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Acordos sobre suspensão de contrato e redução de salário são quase metade dos firmados na pandemia

Entre março e junho, 42% dos instrumentos trataram do tema, aponta levantamento do Dieese

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São Paulo

A fatia de acordos e convenções que tratam de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato alcançou 42% dos firmados entre março e junho, segundo levantamento feito pelo Dieese.

Nesse período, foram registrados 7.398 instrumentos coletivos, sendo que 55% deles continham alguma cláusula relacionada à pandemia. Os setores de serviços e indústria foram os que mais citaram a Covid-19.

Ao mesmo tempo, o número de acordos e convenções sobre reajuste salarial no primeiro semestre caiu 28% em comparação com o mesmo período do ano passado. O mês de abril foi o que registrou maior queda, de 41%.

Como o número total de instrumentos firmados permaneceu estável —em 2019 foram 8.574 e em 2020, 8.827—, a redução indica que as negociações sobre reajuste foram substituídas por questões relativas aos impactos da Covid-19.

Segundo Luís Ribeiro, técnico do Dieese responsável pelo levantamento, a análise preliminar dos dados aponta que cerca de um quarto das negociações de reajuste salarial nesse período não conseguiu repor a inflação (a entidade ainda está finalizando o balanço completo do primeiro semestre).

“É um sinal ruim porque a inflação está muito baixa e mesmo com assim não vemos categorias conseguindo repô-la”, afirma Ribeiro.

A crise econômica, o desemprego em alta e as dificuldades financeiras das empresas fragilizam a posição de negociação dos sindicatos por reajustes com ganho real. Efeito desse cenário, o número de greves registradas no primeiro semestre foi o menor desde 2011.

Na semana encerrada em 4 de julho, 48,1% da população em idadade para trabalhar tinha uma ocupação, menor patamar da série histórica doi IBGE.

Por outro lado, muitas categorias cuja data-base é no primeiro semestre incluíram nos acordos cláusulas estabelecendo o adiamento das negociações salariais para o período pós-pandemia, aponta o Dieese.

As atividades que mais fecharam acordos de redução de jornada e salário ou suspensão de contrato foram metalurgia, turismo e comércio —esses dois últimos, setores fortemente impactados pelas restrições de circulação impostas pela quarentena.

Entre os comerciários, 48% dos acordos e convenções feitos entre março e junho incluíam alguma cláusula relativa à MP 936. Desses, 85% trataram de suspensão de contrato e 60% de redução de jornada e salário (os números superam 100% porque um mesmo acordo ou convenção pode tratar dos dois temas).

Já entre os metalúrgicos a proporção se inverte: 75% dos instrumentos focaram redução de jornada e salário e 49%, suspensão de contrato. Considerando todos os acordos firmados entre março e junho, 57% abordaram a MP 936.

Embora seja uma categoria que comparativamente sofreu menos na atual conjuntura, a alta incidência de acordos decorre da prática já ser tradicional entre metalúrgicos. O contrário ocorre com o setor de serviços, que foi fortemente impactado pela crise e cujos trabalhadores têm maior dificuldade de organização.

Principal motor da economia brasileira, o setor de serviços acumulou até maio queda de 7,6% em comparação com igual período do ano passado.

Com a pandemia, ganhou destaque a atuação de entidades do segmento, como os sindicatos de professores e trabalhadores dos transportes, diz Ribeiro.

Um exemplo é o Sindicato dos Aeronautas, que fechou acordos com Gol e Azul de redução de jornada e salário até o fim de 2021, garantida em contrapartida a estabilidade de todos os pilotos. A entidade está agora em processo de negociação com a Latam Brasil para garantir um acordo nos mesmos tempos, sem reduções permanentes na remuneração dos funcionários.

O sindicato dos professores da rede privada de São Paulo (Sinpro-SP), por sua vez, tem atuado contra demissões em massa em universidades particulares. Em junho, a entidade foi à Justiça contra a demissão de mais de 300 docentes da Uninove.

Os entregadores de aplicativo também têm se organizado dentro e fora de sindicatos para pressionar as empresas por um repasse maior e acesso a equipamentos de proteção contra a Covid-19.

Epicentro da doença, São Paulo foi estado com maior incidência de acordos com cláusulas envolvendo a Covid-19 em termos absolutos e proporcionais ao total de instrumentos firmados.

Alguns acordos buscaram avançar em relação à MP incluindo compensações para quem está trabalhando em home office, como um valor fixo entre R$ 50 e R$ 60 para despesas com energia e internet.

“Esse é um dos temas que vai entrar em definitivo nas negociações. Se por um lado as empresas estão descobrindo o home office como uma alternativa para cortar despesas, por outro os sindicatos estão negociando para que o custo desse trabalho não seja transferido todo para o trabalhador”, diz Ribeiro.

Esse é o caso dos petroleiros. No congresso da federação da categoria, encerrado neste domingo (19), foi aprovada a inclusão de regras sobre teletrabalho na pauta de reivindicações que serão levadas à Petrobras na negociação do acordo coletivo com a empresa.

Uma das demandas é que o regime seja opcional para o trabalhador, prevendo fornecimento de material e reembolso de despesas para quem decidir permanecer em home office.

Os instrumentos mais utilizados foram os acordos coletivos, firmados entre sindicatos e empresas individuais, enquanto o número de convenções, que abrangem toda a categoria, caiu.

Isso acontece porque as empresas foram afetadas de forma diferente pela pandemia, demandando a negociação de acordos específicos para seus problemas.

“A convenção é mais robusta, prevista para acontecer na data-base, serve basicamente para negociar reajuste salarial e outras garantias. Já o acordo pode ser algo emergencial, circunstancial. Esse aumento nos acordos mostra portanto que os sindicatos estão atuando forte nessa conjuntura, indo para a luta”, diz Ribeiro.

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