Mesmo com as promessas de respeito ao teto fiscal, o governo avalia como encontrar recursos para financiar projetos de infraestrutura. Uma das alternativas estudadas é abrir crédito extraordinário de R$ 5 bilhões para serem destinados a obras.
O valor, segundo disseram interlocutores à Folha, seria dividido entre os ministérios de Infraestrutura e Desenvolvimento Regional.
O uso de crédito extraordinário livraria o governo das limitações impostas pelo teto constitucional. No entanto, a possibilidade do expediente para bancar obras já gera apreensão entre especialistas sobre uma possível nova manobra para driblar a âncora fiscal.
Isso porque a Constituição afirma que créditos extraordinários só podem ser usados para despesas "imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública".
O líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO) nega que o teto será desrespeitado. Segundo ele, na reunião de quarta-feira (12) no Palácio da Alvorada essa possibilidade não foi discutida. "Qualquer solução para o financiamento de obras será feita dentro do teto", afirma.
A estratégia do Ministério da Economia seria aproveitar o momento para destravar propostas que cortam despesas obrigatórias, como despesas com servidores, para abrir espaço no teto de gastos. Assim, o pressão sobre o Orçamento seria reduzida.
Após a reunião desta quarta, entre Bolsonaro, ministros e a cúpula do Congresso, foi anunciado oficialmente um esforço para fazer isso avançar.
Já há na Câmara e no Senado projetos que acionam gatilhos emergenciais de corte de despesas quando o quadro das contas públicas se torna grave no ano. A ideia é ajustar e unificar essas PECs (Propostas de Emenda à Constituição).
No entanto, alguns acreditam que o “Bolsonaro liberal” não irá se sustentar diante das eleições municipais, marcadas para novembro. Outros dizem, nos bastidores, que isso ocorrerá logo após a apresentação do projeto de Orçamento de 2021 e as discussões sobre como alocar a apertada margem de despesas discricionárias, que incluem gasto com custeio da máquina pública e investimentos.
Na avaliação de líderes partidários, faltou mais ênfase no discurso do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em defesa da agenda liberal do ministro Paulo Guedes (Economia). Congressistas estão céticos em relação à duração do apoio dado por ele às reformas.
Não é a primeira vez que Bolsonaro teve que fazer um gesto claro aos planos de Guedes –geralmente numa reação a ruídos e embates dentro do Executivo. Portanto, segue entre líderes do Senado e da Câmara uma desconfiança.
O discurso desta quarta-feira (12) não deu sinais de qual seria o cronograma das reformas. Sem um gesto concreto, parlamentares acreditam que, em poucos meses, o presidente novamente irá se debater entre ampliar gastos (para manter a popularidade) e seguir a cartilha do mercado financeiro (representada por Guedes).
É quase unânime essa avaliação entre influentes deputados e senadores. As divergências são sobre quando será o próximo embate entre as alas do governo que se opõem em relação ao teto de gastos –regra que limita o crescimento das despesas públicas à inflação.
Mesmo em relação a essa aliança entre Poderes, há dúvidas entre líderes partidários. Uma das principais medidas reduz benefícios de servidores em atividade, sendo que Bolsonaro travou a reforma administrativa com receio do desgaste político.
“As medidas serão impopulares, sempre. Mas seria melhor que ele [Bolsonaro] usasse o capital político que ele tem agora para aprovar isso já. Ele precisa mostrar alguma coisa de concreto, e não apenas dar uma declaração”, disse o senador Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), que é relator de uma das propostas do governo sobre os gatilhos.
Segundo ele, faltou empenho, principalmente da ala política do Executivo, para conseguir votos e fazer com que a PEC, apresentada em novembro do ano passado, avançasse.
Bolsonaro conseguiu ampliar o apoio no Congresso após se aproximar de partidos do centrão -- que se alinharam em anos anteriores também a governos petistas.
A popularidade dele subiu, especialmente em regiões mais carentes, por causa da ampliação de gastos públicos na pandemia, como o auxílio emergencial.
No entanto, há congressistas que relativizam isso. Eles afirmam que o gasto com programas sociais neste ano de calamidade pública explodiu e, mesmo assim, a popularidade do presidente está abaixo da de antecessores que não tiveram liberdade para transferir tanto dinheiro à população.
Portanto, a janela para conseguir aprovar uma agenda liberal, como de reforma administrativa, privatizações e medidas de ajuste fiscal, pode, segundo líderes, se fechar no fim do ano.
Com a pauta travada por causa das burocracias da máquina pública e da falta de apoio político, secretários especiais de Guedes pediram demissão nesta semana. Salim Mattar (Desestatização) e Paulo Uebel (Desburocratização) deixaram os cargos juntos.
Sobre a debandada, líderes afirmam que foi reflexo da falta de traquejo político da equipe de Guedes. O diálogo com o Congresso é frequentemente apontado como uma falha.
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