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Marcos Lisboa e Marcos Mendes

Novo Fundeb agravará a crise de estados e municípios

Não se está olhando para a educação das crianças e para o futuro, e sim para o passado

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Marcos Lisboa

Economista, presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005, governo Lula), é colunista da Folha

Marcos Mendes

Pesquisador associado do Insper, é autor de 'Por que É Difícil Fazer Reformas Econômicas no Brasil?'

O Fundeb foi desde a sua criação, ainda como Fundef, um instrumento importante para equalizar o gasto em educação nas diferentes redes estaduais e municipais. Também foi importante por acabar com a remuneração aviltante que muitos professores recebiam nos anos 1990.

Hoje, parte relevante do financiamento da educação básica está assentada no Fundeb. Por isso, o fundo não pode ser extinto, como prevê a legislação atual.

A proposta em discussão na Câmara, contudo, não se limita a renovar o fundo, mas também amplia os recursos aportados pelo Governo Federal, sendo que pelo menos 70% deles devem ser destinados ao pagamento de salários de servidores.

Há inúmeros problemas na iniciativa. Discute-se nesta nota, porém, um aspecto específico que tem sido negligenciado no debate: a regra de reajuste do piso salarial do magistério.

A Lei 11.738, de 2008, define que o piso salarial seja reajustado pelo mesmo índice de variação do gasto por aluno do Fundeb. Desde então, essa regra gerou um aumento de 67% no piso acima da inflação. Esse expressivo crescimento decorre da queda do número de alunos, resultado da transição demográfica, e da expansão da receita de impostos vinculados ao fundo.

Apenas em 2020, o reajuste do piso foi de 12,84%, agravando ainda mais as contas públicas dos governos locais.

Além disso, a lei permitiu que o piso fosse mais do que um simples “salário mínimo dos professores”. Ele indexa toda a escala de remunerações, dando aumentos até para quem está no topo da carreira.

O peso que isso representa para as finanças estaduais e municipais fez muitos gestores simplesmente acabarem com os planos de carreira, desorganizando o sistema de progressão por mérito, para evitar o grande impacto fiscal do reajuste. Isso prejudica a adoção de políticas de incentivo à melhoria do aprendizado dos alunos.

Outro problema é gerado pelo fato de a lei estabelecer que o piso também se aplica a inativos e pensionistas, desequilibrando ainda mais as contas previdenciárias dos estados e municípios. Até nas cidades sem regime próprio, em que os professores deveriam receber apenas do INSS, não onerando os cofres locais, os prefeitos têm de pagar a diferença entre a aposentadoria e o piso. Como docentes se aposentam mais cedo, a conta é alta.

Com o aumento dos recursos para o Fundeb, proposto na PEC ora em discussão, e a continuação da queda do número de alunos, a relação de gasto por aluno vai crescer ainda mais, desencadeando reajustes do piso salarial acima da inflação nos próximos anos. Isso significará mais dificuldades para os governos locais, muitos dos quais já não conseguem pagar em dia os salários atuais.

Não se está olhando para a educação das crianças e para o futuro, e sim para o passado: mais pagamento de aposentadorias e a necessidade ainda maior de socorro da União aos estados e municípios nos próximos anos. Nisso somos craques.

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