Reino Unido veta Huawei do 5G, em vitória de Trump que deve afetar o Brasil

Nova lei em Hong Kong e embargo dos EUA contra gigante chinesa são motivos para mudança

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São Paulo

Em uma vitória dos Estados Unidos sobre a China, o Reino Unido anunciou que vai banir a Huawei do fornecimento de infraestrutura para suas redes de tecnologia 5G.

A decisão do primeiro-ministro Boris Johnson, anunciada nesta terça (14), deverá afetar os negócios potenciais da maior empresa de telecomunicações do mundo em diversos países, inclusive o Brasil.

Dois fatores foram centrais para a decisão britânica. Primeiro, a imposição de uma draconiana lei de segurança nacional por Pequim sobre Hong Kong, que foi colônia de Londres até 1997, basicamente encerrando o acordo entre os dois países para a manutenção de uma certa autonomia local até 2047.

Segundo, a sanção imposta em maio pelos EUA contra a Huawei, que ficou proibida de usar chips feitos por fabricantes americanos, coibindo aí aliados como a gigante taiwanesa TSMC.

Os britânicos haviam achado uma solução algo salomônica para o impasse sobre seu 5G —a chamada internet das coisas, redes ultrarrápidas que no futuro conectarão de geladeiras e carros a blindados e drones.

Imagem de vídeo mostra o secretário Dowden anunciando o banimento da Huawei ao Parlamento
Imagem de vídeo mostra o secretário Dowden anunciando o banimento da Huawei ao Parlamento - AFP

Em janeiro, Londres havia dito que as operadoras britânicas poderiam ter até 35% de suas redes fornecidas pela Huawei, que lidera o mercado mundial, disputado principal com a finlandesa Nokia, a sueca Ericsson e a coreana Samsung.

Ficariam fora do alcance dos chineses redes com dados estratégicos de segurança nacional. O governo Donald Trump trava uma guerra comercial e geopolítica com Pequim desde 2017, e alega que o equipamento chinês permite a espionagem de dados sensíveis.

Os americanos advogavam pelo veto total, que veio agora. Segundo o secretário digital britânico, Oliver Dowden, "essa não foi uma decisão fácil, mas a correta para as redes, para nossa segurança nacional e para nossa economia".

Num movimento para acalmar as grandes operadoras britânicas, como a Vodafone e a BT, foi feito um escalonamento do expurgo do material chinês —que já começara a ser instalado. Nenhum kit poderá ser comprado a partir de 2021 e todos os existentes terão de ser eliminados até 2027.

Isso não incluirá aparelhos celulares e as redes de 2G, 3G e 4G, amplamente ocupadas pela Huawei no país, assim como no resto do mundo. Segundo Dowden, elas serão obsoletas quando a transição estiver completa para o 5G.

Para Boris, essa decisão sobre as redes antigas trará um problema com a ala mais radical de seu partido, o Conservador, que quer seguir a linha dura total contra Pequim após a introdução da lei em Hong Kong, na semana retrasada.

A decisão britânica, que coloca a Huawei como um "vendedor estatal de alto risco", ocorre numa semana de forte lobby americano contra os chineses.

O conselheiro nacional de segurança de Trump, Robert O'Brien, vai esta semana a Paris se encontrar com colegas franceses, alemães e italianos para falar sobre os riscos percebidos pelos EUA a respeito da Huawei. Todos esse países estão em processo de instalação das suas redes 5G.

Empresas americanas como a Qualcomm são favorecidas no processo, por fornecerem hardware para as concorrentes europeias da Huawei.

O impacto deverá ser sentido no Brasil. Apesar de o governo Jair Bolsonaro declarar alinhamento automático ao de Trump, a resolução do Gabinete de Segurança Institucional acerca de quem poderia fornecer infraestrutura ao país havia sido a de liberar o acesso aos chineses.

O leilão das frequências de 5G, a ser disputado pelas quatro grande operadoras brasileiras de telefonia móvel, só deve ocorrer no ano que vem. Assim, ajustes nas regras estão em aberto, e a pressão contra a presença chinesa deverá aumentar.

Em princípio, o GSI era favorável a impor limites a Pequim ao estilo da primeira decisão britânica. Já os técnicos da área de comunicações eram favoráveis a um modelo aberto.​

Do ponto de vista ideológico, o Itamaraty do chanceler Ernesto Araújo vem se chocando com a ala militar do governo, menos alérgica à China —e não apenas sobre o 5G. Os americanos vinham pressionando constantemente o Brasil em favor de fornecedores ocidentais também.

Mas agora há também uma questão técnica.

A sanção americana à Huawei, segundo a argumentação de Dowden, sugere que os chineses podem não garantir mais um fluxo constante de equipamentos. No Reino Unido, redes de fibra ótica fixas, para transmissão de dados, também deverão ser expurgadas de material chinês em dois anos.

A China nega que os equipamentos da Huawei apresentem quaisquer riscos de vazamento de dados, e acusam os EUA de reagirem ante a um competidor mais capaz do ponto de vista tecnológico.

Na semana passada, seu embaixador em Londres havia dito que "haveria consequências" se o veto viesse e se a promessa britânica de oferecer cidadania a quase metade da população de Hong Kong virasse realidade, e agora é uma questão de tempo para ver se a ameaça era apenas retórica.

Já analistas ocidentais apontam que a Huawei, mesmo não sendo estatal, é próxima demais do Partido Comunista Chinês para ser considerada uma jogadora isenta no cenário internacional —no qual a ditadura Pequim esposa valores bastante diferentes daqueles usualmente defendidos nas democracias ocidentais.

A frente tecnológica é um das várias da chamada Guerra Fria 2.0 entre EUA e China, e além do 5G já insinua o veto a aplicativos chineses como o popular publicador de vídeos TikTok. Além disso, considerações geopolíticas e militares estão na ordem do dia, como Hong Kong e a tensão no mar do Sul da China demonstram.

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