Bancos e grandes seguradoras abandonam gestor do DPVAT

Movimento ocorre em meio a denúncias de fraudes e má gestão dos recursos

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Rio de Janeiro

Grandes bancos e seguradoras decidiram abandonar o consórcio responsável por gerir o seguro DPVAT, o seguro obrigatório para indenizar vítimas de acidentes de trânsito, em uma debandada inédita desde a criação do grupo, em 2006.

Os pedidos de desligamento ocorrem em meio a uma série de denúncias de fraudes e má gestão que levaram o Ministério Público Federal a pedir, em agosto, bloqueio de R$ 4,4 bilhões da Seguradora Líder, empresa que administra o consórcio.

Segundo a Susep (Superintendência de Seguros Privados), a debandada não gera riscos aos segurados, já que a empresa tem recursos acumulados suficientes para seus compromissos pelos próximos três anos.

O movimento, porém, levanta dúvidas sobre a manutenção do modelo atual, que dá ao consórcio o monopólio na oferta do seguro DPVAT e é alvo de críticas do governo Jair Bolsonaro (sem partido) e no próprio setor de seguros.

As baixas começaram a vir à tona na sexta (25), quando a Porto Seguro comunicou ao mercado seu desligamento do consórcio, previsto em cláusula do acordo de acionistas que permite mudanças na composição do grupo uma vez por ano.

Entre segunda (28) e esta terça (29), a Folha apurou que ao menos outras nove empresas comunicaram decisão semelhante em ofícios enviados à Líder. O grupo representa 60% das ações do consórcio gestor do DPVAT.

Entre elas, estão Caixa Econômica Federal, Bradesco e Banco do Brasil, que participam do consórcio por meio de subsidiárias do setor de seguros, além das seguradoras Tokio Marine, Mapfre, Sompo, Mongeral Aegon, Pottencial e Essor.

Brasilseg, do Banco do Brasil, e Sompo disseram que a saída reflete decisões estratégicas, mesmo argumento usado na sexta pela Porto Seguro, maior acionista atual. A primeira acrescentou, em nota, que busca simplificar sua estrutura de governança e gestão. A Bradesco Seguros ainda não comentou.

No mercado, porém, a debandada é vista como estratégia para reduzir os riscos de danos à imagem e eventuais responsabilizações criminais, caso os processos contra a Líder cheguem a condenações. A redução do prêmio dos seguros e, consequentemente, dos lucros é apontada como outra motivação.

O seguro DPVAT foi tema de uma série de reportagens da Folha em 2020, que mostraram denúncias de mau uso do dinheiro arrecadado —com a compra, por exemplo, de veículos e garrafas de vinho— e de conflito de interesses e favorecimento de sindicatos de corretores.

No pedido de bloqueio feito no início de agosto, o Ministério Público Federal acusou o consórcio de gerir recursos públicos federais "de forma temerária, danosa e em vilipêndio aos princípios constitucionais de economicidade, transparência e legalidade".

Como recebe 2% do total arrecadado pelo seguro, dizem os procuradores, o lucro de seus associados é proporcional ao valor do prêmio pago pelos segurados. Assim, diz a Procuradoria, não havia incentivos para combater fraudes nem cortar despesas.

A gestão é criticada por seguradoras de menor porte. Por isso, nem todos os 56 associados ao consórcio são sócios da Líder, que tem 44 empresas em seu capital social.

Em 2015, a Líder foi alvo da Operação Tempo de Despertar, que investigou fraudes na concessão dos seguros e deu início a uma série de questionamentos ao consórcio e fiscalizações por parte da Susep e do TCU (Tribunal de Contas da União).

O consórcio é questionado também pelo sindicato dos trabalhadores da Susep (Superintendência de Seguros Privados), que vê repasses irregulares de recursos do DPVAT a sindicatos de corretores e conflito de interesses na gestão do órgão regulador.

Bolsonaro tentou extinguir o seguro DPVAT em 2019, mas a medida gerou polêmica e foi derrubada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Atualmente, a própria Líder passou a defender o fim do monopólio na gestão do seguro obrigatório.

Após a derrota, a Susep reduziu o valor dos prêmios pagos pelos motoristas para R$ 5,21, alegando que a empresa tem mais de R$ 4 bilhões em excesso de reservas técnicas — que, para o Ministério Público, são resultado das fraudes praticadas por sua gestão.

Procurada, a Líder não se manifestou após as notícias da debandada de associados, limitando-se a manter posicionamento divulgado na sexta, no qual diz que o acordo de acionistas prevê a entrada e saída de empresas e que o movimento não causa impactos na prestação dos serviços.

Segundo o documento, quando uma associada sai, as outras dividem sua fatia, em volumes proporcionais à sua participação no consórcio.

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