times.

O empregado acrescentou que “ao lado dos empregados negros da companhia e de todas as pessoas dotadas de consciência moral, apelo a Mark que remova imediatamente o ’post’ em que o presidente advoga violência, homicídio e faz ameaças iminentes às pessoas negras”.

Zuckerberg argumentou em diversas ocasiões que o Facebook deveria adotar uma abordagem distanciada com relação ao que as pessoas postam, o que inclui mentiras de funcionários eleitos e de outras pessoas em posição de poder. Ele afirmou repetidamente que é necessário permitir que as pessoas decidam em que acreditam.

Essa posição foi colocada em teste na semana passada quando o Twitter adicionou alertas e avisos de verificação de fatos a dois tuites do presidente que violavam as normas de empresa quanto a supressão de eleitores e glorificação da violência. Mas quando o Twitter agiu sobre mensagens do presidente, o Facebook optou por não interferir. Zuckerberg afirmou que as postagens de Trump não violavam as regras da rede social.

“Pessoalmente, tenho uma reação visceralmente negativa a esse tipo de retórica inflamatória e divisiva”, Zuckerberg afirmou em um post em sua página de Facebook na sexta-feira (29). “Mas minha responsabilidade é reagir não só em minha capacidade pessoal mas como líder de uma instituição que tem um compromisso para com a liberdade de expressão”.

Em resposta ao protesto, Zuckerberg adiantou sua reunião pessoal com os empregados para a terça-feira (2), em lugar da quinta (4). A reunião será uma oportunidade para que os empregados questionem Zuckerberg diretamente sobre sua decisão.

Uma porta-voz do Facebook disse na sexta-feira (29) que os executivos recebiam positivamente as ações dos empregados.

“Reconhecemos a dor que muitos de nossos trabalhadores estão sofrendo agora, especialmente nossa comunidade negra”, disse Liz Bourgeois, a porta-voz. “Encorajamos o pessoal a falar abertamente quando discorda da liderança”.

A mensagem em que Zuckerberg explicou sua decisão sobre os tuites de Trump, na semana passada, frustrou muita gente dentro da companhia. Mais de uma dúzia de empregados do Facebook tuitaram seu desacordo com a decisão de Zuckerberg, entre os quais Andrew Crow, o vice-presidente de design do Facebook.

Uma engenheira da plataforma, Lauren Tan, escreveu sobre a situação na sexta-feira. “A inação do Facebook quanto a retirar as mensagens de Trump que incitam à violência me causa vergonha por trabalhar aqui”, tuitou Tan. “Silêncio significa cumplicidade”.

Dois empregados importantes do Facebook disseram ao The New York Times que haviam informado aos seus chefes que pediriam demissão se Zuckerberg não revertesse sua decisão. Outra pessoa, que deveria começar a trabalhar na empresa no mês que vem, informou o Facebook de que não aceitaria mais o posto na companhia, por conta da decisão de Zuckerberg.

No fim de semana, circularam diversas petições entre os empregados do Facebook pedindo que a companhia realize mudanças de pessoal, e apelando por uma diversidade maior de vozes entre os subordinados diretos de Zuckerberg.

Em conversas online privadas, empregados pediram a demissão de Joel Kaplan, vice-presidente mundial de políticas públicas do Facebook. Kaplan é visto como uma forte voz conservadora dentro da empresa.

Em 2018, ele incomodou alguns trabalhadores ao ocupar um lugar de primeira fila nas audiências de confirmação de Brett Kavanaugh, de quem ele é amigo próximo, como juiz da Suprema Corte.

Zuckerberg e Sheryl Sandberg, a vice-presidente de operações da companhia, planejam conversar na noite da segunda-feira com líderes dos direitos civis que protestaram em público contra a proteção da empresa às mensagens de Trump. A conversa deve incluir Vanita Gupta, da National Leadership Conference, Rashad Robinson, da Color of Change, e Sherrilyn Ifill, do Fundo de Defesa e Educação da NAACP.

Os líderes dos direitos civis disseram que pressionarão Zuckerberg sobre sua posição quanto aos “posts” de Trump, que eles veem como violações das normas comunitárias do Facebook que proíbem a supressão de eleitores e a incitação à violência, mesmo por figuras públicas.

No domingo (31), Zuckerberg escreveu que doaria US$ 10 milhões a organizações que trabalham pela justiça social. A decisão, aliada a uma mensagem anterior do executivo expressando solidariedade aos manifestantes, pouco fez para acalmar os protestos internos.

Robinson, da Color of Change, disse que a promessa de assistência financeira do Facebook era “uma das coisas mais insultuosas que já vi”.

Os executivos do Facebook reconhecem há muito tempo que a empresa não foi capaz de atrair uma força de trabalho diversificada.​

The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

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