Bolsonaro sanciona novo marco do saneamento básico

Proposta estabelece metas para o setor e abre caminho para investimentos privados

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou nesta quarta-feira (15) o novo marco regulatório do saneamento básico, medida que estimula a participação da iniciativa privada no setor.

Onze dispositivos do texto foram vetados pelo mandatário. O texto da lei ainda não foi publicado no Diário Oficial da União.

Entre os vetos, está o que permitia que estatais que prestam os serviços hoje renovassem contratos por mais 30 anos sem licitação. A decisão de Bolsonaro contraria interesses de governadores, que pressionavam pela manutenção do artigo.

Também foi vetado trecho que, segundo o governo, impediria que o setor de resíduos sólidos se beneficiasse das novas regas estabelecidas pelo marco legal.

Na justificativa do veto parcial, o governo argumentou que os dispositivos contrariam os objetivos do marco legal, que busca promover competitividade e eficiência por meio de contratos de concessão com licitação.

O Ministério do Desenvolvimento Regional afirmou ainda que os vetos não representam um ato de confronto ao Congresso, que tem a palavra final sobre a medida.

Presidente Jair Bolsonaro em evento no Palácio da Alvorada; novo marco do saneamento teve 11 dispositivos vetados
Presidente Jair Bolsonaro em evento no Palácio da Alvorada; novo marco do saneamento teve 11 dispositivos vetados - Adriano Machado/Reuters

Na manhã desta quarta o Planalto inicialmente informou apenas três dos vetos realizados por Bolsonaro, acompanhados das respectivas justificativas.

Os demais só foram revelados à noite.

Bolsonaro também barrou um dispositivo que abria brecha para que a subdelegação de serviços de saneamento básico excedessem o limite de 25% do valor do contrato.

Também ficou de fora da redação avalizada por Bolsonaro artigo que passava ao Conselho Nacional de Recursos Hídricos a responsabilidade por acompanhar a execução do Plano Nacional de Saneamento Básico.

Outro item vetado é o que determinava que a União deveria disponibilizar recursos federais e assistência técnica para apoiar a organização dos blocos de prestação de serviços de saneamento regionalizada.
Bolsonaro também vetou um parágrafo que dizia que o governo federal e os estados deveriam manter ações de apoio técnico e financeiro para que os municípios pudessem alcançar a meta de acabar com os lixões.

Por fim, um dos últimos artigos retirados do texto da lei por Bolsonaro colocava sob competência dos municípios o licenciamento ambiental dos empreendimentos e serviços de saneamento básico.

O modelo sancionado abre caminho para o envolvimento de empresas na universalização do acesso a água e esgoto. Somente 6% das cidades são atendidas pela iniciativa privada atualmente. Em 94% dos municípios, o serviço é feito por estatais.

O projeto foi aprovado pelo Senado no final de junho, com 65 votos favoráveis e 13 contrários, com oposição de toda a bancada do PT.

A proposta, agora convertida em lei, estabelece metas de saneamento a serem cumpridas em até 12 anos. O potencial de investimentos estimado para a universalização dos serviços, segundo o relator da proposta, senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), e membros do governo é de R$ 700 bilhões no período.

O prazo para o cumprimento das metas poderá ser acrescido de mais sete anos. Isso será adotado se a empresa prestadora do serviço comprovar inviabilidade técnica ou financeira.

O novo marco do saneamento básico criou expectativas para a economia, sobretudo para a retomada pós-pandemia do coronavírus. A medida era uma das prioridades do Ministério da Economia para atrair investimentos privados para o país.

O ministro Luiz Ramos (Secretaria de Governo) afirmou antes da aprovação que a nova lei poderá gerar até 1 milhão de empregos em cinco anos.

Em razão das carências do setor, a nova legislação é vista como um ponto de estímulo do crescimento da atividade.

Segundo o governo, o Brasil tem hoje aproximadamente 104 milhões de pessoas sem serviço de coleta de esgoto. Outros 35 milhões de brasileiros não contam com acesso de água tratada. Isso estimula a proliferação de doenças, argumento que fortaleceu a votação do projeto na pandemia.

O contexto do novo coronavírus deu força à proposta entre senadores. O projeto estava parado na Casa desde o fim do ano passado.

O projeto amplia as possibilidades de que empresas privadas possam prestar o serviço. Vencedoras de licitação terão de se comprometer com as metas de eficiência e universalização.

A nova lei define que, até dezembro de 2033, o acesso à água potável no país deve ser ampliado para 99% da população. O tratamento e a coleta de esgoto deve alcançar 90% da população no mesmo período.

Bolsonaro tinha até 15 de julho para a sanção.

Contaminado pelo novo coronavírus, o presidente participou da solenidade por videoconferência e não deu nenhuma declaração.

O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, afirmou que a perspectiva de universalização do setor se torna concreta após a sanção.

“Já temos uma carteira de mais de R$ 50 bilhões pronta para ser oferecida para a iniciativa privada. O primeiro leilão deverá acontecer já no mês de setembro no estado de Alagoas”, disse.

O novo marco legal determina a realização de licitação, com participação de empresas públicas e privadas, e acaba com o direito de preferência das companhias estaduais.

O advogado especialista em infraestrutura Fernando Vernalha explica que os municípios são os titulares dos serviços de saneamento e celebram contratos com empresas estaduais sem licitação. Com a nova lei, isso não será mais permitido.

“Estamos muito atrasados em relação à universalização e o modelo atual não está funcionado. As companhias estaduais perderam a capacidade de investir", disse.

Segundo Vernalha, outro ponto importante da lei viabiliza operações regionais de saneamento, com agrupamento de municípios para um contrato. Com isso, os termos podem ser assinados de forma que serviços de cidades menores, que geram pouco ou nenhum ganho, sejam compensados pelas receitas geradas por grandes cidades.

A ideia dos aliados do presidente é que as medidas possam vigorar já em 2021 para ajudar na retomada da economia, além de ampliar o acesso a água e esgoto no país.

No entanto, a implementação da medida ainda depende de regulamentações que podem ser alvo de disputa política entre o setor privado e as estatais.

Entre a regulamentação e a modelagem dos novos projetos, especialistas acreditam que as primeiras licitações devam começar a sair do papel apenas em 2023.

De qualquer maneira, agentes do segmento já se movimentam e demonstram interesse em entrar nas operações.

Pessoas do setor afirmam que fundos americanos (como o Macquarie), canadenses e do Oriente Médio já contrataram assessorias técnicas para avaliar as oportunidades do segmento.

Entre estrangeiros, há ainda grupos como o espanhol Acciona e os chineses CGGC (Grupo Gezhouba) e CREC 4 (Grupo CTCE), interessados em concessões no ramo.

Grupos nacionais de outras áreas da infraestrutura, como CCR, Pátria e Equatorial, também querem ingressar no setor, segundo pessoas familiarizadas com o tema.

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