Descrição de chapéu Reforma tributária

Governo descumpre prazo prometido para envio de novas fases da reforma tributária

Falta de consenso, além de Renda Brasil e auxílio emergencial, atrasa discussões; Bolsonaro tira urgência de matéria

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Brasília

Considerada uma das principais prioridades da equipe econômica, a reforma tributária vem tendo suas discussões atrasadas pela falta de consenso entre governo, Congresso, estados e municípios.

Em meio ao cenário, e envolvido recentemente com temas como o auxílio emergencial, o Executivo deixou de entregar novas fases da proposta no prazo sinalizado e ainda pediu a retirada da urgência do projeto já enviado.

A solicitação foi publicada nesta sexta-feira (4) em edição extra do Diário Oficial da União.

Líderes partidários haviam se queixado ao Palácio do Planalto que a iniciativa —união de PIS e Cofins— não tinha consenso. Por isso, trancaria a pauta da Câmara a partir da próxima segunda-feira (7).

A decisão também ocorre na esteira de uma articulação do Planalto para que a reforma administrativa, enviada na quinta-feira (3), seja apreciada antes da reforma tributária.

A equipe do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) reconhece que não conseguirá aprovar as duas medidas neste ano e que a reforma administrativa, apesar da pressão contrária de servidores públicos, apresenta menos resistência entre deputados e senadores.

Soma-se a essa visão o entendimento do Ministério da Economia de que a reforma tributária ainda tem uma série de divergências, como as disputas entre as unidades federativas.

Virou um elemento a mais de tensão os recursos destinados a estados e municípios a título de compensação por eventuais perdas de arrecadação com a reforma, o que gera divergências entre entes e equipe econômica.

O ministro Paulo Guedes (Economia) quer evitar de qualquer forma que as discussões sobre as compensações a estados e municípios via fundos constitucionais se transforme em uma nova Lei Kandir (que determinava um ressarcimento da União a estados após cortes de tributação de exportação feitos no passado).

O tema já foi comentado publicamente por Vanessa Canado, assessora especial de Guedes.

"Não dá para a União simplesmente pagar mais uma conta como moeda de troca. A União apoia uma reforma ampla. Agora, não é simplesmente uma discussão de quanto a União vai colocar no novo fundo regional", afirmou em seminário recentemente.

Por tudo isso, assessores da pasta afirmam que dificilmente uma proposta reuniria consenso neste ano.

Segundo relatos feitos à Folha, Guedes sugeriu a inversão da ordem das reformas, antecipando a administrativa e deixando a análise da tributária para um segundo momento.​

Com isso, o ministro defendeu que as próximas etapas da reforma tributária, ainda não apresentadas pelo governo, sejam colocadas em banho-maria, pelo menos por enquanto.

Para ele, enviar agora o restante da tributária, que inclui a controversa recriação de uma espécie de CPMF, geraria dissensos e poderia inviabilizar a primeira fase da proposta.

Esse é mais um fator a jogar contra a reforma tributária, após o Ministério da Economia descumprir o prazo sinalizado para o envio das fases seguintes da reforma.

Segundo membros da pasta, as atenções nas últimas semanas ficaram concentradas no auxílio emergencial e no Renda Brasil (que pode substituir o Bolsa Família). Por isso, segundo relatos da equipe, as próximas fases da reforma tributária tiveram de esperar mais.

A primeira fase da reforma tributária foi entregue ao Congresso em 21 de julho.

O secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto, disse na ocasião que "a perspectiva é que nos próximos 20 a 30 dias possamos apresentar a segunda ou até mesmo a terceira parte".

Técnicos chegaram a falar que o governo apresentaria já em agosto, inclusive, a proposta do novo imposto sobre pagamentos (que bancaria a desoneração de empresas ao contratarem empregados).

Agora, já nem se fala em quando as novas etapas podem ser apresentadas aos congressistas.

Além do envio em si, as propostas do Executivo ainda precisam percorrer um longo caminho ao passar pela avaliação dos parlamentares, antes de serem aprovadas.

Mesmo com aval do Congresso, diferentes regras ainda precisariam atender o princípio da anterioridade e passariam a valer apenas no ano seguinte ao da aprovação. Portanto, caso as discussões fiquem para o ano que vem, parte das regras só valeria a partir de 2022.

Até hoje, o Ministério da Economia só entregou ao Congresso o projeto de lei que funde PIS e Cofins na chamada CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), uma proposta já discutida há anos.

A próxima parte da proposta do Executivo seriam as alterações no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

"A reforma tributária começou a andar. Entregamos a primeira parte e já vamos entregar uma segunda parte, brevemente", afirmou Guedes ao participar de sessão no Congresso recentemente, sem mencionar um prazo.

A mudança no IPI ainda está em debate na equipe econômica e com representantes dos estados, pois parte da arrecadação desse imposto é destinada aos entes por meio do FPE (Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal). Essa é justamente parte da explicação para o atraso no cronograma.

Em sua defesa, técnicos da Economia também justificam o atraso por outra série de eventos. No ano passado, por exemplo, as atenções estavam em boa parte voltadas à reforma da Previdência.

Depois, a briga pelo protagonismo na reforma tributária entre Câmara e Senado obstruiu as discussões com propostas próprias de deputados e senadores.

Para não desagradar nenhuma Casa, a equipe econômica passou a aguardar a instalação de uma comissão mista, só criada em fevereiro deste ano. Mas, logo em seguida, a pandemia do coronavírus chegou ao Brasil.

De qualquer forma, interlocutores de Guedes consideram parte das críticas injusta por considerarem que há uma série de propostas de reformas já enviadas ao Congresso, como as mudanças no setor elétrico e até sobre a autonomia do Banco Central.

A visão é que, apesar de se criticar o Executivo pelo ritmo de envios, diferentes propostas já estão à disposição e dependem hoje apenas do Congresso.

Colaboraram Bernardo Caram e Gustavo Uribe

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