Só dono de carro mais caro sentirá diferença com a nova gasolina

Teste aponta economia no consumo de combustível em motores mais sofisticados, mas não em modelo popular

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

A nova especificação da gasolina comum disponível no país reduz o consumo dos carros, mas apenas donos de modelos mais sofisticados devem perceber alguma diferença no uso urbano. A conclusão é baseada em testes feitos pela Folha em parceria com o Instituto Mauá de Tecnologia.

Três modelos 2020 passaram pela avaliação: o popular Fiat Uno 1.0 Fire Attractive (R$ 45.890), o sedã médio Toyota Corolla XEI (R$ 121.690) e o cupê esportivo Honda Civic SI (R$ 179.990). Os carros foram cedidos pelas montadoras.

As medições seguiram os mesmos critérios adotados no Teste Folha-Mauá, realizado desde 1996.

O popular Uno registrou médias urbanas de 13 km/l com a nova gasolina e de 12,9 km/l com a antiga. A melhora de apenas 0,77% é considerada empate técnico pelo Instituto Mauá de Tecnologia.

Fiat Uno 1.0 Attractive 2020
Fiat Uno Attractive 1.0 Flex. Trecho rodoviário: Gasolina antiga: 18 km/l. Nova gasolina: 18,4 km/l. Economia: 2,17%. Trecho urbano. Gasolina antiga: 12,9 km/l. Nova gasolina: 13 km/l. Economia: 0,77% - Divulgação

O consumo urbano foi o principal ponto considerado, por ser a condição mais comum no uso cotidiano do veículo e o que mais impacta na qualidade do ar nas cidades.

O Fiat testado veio equipado com motor 1.0 Fire, presente no mercado brasileiro desde o início dos anos 2000. Sua potência máxima é de 75 cv, e não há recursos como injeção direta de gasolina feita por bicos que trabalham em alta pressão, item presente no Corolla.

Com motor 2.0 flex (177 cv) lançado há cerca de um ano no Brasil, o sedã da Toyota obteve a melhor média no circuito urbano: 11,1 km/l com a nova gasolina, ante 10,7 km/l com a antiga. A redução de consumo chegou a 3,6%, mais próxima da média estimada pela Petrobras, que prevê uma queda entre 4% e 6%.

Já esportivo Honda Civic SI tem motor 1.5 turbo de 208 cv e recursos eletrônicos ainda mais avançados. Na cidade, a redução de consumo na comparação das gasolinas foi de 2,75%.

Toyota Corolla XEI 2.0 flex. Trecho rodoviário. Gasolina antiga: 19,6 km/l. Nova gasolina: 19,7 km/l. Economia: 0,51%. Trecho urbano. Gasolina antiga: 10,7 km/l. Nova gasolina: 11,1 km/l. Economia: 3,6% - Divulgação

Rogério Gonçalves, engenheiro mecânico e coordenador de assistência técnica da Petrobras, afirma que o benefício tende a ser maior em carros mais modernos, pois esses, em geral, possuem sensores eletrônicos e sistemas de mapeamento do motor mais avançados, permitindo que os veículos se aproveitem da maior octanagem RON, uma das mudanças da nova especificação da gasolina.

"Cabe ressaltar que veículos mais antigos também devem apresentar redução no consumo, tendo em vista que a nova gasolina introduziu a especificação de densidade mínima, atributo que é aproveitado também pelos motores antigos", afirma Gonçalves.

"O ganho maior nem será do consumidor, que certamente terá dificuldades para identificar a mudança em razão das alterações de trânsito, das condições do ambiente e da forma de dirigir. Porém, o país será beneficiado pelo montante total de economia de recursos naturais", diz Renato Romio, chefe do laboratório de motores e veículos do Instituto Mauá de Tecnologia.

De acordo com dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), foram consumidos 38,4 bilhões de litros de gasolina no Brasil em 2019. Nesse cenário, uma redução de 0,77% representaria menos 295,7 milhões de litros queimados.

Entretanto, as diferenças não vão compensar os possíveis aumentos provocados pela mudança no combustível. Como os postos ainda estão dentro do prazo de 90 dias até que seja obrigatório revender apenas a gasolina nova, não é possível ter uma análise definitiva da oscilação dos valores na bomba.

O preço do combustível é definido pela cotação no mercado internacional e outras variáveis como valor do barril do petróleo, frete e câmbio.

"Esses fatores podem oscilar para cima ou para baixo e são mais influentes no preço do que o custo adicional das características do combustível. Além disso, é importante destacar que a Petrobras é responsável por apenas 30% do preço final da gasolina nos postos de serviço, as demais parcelas são compostas por tributos, preço do etanol adicionado e margens das distribuidoras e revendedores", afirma o engenheiro.

Sobre a diferença entre os resultados obtidos pela Petrobras e pelo Instituto Mauá de Tecnologia, Gonçalves afirma que as avaliações da empresa também foram realizadas com veículos de diferentes categorias.

"Foram realizados testes de curvas de desempenho de motores em dinamômetro para medições de potência, torque e consumo específico e testes de veículos para medição de autonomia, além de ensaios de retomada de velocidade e detonação, todos bastante criteriosos e tentando eliminar qualquer influência externa nos resultados."

O engenheiro diz que os resultados de melhoria de consumo apresentados pela Petrobras foram valores médios e que a queda do consumo específico chegou a 17,9% em uma das medições.

Já o teste feito pelo Instituto Mauá de Tecnologia simulou o uso real dos carros em circuitos predefinidos.

O consumo foi aferido em duas etapas: a primeira, com velocidade média de 90 km/h, simulou um percurso rodoviário de 31 quilômetros.

A segunda etapa, realizada em circuito urbano de 27 quilômetros, teve média horária de 25 km/h. Ambos os trajetos foram percorridos na cidade de São Caetano do Sul (Grande São Paulo).

Para diminuir a interferência das condições climáticas, cada carro foi testado em um único dia.

Mudança principal está na densidade do combustível

A ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) estabeleceu um limite mínimo de densidade para a gasolina, o que impede a produção ou a importação de combustíveis mais "leves" ou com compostos químicos que reduzem o rendimento.

Embora essa condição não representasse uma adulteração, havia perda de rendimento e risco de defeitos em carros com motores mais modernos.

Outra mudança estabelecida pela ANP é o valor mínimo para o indicador de octanagem RON, que mede a resistência à detonação em baixas rotações. Antes, o Brasil só tinha limites para a octanagem do tipo MON (calculada com giro alto) e para o IAD (Índice Antidetonante), que é uma média dos dois.

As novas especificações definem também uma nova curva de destilação, que indica a temperatura em que frações mais leves da gasolina evaporam.

De acordo com a agência nacional do petróleo, as novas normas se traduzem em maior geração de energia com menos consumo, o que leva a ganhos em desempenho, dirigibilidade e aquecimento do motor.

A nova gasolina já vinha sendo distribuída antes de a norma entrar em vigor, mas os postos têm até o dia 3 de novembro para zerar os estoques antigos.

A ANP mantém seu programa de fiscalização nos postos, agora adaptado à mudança no combustível --a densidade passou a ser medida pelos técnicos.

A nova gasolina comum serve de base para todas as bandeiras, mas cada marca define seu próprio pacote de detergentes e redutores de atrito.

O percentual de etanol anidro na composição permanece o mesmo: 27% na gasolina comum e 25% nas opções premium.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.