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Réplica: Em defesa de 'As Políticas da Política'

Organizadores de publicação respondem a crítica feita por Samuel Pessôa

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Marta Arretche

Professora titular do Departamento de Ciência Política da USP e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM/Cebrap)

Eduardo Marques

É professor titular do Departamento de Ciência Política da USP e pesquisador do Centro de Estudos da Metrópole

Carlos Aurélio Faria

É professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUC Minas Gerais

Em sua coluna de 26 de julho, Samuel Pessôa resenhou "As Políticas da Política", organizado por nós. Trata-se de trabalho coletivo de especialistas, que constrói um amplo quadro das políticas sociais brasileiras, da Constituição de 1988 ao governo Dilma.

Pessôa considera o livro fraco, mas afirma que estabelece bases para um debate informado e desapaixonado. Nos escapa a conexão lógica entre as duas afirmações, mas como objetivávamos o segundo, agradecemos a menção. Visamos precisão e rigor, mas evitamos propositalmente a avaliação econométrica de políticas --talvez almejada pelo colunista. Parece-nos central, entretanto, sumarizar o livro e rebater críticas de imprecisão.

Leitura apressada talvez explique a imprecisão das críticas. Pessôa reclama da ausência de dados sobre a evolução do salário mínimo e reforma agrária, dispostos respectivamente nas pp. 54 e 338. Pede indicadores de educação e infraestrutura, apresentados nos respectivos capítulos. Confunde precariedade e déficit habitacionais, explicados em detalhes na p. 253. Interpreta a política externa de forma binária, analisada no respectivo capítulo como variações de uma mesma tradição setorial.

O livro mostra que a Nova República não foi feita só de corrupção e déficit público. Entre 1988 e 2015, vivemos nossa experiência mais avançada de inclusão social, com forte queda das desigualdades. A vida dos 50% mais pobres melhorou, não apenas na renda, mas no acesso a serviços públicos. O Brasil era muito melhor no plano social em 2015 do que em 1990.

Este resultado não foi produto automático do crescimento. Se este deve estar entre nossas prioridades, não esgota o rol de soluções para os que não são indiferentes à desigualdade. Redução de desigualdades requer políticas deliberadas. Essas implicam gastos, mas o livro não defende carga tributária de 40% do PIB. Sustenta que políticas públicas não significam apenas gastar, mas construir programas, agências e estratégias adequadas a escala e complexidade do sistema político e federativo brasileiros.

A trajetória de inclusão se iniciou com a Constituição Federal de 1988, ao incluir cerca de metade da força de trabalho, excluída até então. Mas a CF 88 não mexeu em nosso regressivo sistema tributário, produzindo assim o teto possível de redistribuição da Nova República. Tratou-se de experimento social-democrata manco. Se inclui pelo gasto, retira pela taxação.

O PSDB e o PT não mexeram nessa equação. Reforçaram a regressividade. A isenção de dividendos é apenas parte das isenções, deduções e renúncias fiscais que encolheram a arrecadação e ampliaram a desigualdade.

Nas políticas, entretanto, houve mais continuidade do que anunciado nas disputas eleitorais. O PSDB chegou primeiro. Desenhou o SUS, o Fundef, sistemas de avaliação educacional, e transferência de renda.

O PT chegou depois e não destruiu estes sistemas. Adensou, massificou, ampliou seu alcance. Expandiu o SUS, criou o Fundeb, fortaleceu a avaliação, criou o Bolsa Família. Nas áreas de divergência, de assistência e urbanas, o PT buscou emular o SUS e/ou mesclar políticas localizadas com visibilidade institucional nas questões indígena, racial e de gênero.

Um debate bem informado sobre nossas políticas requer admitir a trajetória positiva do período, mas também o impasse insustentável entre expansão do gasto e tributação regressiva. Desconstruir esse arranjo, preservando avanços em direitos e bem-estar, ao invés de abraçar soluções fiscalistas aparentemente fáceis é o que o Brasil mais precisa no momento.

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