IRB republica balanço e reduz lucro de 2019 em R$ 550 milhões

Empresa acusa ex-diretores de manipular dados e pagar bônus irregulares

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Rio de Janeiro

Após investigações sobre manipulação de dados pela diretoria anterior, o IRB Brasil Resseguros decidiu republicar o balanço de 2019, reduzindo em R$ 550 milhões o lucro líquido realizado durante o ano. A empresa anunciou ainda queda de 92,2% no lucro do primeiro trimestre.

O novo comando da empresa reconheceu erros contábeis que haviam sido denunciados no fim do ano pela corretora Squadra, em relatório que detonou uma crise de credibilidade sobre a situação financeira da seguradora e derrubou seu valor em bolsa.

Segundo o IRB, "ex-diretores e outros colaboradores da companhia praticaram irregularidades que culminaram na modificação intencional e sistêmica de dados operacionais da companhia relacionados, principalmente, à provisão de sinistros a liquidar".

No primeiro trimestre, a seguradora teve lucro de R$ 13,8 milhões. A empresa anunciou ainda estudos sobre um processo de capitalização para reenquadrar seus ativos a critérios estabelecidos pela Susep (Superintendência de Seguros Privados) após as irregularidades contábeis.

A identificação de responsáveis por fraudes no pagamento de bônus no IRB levou as ações da empresa a um movimento de recuperação na bolsa de São Paulo. - Rahel Patrasso. 10.jul.209/Xinhua

Na sexta (26), a seguradora já havia informado que investigação interna identificou os responsáveis pela divulgação de informações falsas ao mercado financeiro e detectou irregularidades no pagamento de cerca de R$ 60 milhões em bônus a diretores e colaboradores.

Em comunicados enviados à CVM (Comissão de Valores Mobiliários) no final da noite de segunda (29), o IRB diz que reavaliações dos resultados anteriores "confirmaram que uma série de registros contábeis conduzidos pela antiga diretoria estavam efetivamente incorretos e recomendavam ajustes".

As apurações detectaram irregularidades contábeis com "impactos relevantes" no resultado, disse a seguradora. Após as revisões, o lucro de 2019 foi reduzido de R$ 1,76 bilhão para R$ 1,21 bilhão.

Em entrevista nesta terça (30), a empresa negou-se a informar o nome dos envolvidos nas irregularidades, alegando que o caso está sob sigilo. No início de março, o presidente e o diretor financeiro do IRB, José Carlos Cardoso e Fernando Passos, deixaram os cargos.

Eles foram apontados por analistas do mercado como responsáveis pela divulgação de informações falsas sobre interesse do fundo americano Berkshire Hathaway na companhia.

Na época, o IRB já vivia uma crise detonada pelo relatório da Squadra questionando as práticas contábeis e pela renúncia, em fevereiro, do presidente do conselho de administração da companhia, Ivan Monteiro, alegando razões pessoais.

O suposto interesse do fundo do bilionário Warren Buffet foi encarado como um sinal de confiança na seguradora e levou as ações a subir 6,6% em um só dia. O fundo, porém, disse depois nunca ter participado e nem ter o interesse de participar da empresa.

A nova direção da companhia concluiu que a gestão anterior deixou de contabilizar sinistros e registrou de forma errada no balanço ganhos com a venda de participações imobiliárias, o que ajudou a inflar o resultado.

"É como diz o ditado: você pode enganar muitos por muito tempo mas não pode enganar todos por todo o tempo", disse nesta terça o novo presidente do IRB, Antônio Cássio dos Santos, nomeado pelos acionistas em março, no auge da crise.

Ele elogiou a atuação da Squadra, que havia sido acusada pela gestão anterior de tentar manipular o mercado com o relatório que apontou inconsistências no balanço. "Merece meu respeito como [executivo] financeiro e como leitor de analista de balanço, foi uma coisa fantástica."

Santos defendeu que a PwC, auditoria independente que aprovou sem ressalva as contas de 2019 da empresa, mantém a confiança da seguradora. "Da mesma forma que o conselho foi vítima, a empresa foi vítima, eles também foram vítimas", afirmou.

O novo documento entregue à CVM traz seis páginas da auditoria explicando como funciona o processo de análise e quais os pontos de atenção são considerados. Diz que sua atuação "foi planejada e executada considerando que as operações da resseguradora e suas controladas não apresentaram modificações significativas em relação ao exercício anterior".

Para Santos, o agressivo programa de bônus para executivos, que premiava a diretoria também pela valorização das ações em bolsa, pode ter servido de incentivo às irregularidades constatadas. Entre 2017 e 2019, com lucros crescentes, a companhia teve valorização de 200%, a terceira maior da bolsa de São Paulo.

"As coisas turvas à alma humana colocam em risco qualquer plano que possa parecer fantástico, maravilhoso, bem construído ou bem feito", comentou. O programa de incentivo, chamado Superação, foi descontinuado pela nova gestão.

As irregularidades contábeis levaram a Susep a abrir uma fiscalização sobre a companhia, que identificou insuficiência de liquidez regulatória, um parâmetro que garante que a empresa tenha ativos suficientes para cobrir os sinistros de todos os seus contratos.

A empresa defendeu que não enfrenta risco de insolvência, mas contratou os bancos Bradesco BBI e Itaú BBA para estruturar um processo de aumento de capital para se readequar aos parâmetros da Susep. O valor ainda não foi definido e o processo deve ser concluído até setembro.

Em 2019, com a venda de fatias majoritárias da Caixa e do Banco do Brasil, o IRB passou a ser uma empresa com capital pulverizado em bolsa. Após a crise, os acionistas decidiram ampliar o tamanho da diretoria, para evitar a concentração de poder em poucas mãos.

A empresa diz ainda que substituiu executivos que exerciam funções chave, afastou funcionários e reavaliou a estrutura funcional. Está também revisando seus estatutos, corrigindo controles internos e reavaliando suas políticas contábeis e atuariais.

Os eexecutivos que cometeram as irregularidades podem ser processados para ressarcimento dos danos. Santos, porém, disse que a partir de agora a responsabilização fica sob atribuição das autoridades, tanto do mercado financeiro, quanto criminais.

Segundo o novo diretor financeiro, Werner Suffert, a empresa não espera novos impactos relevantes das irregularidades em suas finanças. "Não temos nenhuma sinalização de que teremos outras questões do porte dessa."

Santos diz que a crise de credibilidade não afetou contratos, mas o conceito de reconstrução da confiança foi ressaltado pelos executivos durante a entrevista desta terça. Para ele, o papel da gestão atual é "trazer de volta a essa organização aquilo que por algum tempo pareceu que jamais seria recuperado".

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